A subida histórica nos preços do cacau está a atrair milhares de jovens nigerianos, com formação superior e experiência noutras áreas, de volta às zonas rurais. São os “rapazes do cacau”, protagonistas de uma nova corrida ao “ouro castanho”.
Criado na região cacaueira de Ikom, no sudeste da Nigéria, Anyoghe Akwa não via grande futuro na agricultura. Por isso, mudou-se para a cidade onde estudou engenharia civil e começou a trabalhar na construção.
Tudo mudou em 2023, quando soube que os preços do cacau estavam a disparar e que os agricultores da sua terra estavam a enriquecer.
“Vimos jovens de 20 anos, que nunca foram à universidade, a ganhar muito dinheiro com o cultivo de cacau, enquanto os que aspiravam a um doutoramento passavam dificuldades”, contou Anyoghe Akwa à Reuters.
“Começámos a regressar e a criar as nossas próprias plantações”.
Akwa, de 47 anos, faz parte de uma vaga de recém-chegados ao setor, a maioria homens a quem chamam “rapazes do cacau”, que trocaram profissões urbanas pela agricultura, atraídos pelos lucros inesperados.
Segundo a Associação de Produtores de Cacau da Nigéria, que representa pequenos agricultores, o número de membros aumentou em mais de 10 mil entre 2023 e 2024.
Um pedaço de terra por um vinho e cinco mil nairas
Em Ikom, no estado de Cross River, junto à fronteira com os Camarões, a maior parte das terras agrícolas pertence à comunidade. Por tradição, quem tem raízes na zona pode obter um lote oferecendo uma garrafa de vinho, alguma comida e cerca de 5000 nairas (2,5 euros).
Akwa herdou terrenos do pai e adquiriu mais alguns através dessa via. Plantou cacaueiros, cujas sementes dão origem ao cacau e, mais tarde, ao chocolate.
“No ano passado, colhi quatro sacos. Vendi o primeiro por 800 mil nairas (cerca de 440 euros), e os restantes entre um milhão e 1,2 milhões cada. Foi muito dinheiro”, contou, acrescentando que um único saco de cacau rendeu o equivalente ao seu salário anual como engenheiro civil.
Em 2022, um saco de 64 kg valia cerca de 60 mil nairas. Em 2024, Akwa chegou a vendê-lo por 1,2 milhões — 20 vezes mais.
A crise do custo de vida na Nigéria
A quebra de produção de cacau na Costa do Marfim e no Gana — os dois maiores exportadores mundiais, responsáveis por metade da produção global — fez os preços disparar de 2200 euros por tonelada métrica, em 2022, para quase 9700 dólares em dezembro de 2024, segundo a Organização Internacional do Cacau.
Este aumento coincidiu com a pior crise económica da Nigéria em mais de 30 anos, com milhões de nigerianos a mergulhar na pobreza.
Mas os produtores de cacau foram relativamente protegidos, a desvalorização da naira tornou as exportações mais rentáveis.
O setor beneficia não só os agricultores, mas também os intermediários, os chamados agentes de compras licenciados (LBA, na sigla em inglês), que armazenam os grãos e os vendem aos exportadores.
Ndubuisi Nwachukwu, de 48 anos, deixou o setor bancário em 2022 para se tornar LBA.
“O que ganhei nestes poucos anos como LBA supera largamente todos os salários que recebi como banqueiro”.
Em Ikom e noutras zonas produtoras, os “rapazes do cacau” estão a dinamizar as economias locais.
“Podes chamar-me rapaz do cacau. Hoje, quem fala de cacau é visto como alguém importante”, disse Mark Bassey, de 41 anos, ex-cientista de laboratório médico, agora agricultor na sua terra natal.
Em criança, seguia a mãe até à plantação por isso as técnicas são-lhe familiares. Tal como Akwa, queria algo diferente para a sua vida e estudou ciências na universidade. Mas o rendimento era insuficiente.
“Ainda tenciono regressar à minha profissão, porque gosto dela, mas para já quero dedicar-me à agricultura”, disse Bassey, que quadruplicou os rendimentos.
Contrabando de cacau
A Nigéria é o quarto maior produtor mundial de cacau, com 315 mil toneladas métricas em 2023, segundo a ICCO. Muito atrás da Costa do Marfim (2,2 milhões) e do Gana (654 mil).
O afluxo de novos agricultores, novas variedades de cacaueiro com frutos em apenas 18 meses e os programas estatais de distribuição gratuita de mudas deviam estar a impulsionar a produção — mas isso não se reflete nos números oficiais.
“Tudo junto, a produção nigeriana já devia ter duplicado”, afirmou Rasheed Adedeji, diretor de investigação e estratégia do Instituto de Investigação do Cacau da Nigéria.
Segundo ele, cerca de 200 mil toneladas são anualmente contrabandeadas para fora do país, o que ajuda a explicar o desfasamento.
O instituto recebeu mais de meio milhão de pedidos de novas mudas este ano, o suficiente para plantar 400 mil hectares, três vezes mais do que em igual período de 2024.
Apesar das boas perpetivas na plantação de cacau, alguns mantêm os empregos anteriores. Akwa divide-se entre a plantação e os estaleiros de construção, onde lidera equipas.
“Não durmo, estou sempre a telefonar-lhes para saber se fizeram isto ou aquilo”.
Mas está atento. Se os preços se mantiverem, admite dedicar-se em exclusivo à agricultura.
“Pelo que vejo, é possível que me torne agricultor de cacau a tempo inteiro”.