O setor florestal “tornou-se demasiado discreto do ponto de vista da compreensão do seu valor económico”, o qual “é significativo”, diz António Ramalho, sublinhando que a indústria de base florestal – cortiça, mobiliário e pasta de papel – representa 4% do PIB, cerca de 9% das exportações, contribuindo positivamente para a balança comercial, e 80 mil empregos. No 36.º episódio do podcast Partida de Xadrez, que vai para o ar esta segunda-feira no site do Negócios e nas principais plataformas, o gestor reconhece, contudo, que existem “grandes desequilíbrios entre os proprietários dos terrenos e quem desenvolve essas fileiras”. E por isso avisa que “se não tivermos os incentivos certos dificilmente podemos ter a expectativa que a floresta seja adequadamente tratada pelos proprietários”.
Para Gonçalo Moura Martins, “em Portugal, como na generalidade dos países do sul da Europa, a floresta enfrenta dois grandes desafios: o desordenamento e desertificação do interior e o incendiarismo”. Em seu entender, “a fragmentação é terrível porque inibe a tecnologia, o ordenamento e práticas de cultivo e de manutenção sustentável da floresta”, lembrando que “nas grandes manchas florestais exploradas por uma entidade o risco de incêndio diminui pelo menos quatro vezes e a exploração económica é muito mais eficaz”.
Se 97% da floresta é privada, distribuída por cerca de 400 mil pequenos proprietários – muitos que desconhecem a localização dos seus terrenos -, Moura Martins defende que o Governo devia incentivar a concentração, criando apoios para que quem queira desenvolver o terreno possa comprar a outros. Para o gestor, também o sequestro de carbono que a floresta permite poderia resultar, mesmo para um pequeno proprietário e ainda que com regras, “numa fonte adicional de financiamento da floresta”.
A estes incentivos, António Ramalho acrescenta ainda os subprodutos do mato e da biomassa, que “podem trazer valor acrescentado e poderiam funcionar como antídoto muito eficaz para o sistema de incêndios”.
Nesta matéria, os dois gestores salientam o “bom caminho” que o país tem feito desde o “trauma social” provocado pelos fogos florestais de 2017. Gonçalo Moura Martins sublinha que o investimento em prevenção e no combate subiu de 143 milhões em 2017 para 638 milhões em 2024, ano em que “pela primeira vez desde 2020 o que gastamos em prevenção é superior (55%) ao que gastamos no combate”. “Portugal é dos poucos países na Europa em que isso acontece”, diz, sublinhando esse “esforço silencioso do Estado”, e frisando que “esse investimento na prevenção nota-se nas estatísticas” com a diminuição da área ardida, do número de incêndios, da dimensão dos incêndios e dos incêndios nos dias de maior perigo.
Também António Ramalho salienta a maior eficácia registada em Portugal nesta matéria, mas defende a necessidade de se continuar “a investir fortemente e continuadamente na preservação, nomeadamente na redução do risco de incêndio, que tem tido um bom caminho nos anos recentes, mas que precisa de continuar”. Para o gestor, há duas vitórias do país, que deixou de liderar a tabela dos que mais ardem na Europa: “Portugal já não está como país onde há uma ineficácia na proteção da sua floresta” e “retirou da discussão a distribuição da tipologia de floresta que tínhamos”.