pinhão

Pinhão, o “ouro branco” que é um luxo da floresta

Não se deixe enganar pelo tamanho porque o pinhão – proveniente do pinheiro manso e conhecido como “ouro branco” ou “caviar da floresta” – é mundialmente apreciado e uma presença indispensável na dieta mediterrânica. Em tempo de Natal, dê-se ao luxo e saboreie-o em receitas típicas desta época festiva.

Com uma longa ligação histórica à gastronomia portuguesa, o pinhão – do pinheiro-manso (Pinus pinea) – foi um dos alimentos que seguiu na bagagem das caravelas portuguesas, nas demoradas viagens dos Descobrimentos. A escolha deste pequeno alimento para os marinheiros justificava-se porque o pinhão era muito fácil de conservar e pelo seu alto valor energético.

Pela mesma época, o pinhão era também uma opção à mesa da realeza, como comprova o facto de estar patente no “Livro de Cozinha da Infanta D. Maria de Portugal”, no século XVI. A referência consta do “Livro de Receitas com Pinhão”, uma iniciativa da UNAC – União da Floresta Mediterrânica, que destaca ainda a ligação do pinhão à dieta mediterrânica e recorda a sua importância gastronómica em tempos ainda mais remotos: no século I, quando o cozinheiro romano Marco Gávio Apício mencionou em “De re coquinaria” uma série de receitas com pinhões, integrando-os num enchido, num molho para acompanhar um prato de caça e em salsichas de sangue.

Ao longo do tempo, o pinhão tornou-se presença “obrigatória” na doçaria regional e tradicional portuguesa, em delícias como as Alcomonias, um doce do litoral alentejano em forma de losango, feito com farinha de trigo torrada, mel e pinhão; as Pinhoadas de Alcácer do Sal, que juntam mel e pinhão; os Confeitos de pinhão da Páscoa, feitos com pinhões em vez das habituais amêndoas no interior da camada de açúcar; as Granadas de Vendas Novas, bolos recheados com um doce à base de pinhão, para não falar da sua inclusão em muita da doçaria natalícia – de que são exemplos mais óbvios o bolo-rei ou rainha. Além disso, os colares de pinhão eram uma presença habitual em vendedores de rua em vários locais do país.

Dentro e fora das fronteiras, a utilização culinária do pinhão resistiu à passagem do tempo e o seu valor – não só gastronómico, mas também de venda – levou a que fosse conhecido como “ouro branco”, “caviar da floresta” e “diamante dos frutos secos”.

O pinhão é um fruto ou uma semente? Embora seja normalmente chamado de fruto seco, o pinhão é uma semente. O miolo do pinhão que produzimos em Portugal é a semente do pinheiro-manso (Pinus Pinea). O fruto é a pinha que contém, em cada escama, dois pinhões com cerca de 1,5 cm a 2 cm de comprimento.

Os benefícios do pinhão na alimentação e para a saúde

O pinhão é um alimento energético, de elevado valor proteico e particularmente rico em lípidos (cerca de 48% do pinhão mediterrânico de Pinus pinea), incluindo ácidos gordos de elevada qualidade para a saúde humana, nomeadamente ácido oleico, que ajuda a baixar o colesterol, e ácido linoleico, que ajuda a reduzir o apetite, atuando como saciante. Possui ainda teores elevados de minerais como fósforo, potássio e magnésio, teores consideráveis de fibras alimentares, bem como um vasto conjunto de compostos bioativos como os fitosteróis, vitaminas do complexo B e compostos fenólicos, cujo consumo elevado está associado à redução do risco das principais doenças crónicas.

Não obstante, apesar de ser considerado importante para uma alimentação equilibrada e benéfico para a saúde, o seu consumo deve ser feito de forma moderada, tendo em conta o valor calórico (cerca de 600 kcal/100g).

Entre os seus benefícios, destacam-se ainda para consolidar a sua importância para a alimentação o facto do pinhão:

– Ser importante para o controlo da pressão arterial por conter potássio;

– Ter fibras que ajudam à digestão e prevenção de doenças intestinais;

– Ser uma alternativa a produtos de origem láctea, por exemplo em casos de osteoporose ou descalcificação;

– Ajudar a prevenir doenças oculares, nomeadamente cataratas, uma vez que contém luteína;

– Possuir ferro, benéfico em situações de carência, como é o caso da anemia;

– Ser fonte de vitamina C, o que contribui para reforçar o sistema imunitário;

– Poder ser usado pelos celíacos, pois não contém glúten na sua composição;

– Ser fonte de energia, recomendado a praticantes de desporto;

– Se consumido de forma moderada, ser indicado para a alimentação de diabéticos.

Todos os pinheiros dão pinhas e pinhões? Sim, mas nem todos os pinhões são comestíveis. O pinhão é a semente comestível das diversas espécies de pinheiro (Pinus spp.), da família Pinaceae, e o género Pinus engloba perto de 111 espécies. 29 delas são reconhecidas pela FAO – Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura como espécies cultivadas para a produção de pinhão para consumo humano. Nem todas as 29 têm a mesma importância comercial e globalmente há duas que se destacam: o Pinus sibiricae (Ásia) e a Pinus pinea. São as duas espécies mais exploradas a nível mundial e o seu cultivo remonta há 2000 anos no Oriente e na Europa.

O pinhão reúne, assim, várias propriedades essenciais para uma alimentação saudável, nomeadamente proteína, gordura, elementos minerais e vitaminas, sendo que as suas caraterísticas nutricionais apoiam a grande procura a nível global.

Porque é que o pinhão é conhecido como o “ouro branco” da floresta?

Os “cognomes” atribuídos ao pinhão mediterrânico estão diretamente relacionados com o seu valor de mercado, que tem vindo a cotar acima dos 100 euros por quilograma, valendo-lhe epítetos de “ouro branco” ou “caviar da floresta”.

O preço justifica-se pela elevada procura mundial e pelo facto de o rendimento da pinha/miolo de pinhão ser baixo – de uma pinha retira-se apenas cerca de 3% de pinhão. Acresce que as atividades implicadas na sua obtenção são morosas (apanhar a pinha, retirar o pinhão e descascá-lo) e requerem mão de obra intensiva. Em Portugal na maioria dos casos são usados processos tradicionais e manuais, como revelou o Boletim de Mercado da Pinha da Campanha 2017-2018.

Ainda assim, são várias as tecnologias (descasca mecanizada, por exemplo) que ajudam a profissionalizar a produção de pinhão, uma atividade que, segundo o ICNF – Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, “é uma das principais atividades económicas do sector florestal”, representando 4-5% das exportações de produtos florestais e mais de 13% do emprego na floresta.

O interesse pelo pinhão tem apoiado o aumento da área de pinheiro-manso, que cresceu cerca de 20% entre 1995 e 2015, segundo o 6º Inventário Florestal Nacional. Entre as zonas do país onde esta cultura é mais relevante contam-se o Vale do Tejo, Alcácer do Sal e Coruche.

A colheita de pinhas faz-se entre 15 de dezembro e 31 de março, um período definido legalmente para evitar a apanha ilegal antes do fruto estar totalmente amadurecido. Anualmente, são apanhadas cerca de 60 a 70 milhões de pinhas, o que corresponde a perto de 600 mil a 700 mil toneladas de miolo de pinhão.

Além da atratividade do fruto – e do aproveitamento da pinha e da casca do pinhão, ambos usados para energia -, a cultura é muito versátil. É possível compatibilizar atividades complementares de valorização relacionadas com a pecuária, a caça e a produção de outros alimentos, como os cogumelos e as plantas aromáticas por exemplo. O estudo sobre a “Cadeia de Valor da Fileira da Pinha/Pinhão”, da UNAC, realça ainda a sua importância direta como sumidouro de carbono e o seu papel no combate à desertificação das zonas rurais.

O artigo foi publicado originalmente em Florestas.pt.


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