50 anos do Gerês: cheira mal, cheira a Lisboa – João Adrião

Valor turístico? Algum. Mas às pessoas que por ali moram, pouco ou nenhum lhes calha. Pagam antes, com os seus impostos, o turismo que enriquece Lisboa.

Fora de Lisboa não há nada. O país está todo entre a Arcada e S. Bento.
in Os Maias, de Eça de Queiroz

O Parque Nacional da Peneda Gerês faz 50 anos. O choque com as populações é, não obstante, muito mais antigo e parece não ter fim à vista. É que há os portugueses que vivem em Portugal, isto é, em Lisboa, e há os outros, os que vivem na paisagem.

Foi no longínquo ano de 1888 que, à imagem de Espanha, França ou Itália, se criou a Administração Florestal do Gerês. Desde então, Lisboa vem diabolizando os fatores que criaram e têm mantido os valores naturais da região – o fogo e o pastoreio ( por exemplo sobre a raridade do urso no Gerês no séc. XVIII, apontava como causa, em 1728, o Padre JMFerreira: “Os grandes fogos que sempre continuamente os lavradores andam lançando nos montes”). O processo nunca foi pacífico e chegou a obrigar à presença do exército para assegurar a arborização que colidia/excluía a economia local. Quando as áreas dedicadas à natureza se espalham pela Europa, também por cá, ainda em 1971, nasce o nosso Parque Nacional. A população, nas últimas décadas, regrediu muito, os terrenos comunitários sofreram alterações jurídicas. Mas o choque continua a existir. Ali, em algo que é nacional, mas na verdade tem propriedade privada e comunal, vive-se com os lábios rebentados pelos figos que se comem na capital.

O escape de um táxi numa curva de estrada apertada? Cheira mal, cheira a Lisboa.

Não é só com o primeiro elétrico da rua que as chinelas da Ribeira fazem coro. Barco, avião, comboio, bicicleta e trotinete, tuk tuk ou autocarro, metro… Tudo isto, Lisboa tem.


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