“A Lavoura tem de ser ouvida. Do campo saem os alimentos para toda a população. Ou melhora a nossa situação e então a Lavoura sente-se animada, apoiada e com condições para produzir ou então estamos mal. E connosco está mal todo o País. Certos da verdade das nossas palavras e da justiça que nos assiste, temos que todos juntos fazer ouvir a nossa voz e valer os nossos interesses e direitos”
Carta da Lavoura Portuguesa, Encontro fundador da CNA, a 26 de Fevereiro de 1978, em Coimbra
A “Carta da Lavoura Portuguesa” aprovada no Encontro fundador da CNA[1] continha avaliações, propostas e reclamações concretas capazes de defender e promover os direitos e interesses dos pequenos e médios agricultores, da Agricultura Familiar e do Mundo Rural.
Ao completar 44 anos de vida e de luta em defesa da Agricultura Familiar e do Mundo Rural, a CNA reafirma que melhor estaria hoje a Agricultura se os sucessivos Governos tivessem ouvido a nossa voz, dando cumprimento ao caderno de reclamações que na altura apresentámos e que ao longo destes anos – sempre com os agricultores – continuamos a discutir, a actualizar e a reclamar.
Para mal de Portugal, há mesmo áreas em que a situação se agravou e a CNA denuncia hoje, mais uma vez, as dificuldades por que estão a passar os agricultores, enfrentando velhos e novos problemas que teimosa ou deliberadamente os sucessivos Governos não quiseram resolver, ao optarem por concentrar os apoios nas grandes empresas.
Os agricultores vendem os seus produtos a preços baixíssimos, enquanto a grande distribuição fica com a fatia de leão do que os consumidores pagam pela sua comida; os preços dos combustíveis, da electricidade, das rações, dos fertilizantes não param de aumentar e as despesas dos agricultores familiares para produzirem são incomportáveis; as explorações agrícolas de menor dimensão são eliminadas a um ritmo alarmante; a terra concentra-se nas mãos de grandes empresas e de grandes proprietários. E enquanto o Governo privilegia com aopoios uma agricultura para exportar, a dependência do exterior em bens agro-alimentares é escandalosa.
Depois dos constrangimentos com a pandemia, agora com a seca e sem respostas eficazes do Governo os problemas agravam-se de forma drástica. Não há pastagens e a água para rega escasseia prejudicando o desenvolvimento das culturas, os agricultores são forçados a comprar rações cada vez mais caras e a vender ao desbarato os seus animais, há sementeiras irremediavelmente perdidas e o sustento dos agricultores ainda mais comprometido.
Na pecuária, a situação é muito preocupante. Os produtores de leite, por exemplo, vendem o litro de leite com prejuízo e ao preço mais baixo da Europa – 10 cêntimos abaixo da média comunitária – e se não forem tomadas medidas urgentes as poucas explorações leiteiras que ainda resistem não aguentarão, sobretudo as pequenas e médias.
O problema dos prejuízos causados por javalis e outros animais selvagens continua por resolver, a indústria da madeira impõe preços baixos à madeira na produção condicionando uma gestão activa por parte dos pequenos e médios produtores e, nos Baldios, continuam a pairar ameaças e discriminação à gestão destes espaços pelos seus compartes.
No Douro, exige-se a concretização do processo eleitoral para a Casa do Douro, sem mais desculpas ou adiamentos, no sentido de reverter o desmantelamento e entrega aos privados de uma histórica e fundamental instituição da Região Demarcada do Douro, que deve servir, em primeiro lugar, os seus produtores.
Os problemas são muitos, mas as políticas dos Governos tendem a não resolver a até agravam os problemas da Agricultura Familiar. Temos como exemplo o Estatuto da Agricultura Familiar instrumento essencial para o desenvolvimento da Agricultura Familiar, mas que, no fundamental, não sai do papel, claramente por falta de vontade política.
Já o Plano Estratégico desenhado pelo Governo para aplicação da Política Agrícola Comum em Portugal (PEPAC) insiste no privilégio da agricultura industrializada e concentra as ajudas nos grandes proprietários de terras, enquando se prepara para cortar nos apoios aos pequenos e médios agricultores. Quase podemos dizer que, aqui, nada de novo, pois sabemos que a Agricultura Familiar tem sido fortemente penalizada pela PAC. Desde a entrada na União Europeia (então CEE), foram eliminadas em Portugal cerca de 400 mil explorações agrícolas, sobretudo pequenas e médias.
Os agricultores não aguentam e isto não pode continuar!
ACÇÃO DE PROTESTO EM BRAGA | 24 MARÇO
A situação grave do sector exige medidas urgentes. Por outras e melhores políticas agro-rurais, a CNA – sempre com os agricultores e com as suas Filiadas – promove uma iniciativa de protesto em Braga, a 24 de Março, por ocasião da abertura da Feira AGRO.
Vamos reclamar ao Governo o escoamento a preços justos para a produção agrícola e florestal nacional, o combate à especulação com o preço dos factores de produção e a defesa dos rendimentos dos agricultores!
Vamos reclamar a proibição das vendas com prejuízo e a regulação e fiscalização da actividade comercial da grande distribuição, a concretização do Estatuto da Agricultura Familiar e uma Política Agrícola Comum mais justa e solidária!
Em defesa de uma vida digna para quem trabalha a terra para produzir alimentos, em defesa da produção nacional e da Soberania Alimentar do país!
As Agricultoras e os Agricultores podem contar com a CNA e Filiadas, em defesa da Agricultura Familiar e de um Mundo Rural Vivo!
[1] A CNA foi fundada a 26 de Fevereiro de 1978, em Coimbra, no grande “Encontro das Organizações da Lavoura e dos Agricultores do Minho, Douro, Trás-os-Montes, Beiras e Delegações de outras Províncias” que reuniu cinco mil Agricultoras e Agricultores.