CCP contesta decisão do governo que pode “restringir” acesso dos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro ao SNS

Em nota divulgada nos últimos dias, o Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP) afirma ter sido “surpreendido” pelo teor do Artigo 5.º, ponto 2, do Despacho n.º 40/2025, de 2 de janeiro, emitido pelo Gabinete da Secretária de Estado da Gestão da Saúde, o qual estabeleceu que “os residentes estrangeiros e não residentes nacionais e estrangeiros, inscritos com médico de família, sem registo de consulta médica nos cuidados de saúde primários nos últimos cinco anos, tornam-se elegíveis para reformulação de atribuição de médico de família”.

“A Lei n.º 66-A/2007, que regula o funcionamento do CCP, determina expressamente no seu Artigo 2.º, n.º 1, alínea e) que: “Em matérias de relevância para as comunidades portuguesas, o Conselho é consultado pelo Governo, de forma obrigatória, não vinculativa. Ou seja, a consulta ao CCP não é uma mera faculdade, mas sim uma obrigação legal. No caso do Despacho n.º 40/2025, que restringe o acesso ao Serviço Nacional de Saúde (SNS) por parte dos portugueses residentes no estrangeiro, o impacto sobre as Comunidades Portuguesas é evidente. Assim, havia o dever legal de o CCP ser consultado previamente à adoção da medida, o que não ocorreu”, pode-se ler nessa mesma nota, que sublinha ainda que “embora o Governo não seja obrigado a acatar as recomendações apresentadas, é fundamental que o CCP tenha todas as condições para expressar as suas posições, devendo ser consultado nos termos da Lei 66-A”.

O CCP considerou que este Despacho “cria uma distinção inaceitável entre portugueses, afetando diretamente os cidadãos que residem fora de Portugal, o Conselho Permanente do CCP destaca que não foi previamente consultado sobre esta alteração, ou seja, essa omissão representa uma grave falha de procedimento e um incumprimento da Lei 66-A, independentemente do conteúdo da nova normatização. (…) O CCP propõe uma alteração normativa, com vista a eliminar qualquer restrição ao acesso dos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro ao Serviço Nacional de Saúde (SNS)”.

O objetivo, segundo este órgão, é garantir que “todos os portugueses, independentemente da sua residência, possam usufruir do direito à saúde sem necessidade de registos prévios”.

O CCP sugere alterações ao Artigo 5.º, Ponto 2, do Despacho n.º 40/2025, com a seguinte redação, que atende as comunidades portuguesas: “Os residentes estrangeiros e não residentes nacionais e estrangeiros, inscritos com médico de família, sem registo de consulta médica nos cuidados de saúde primários nos últimos cinco anos, tornam-se elegíveis para reformulação de atribuição de médico de família”.

“O direito à saúde é um princípio universal, devendo ser assegurado a todos os cidadãos portugueses, independentemente do seu local de residência. O despacho em vigor introduz uma desigualdade injustificada entre os portugueses residentes e não residentes, ao condicionar a manutenção do médico de família à utilização prévia do SNS. Muitos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro deslocam-se a Portugal de forma esporádica e, nessas ocasiões, devem poder aceder aos cuidados de saúde sem entraves burocráticos ou obstáculos administrativos”, menciona a nota.

O CCP acredita que “a distinção estabelecida pelo Despacho cria uma barreira artificial e desnecessária ao exercício de um direito essencial” e que “todas as decisões administrativas devem considerar e respeitar os direitos dos cidadãos, o que deve incluir os portugueses residentes no estrangeiro. Assim, qualquer medida que impacte diretamente as Comunidades Portuguesas deve ser precedida de consulta aos seus representantes legítimos, como é o caso do Conselho das Comunidades Portuguesas. A ausência desta consulta no caso do Despacho n.º 40/2025, salvo melhor juízo, constitui uma violação do princípio da participação democrática estabelecido na Constituição”.

Discussão antiga

O Conselho das Comunidades Portuguesas defende que “os cidadãos portugueses, nas suas visitas a Portugal, em situações análogas de urgência, devem ter o direito a aceder aos serviços de saúde com os cidadãos portugueses, e não com os estrangeiros”. Uma temática que, segundo o CCP, leva anos a ser tratada.

“A discussão da temática dos médicos de família não é recente, tendo sido introduzida por um Despacho de 2023 que introduzia alterações ao Registro Nacional do Médico de Família, emitido pelo então Secretário de Estado da Saúde. O novo Despacho, embora não tão severo quanto o anterior, cria distinção entre cidadãos residentes e não residentes, o que levanta questões sobre a equidade no acesso aos cuidados de saúde. Por isso, interpelamos acerca da fundamentação e das motivações subjacentes a este Despacho. Embora a medida vise os cuidados de saúde da população residente, ela pode acarretar efeitos negativos nas Comunidades Portuguesas no estrangeiro”, comentou o CCP, reiterando que “a consulta ao CCP pelo Governo é obrigatória”.

“Para assegurar a alteração normativa que recomenda, o Conselho das Comunidades Portuguesas propõe uma reunião com a Sra. Ministra da Saúde e/ou a Sra. Secretária de Estado, a fim de propormos um conjunto de medidas para garantir a efetivação dos direitos dos cidadãos portugueses residentes no estrangeiro no âmbito do SNS e clarificarmos que a auscultação a este Conselho é imposta por lei”, finalizou a nota do CCP, assinada por Flávio Martins, presidente do Conselho Permanente do Conselho das Comunidades Portuguesas.

O documento foi enviado a José Cesário, Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, com a indicação de que fosse remetido aos gabinetes do Primeiro-Ministro, da Ministra da Saúde e da Secretária de Estado da Gestão da Saúde.

O artigo foi publicado originalmente em Gazeta Rural.


Publicado

em

,

por

Etiquetas: