
No dia 25 de Março de 2021, o Governo de então, pela mão da ministra da Agricultura, Maria do Céu Antunes, aprovou a transferência de competências em matéria do bem-estar dos animais de companhia do seu Ministério para o Ministério do Ambiente.
Na mesma altura, foi ainda aprovada a criação da figura do Provedor do Animal, com a missão de garantir a defesa e a promoção do bem-estar animal. Os dados apontavam que houvesse, à data, cerca de três milhões de animais de companhia registados em Portugal.
Esta transferência de tutela política e de competências surgiu após um trágico incêndio em dois canis ilegais localizados numa zona florestal da freguesia da Agrela, em Santo Tirso, que provocaram a morte, por carbonização, de 69 cães e 4 gatos.
Como solução para a alegada falta de zelo com os animais de companhia, e com vista a evitar situações semelhantes, o Governo de então anunciou a transferência das responsabilidades das questões dos animais de companhia para o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), tutelado pelo Ministério do Ambiente, retirando essas competências à Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), que está na tutela da Agricultura.
Muita contestação à transferência de competências
Isto, embora apesar destas mudanças a DGAV se tenha mantido como autoridade sanitária veterinária nacional, com todas as competências relativas às matérias de saúde animal.
A medida da transferência das responsabilidades para o ICNF gerou muita contestação nos meses que se seguiram. Para além dos partidos políticos, múltiplos especialistas reagiram contra e alegaram que a decisão de transferir a tutela dos animais de companhia da Agricultura para o Ambiente contrariava as orientações da Organização Mundial da Saúde Animal (OIE) e da Federação dos Veterinários da Europa (FVE).
O PSD/CDS, que em 2021 estava na oposição e se tinha levantado contra a medida, mal tomou posse para um novo Governo em 2024, legislou para alterar a situação. E, em abril de 2024, a tutela dos animais de companhia regressou à DGAV e à alçada do Ministério da Agricultura, que agora é liderado pelo ministro José Manuel Fernandes.
14,5 milhões para reforçar o bem-estar animal
E, esta semana, o Governo deu um novo passo. Através da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), anunciou que vai disponibilizar, em 2025, “o maior pacote de apoio de sempre, no valor de 14,5 milhões de euros, para reforçar o bem-estar animal em Portugal”.

Em cima da mesa está o investimento em infraestruturas, cuidados veterinários, medicamentos, esterilização, identificação eletrónica, apoio social às famílias, formação e sensibilização.
“A nova agenda nacional que o Ministério da Agricultura e Mar está a implementar assenta numa estratégia integrada e de cooperação. É um ciclo mais ambicioso, conduzido pela DGAV, em articulação com a Provedora do Animal, as autarquias locais, a Ordem dos Médicos Veterinários e a Federação de Defesa e Resgate Animal”, refere o Ministério da Agricultura, em comunicado difundido nesta sexta-feira, 26 de setembro.
Conjuntamente, estas entidades estão a construir uma política pública centrada na responsabilização pela detenção de animais de companhia, que quer “reforçar a responsabilização individual e coletiva na posse de animais de companhia”; “expandir os programas de esterilização” dos animais; “potenciar a adoção responsável”; “fortalecer os mecanismos locais de apoio às famílias e às autarquias”, “promove a proximidade na resposta, através de uma rede de cuidados de base local”; “desenvolver processos educativos de médio e longo prazo, promovendo uma mudança cultural efetiva”.
Campanha de esterilização de cães e gatos
A estratégia assenta na visão de “Uma Só Saúde”, que afirma o bem‑estar animal como “parte indissociável da saúde pública e da qualidade de vida das comunidades”.
Uma “parte substancial” dos 14,5 milhões de euros de investimento agora anunciados dirige-se à campanha nacional de esterilização de cães e gatos e ao reforço da identificação eletrónica, que o Governo considera “pilares fundamentais no combate ao abandono animal”, que é um “problema estrutural” em Portugal.
A estratégia aposta igualmente na “promoção da detenção responsável de animais de companhia”, partindo da premissa de que “a adoção ou aquisição de um animal de companhia deve ser uma decisão planeada, consciente e responsável”. Deve, aliás, ser assumida como “um compromisso ético e permanente de cuidado, saúde e bem‑estar”, que começa no momento da adoção ou aquisição e se prolonga por toda a sua vida.
Também as despesas com a alimentação e cuidados veterinários de animais de famílias carenciadas serão comparticipadas, com a criação de um banco alimentar animal em parceria com os centros de recolha oficial e associações zoófilas. O Governo quer “garantir que nenhum animal em situação de vulnerabilidade fica sem cuidados ou sem alimentação adequada”.

Também serão criadas “instalações para animais de companhia em estruturas de acolhimento temporário”, nomeadamente casas abrigo para vítimas de violência doméstica, em instalações de acolhimento para sem abrigo e estruturas residenciais para pessoas idosas.
Os apoios privilegiam a proximidade territorial, reforçando a capacidade de intervenção das autarquias locais e associações zoófilas, em articulação com os médicos veterinários municipais. Entre as medidas elegíveis está a aquisição de viaturas médico-veterinárias.
Em articulação com a Agência para a Modernização Administrativa (AMA), e no quadro mais vasto da reforma administrativa do Estado, está em desenvolvimento o Documento de Identificação de Animal de Companhia (DIAC), em formato digital.
Este novo instrumento permitirá integrar os dados dos animais de companhia na aplicação oficial Gov.pt, facilitando o registo, simplificando procedimentos e aproximando cidadãos, médicos veterinários e entidades públicas.