Temos vacina para as mortes com trator, vamos usar?

Morreram 57 pessoas em acidentes com tratores em 2019, mais duas que em 2018. Uma morte por semana. Os números mais altos da Europa. Segundo o “Correio da Manhã” de 2/01/2020, “a maioria dos sinistros aconteceu em ambiente agrícola, fora de estrada, sendo que o distrito onde se registaram mais vítimas mortais foi em Bragança, com 11 óbitos. Seguiram-se Braga e Guarda, com seis. Nesta estatística não entram eventuais vítimas que sofreram ferimentos graves e acabaram por não resistir e morrer em ambiente hospitalar.” A notícia mostra-nos ainda que os acidentes ocorrem nas regiões montanhosas. Como bem afirmou Gonçalo Leal, Diretor-geral da DGADR (Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural) no programa “Sociedade civil”, RTP2, no passado dia 29/10, os acidentes devem-se a 3 causas: orografia, condutores idosos e tratores velhos, sem sistemas de proteção.

Há três sistemas de proteção: o arco de segurança, a cabine de proteção e o quadro de segurança, que basicamente é uma cabina sem vidros. Os sistemas de proteção são obrigatoriamente instalados em tratores novos vendidos desde 1994. Mas temos cerca de 80.000 tratores velhos, com mais de 25 anos, boa parte sem qualquer sistema de proteção. Não sei quantos serão e duvido que alguém tenha feito esse levantamento. Fica a sugestão.

Pelo “Jornal de Notícias” de 16/11/2020 ficámos a saber que no futuro código da estrada, “quem não tiver o arco de segurança no trator arrisca multa até 600 euros”. É esta a grande solução do governo para o problema? Como vimos atrás, só uma pequena parte das mortes ocorre na estrada. A maioria ocorre em propriedade privada. Não é com multas na estrada que vamos evitar essas mortes!

O que podemos fazer para mudar isto? Proponho investir uns trocos da “bazuca europeia”:

– Para agricultores e empresas que tenham muito trabalho para o trator, proponho um programa para a troca/abate dos tratores velhos, poluentes e perigosos, substituindo por tratores novos, mais seguros, económicos e ecológicos, talvez com um apoio a fundo perdido de 60%;

– Para quem apenas usar o trator poucas horas por ano, se estiver em bom estado de mecânica, proponho um apoio de 90% para a instalação do arco de proteção, que certamente custará muito menos que os 7.000 euros citados na notícia do J.N. Isso já deve pagar uma cabine.

– Por último, é preciso uma boa campanha de comunicação para meter na cabeça dos mais casmurros que o arco da segurança só protege se for usado corretamente. Trazer o arco dobrado para passar debaixo das árvores ou ramadas não funciona, é como levar o capacete no braço para o caso de aparecer a polícia. Só então, depois dos apoios e da comunicação é que as multas farão sentido.

Além de poder salvar algumas vidas todos os anos, este dinheiro não vai ficar nos agricultores. Vai dar trabalho às pequenas empresas, aos mecânicos e serralheiros que vendem e reparam tratores e máquinas agrícolas. Acima de tudo, quanto vale uma vida? Quanto custa o socorro, o tratamento dos feridos e as reformas por invalidez aos sobreviventes? Temos a vacina disponível, de que estamos à espera para usá-la?

#carlosnevesagricultor

O artigo foi publicado originalmente em Carlos Neves Agricultor.


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