CRISPR | Descoberta genética em cevada silvestre abre caminho para cereais mais resistentes ao clima extremo

Investigadores sequenciam pela primeira vez o genoma da Hordeum brevisubulatum, uma cevada silvestre capaz de prosperar em solos salinos e alcalinos. Os resultados deste estudo podem transformar a agricultura em regiões áridas onde a salinidade do solo é crítica.

Num avanço científico com implicações globais, uma equipa internacional de investigadores decifrou pela primeira vez o genoma completo da Hordeum brevisubulatum, uma cevada silvestre notável pela sua capacidade de crescer em solos salinos e alcalinos — condições onde a maioria das culturas agrícolas não sobrevive. Este feito poderá revolucionar o cultivo de cereais como o trigo, tornando-os mais resilientes às alterações climáticas.

O estudo, publicado em março de 2025 na revista Nature Plants, foi conduzido por investigadores da Universidade Murdoch, na Austrália, e da Academia de Ciências Agrícolas e Florestais de Pequim (BAAFS), na China. A sequenciação do genoma revelou mecanismos genéticos únicos que explicam a extraordinária resistência desta planta a ambientes hostis

Solos difíceis, planta resistente

Mais de mil milhões de hectares de solos agrícolas em todo o mundo são afetados por salinidade ou alcalinidade, um problema agravado pela irrigação intensiva, drenagem deficiente e pelas alterações climáticas. A Hordeum brevisubulatum, por outro lado, evoluiu ao longo de milénios para prosperar nestes solos adversos.

A análise genética revelou a duplicação de genes associados ao stress salino e alcalino, como o módulo CaBP-NRT2, responsável pela deteção de stress e pelo transporte de nutrientes essenciais, como o cálcio e o nitrato. Quando introduzido noutros cereais, este gene aumentou a absorção de nutrientes e a biomassa em solos degradados.

Um dos achados mais surpreendentes foi a identificação do gene Fhb7, oriundo de um fungo endofítico, introduzido através de transferência horizontal de genes — um fenómeno raro entre diferentes reinos biológicos. Este gene permite à planta neutralizar espécies reativas de oxigénio, compostos tóxicos que se acumulam em situações de stress ambiental.

Um novo cereal para enfrentar o futuro: Tritordeum AABBII

A partir deste conhecimento, os cientistas criaram um novo híbrido experimental: o Tritordeum AABBII, resultado do cruzamento entre trigo comum e a cevada silvestre. Este híbrido sintético, com seis conjuntos de cromossomas, mostrou ganhos promissores: um aumento de 48% na eficiência de absorção de nitrato e 28% na produtividade de grão em solos salino-alcalinos, em comparação com o trigo convencional.

Importa salientar que este novo Tritordeum é distinto do híbrido com o mesmo nome desenvolvido por investigadores espanhóis nas décadas de 1970 e 1980.

Implicações para a segurança alimentar global

As descobertas abrem novas possibilidades para regiões afetadas pela seca e pela salinização dos solos, como o norte do Chile, o sul da Austrália, partes da Índia, do Médio Oriente e de África. A edição genética, através de tecnologias como o CRISPR, poderá acelerar a adaptação de culturas tradicionais, como o trigo, a estas novas condições, reduzindo a dependência de fertilizantes e melhorando a sustentabilidade.

“Os nossos resultados oferecem um potencial transformador para a agricultura, especialmente em regiões áridas onde a salinidade do solo é crítica”, afirmou Chengdao Li, professor e investigador da Universidade Murdoch. “Esta é uma ferramenta genética poderosa para proteger a produção de cereais frente aos extremos climáticos e promover sistemas agrícolas mais sustentáveis até 2030.”

Leia o estudo na Nature Plants.

O artigo foi publicado originalmente em CiB – Centro de Informação de Biotecnologia.


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