A Comissão Europeia apresentou na última quarta‐feira as primeiras propostas para o Quadro Financeiro Plurianual, o orçamento da União Europeia (UE) para 2028‐2034, e confirmam‐se as piores expetativas no que diz respeito ao dinheiro que vai estar disponível para a agricultura e floresta, ou seja, para a produção de alimentos.
Para manter os níveis de apoio que foram disponibilizados no atual quadro, o próximo orçamento europeu deveria prever para a agricultura, em termos reais, mais de 480 mil milhões de euros, mas apenas propõe 300 mil milhões. É um corte brutal, perto dos 38%, ao mesmo tempo que prevê multiplicar por cinco as verbas destinadas à indústria do armamento, uma clara e inaceitável inversão de prioridades.
Este corte, a concretizar‐se, levará à falência milhares de explorações agrícolas europeias e, em última análise, provocará o aumento das importações e uma subida generalizada dos preços da alimentação. A pesada fatura belicista da UE irá, inevitavelmente, ser paga pelos consumidores europeus.
Outra e má novidade será a integração dos fundos da Política Agrícola Comum (PAC) num fundo único, que apenas tem como objetivo tentar mascarar os cortes, quer na agricultura quer, por exemplo, no apoio à competitividade das restantes atividades económicas. Com esta opção, a Comissão Europeia dilui, numa abordagem geral, os apoios ao sector, ao mesmo tempo que mantém as restritivas regras da PAC que os agricultores têm de cumprir para exercer a sua actividade, ou seja, mantêm‐se as obrigações, mas corta‐se nos apoios.
Não é o fim da PAC, mas sim o fim dos apoios da PAC, já que todas a regras, nomeadamente as que permitem a desregulação e liberalização total dos mercados, vão continuar.
A situação pode ser ainda mais grave no que respeita às verbas dedicadas ao desenvolvimento rural, uma vez que não está garantida a sua manutenção. Ou seja, tal como está, não será obrigatório que estas verbas continuem ao dispor do desenvolvimento da agricultura e do mundo rural. É importante ter em conta que no atual período (2021‐27) o valor destinado ao desenvolvimento rural em Portugal ascende a 4 mil milhões de euros, que incluem não só as medidas de apoio ao investimento, mas também medidas de apoio agro‐ambiental, o apoio ao rejuvenescimento da agricultura e medidas que garantem, por exemplo, que a agricultura em zonas de montanha possa continuar a ser praticada.
É ainda apresentada uma “modulação e plafonamento” das ajudas diretas, mecanismo que a CNA defende há muito, mas, também aqui, é necessário ter em conta, de facto, do que se fala. Em Portugal são pouco mais de 400 as empresas agrícolas que recebem, cada uma, por ano, mais de 100 000€ de apoios desligados. Ou seja, a aplicação de um teto máximo de 100 000€ neste tipo de ajudas apenas afetaria 0,2% dos beneficiários da PAC em Portugal.
No entanto, a CNA defende que este plafonamento deveria existir para reforçar as ajudas dos agricultores de menor dimensão e não, como agora é apresentado, para mitigar cortes no orçamento global da PAC.
Do que se conhece das propostas da Comissão é evidente um caminho de nacionalização dos apoios da PAC, que, na verdade, se iniciou no atual quadro e que agravará ainda mais as injustiças na distribuição dos apoios entre os vários agricultores europeus.
Assim, esta proposta não defende nem agricultores nem consumidores, compromete o desenvolvimento rural, apenas beneficia a indústria da guerra, compromete a nossa soberania alimentar e, por isso, deve ser fortemente contestada.
A CNA, que sempre lutou por uma PAC mais justa para todos, vai continuar a fazê‐lo quer junto das instituições europeias quer junto do governo português.