Perspetiva-se que, num futuro próximo, os instrumentos de gestão de riscos(seguros agrícolas e fundos) venham a desempenhar uma importância crescente no apoio ao rendimento dos agricultores, quer em consequência do impacto que as alterações climáticas provocam na agricultura (potenciando a exposição da produção agrícola ao risco a que já está sujeita),quer pela previsibilidade de redução dos apoios diretos atribuídos no âmbito da PAC (que nalguns casos representam uma parte muito significativa do rendimento dos agricultores).
No meu entender, é importante e urgente, que se faça uma aposta clara nestes instrumentos, criando condições, quer para dinamizar os já existentes (seguro agrícola), quer para que surjam novos produtos, que permitam o alargamento das opções de cobertura de risco, por forma a mitigar os efeitos que a ocorrência de fenómenos climáticos adversos, pragas e doenças podem provocar na produção.
No entanto, para que qualquer destes instrumentos possa ser criado, é necessário, elaborar estudos prévios que permitam, avaliar a sua exequibilidade (note-se que se a taxa de risco for muito elevada o agricultor não contrata o novo risco ou o novo produto).
Estes estudos prévios incluem, entre outros aspetos, os seguintes:
– rigorosa definição do risco, baseada na interligação entre a ocorrência do fenómeno climático e os efeitos provocados na cultura;
-análise de dados estatísticos relativos à frequência e intensidade com que ocorre o fenómeno climático (dados meteorológicos, produções), abrangendo uma série de anos, o mais longa possível (o que regra geral, implica um grande volume de dados a tratar).
Ora é aqui que as limitações começam, na medida em que, na maior parte dos casos, faltam dados para se realizarem estes estudos, que indiquem o comportamento das culturas face à ocorrência de determinados fenómenos, ou seja que permitam perceber a relação causa efeito.
Atendendo à circunstância de, há muitos anos, ter sido abandonada a experimentação agrícola que era feita pelo ministério da agricultura (designadamente a partir das estações agrárias), e que poderia fornecer a informação relevante para a elaboração deste tipo de estudos, justifica-se, no meu entender, que, quanto antes, se encontrem as soluções, que permitam colmatar, numa forma relativamente simplificada, esta lacuna.
Parece-me que uma solução para ultrapassar este constrangimento, poderia passar, pela criação de um Programa para Registo e Tratamento de Dados (com eventual apoio comunitário para financiamento de despesas), que permitisse, no essencial, desenvolver as seguintes ações:
1 – Definição, pelo Ministério da Agricultura, das culturas e variedades (mais representativas) que se pretendem estudar (no inicio, a título experimental, eventualmente circunscrito às culturas permanentes), bem como as zonas a abranger (de preferência relativamente perto de postos meteorológicos) e a respetiva área cultivada.
2 – Celebração de um protocolo entre as Direções Regionais do Ministério da Agricultura, e os agricultores (criado no âmbito do referido Programa), as quais selecionariam as explorações agrícolas que reúnem melhores condições para satisfazer os requisitos pretendidos para a recolha de dados.
3 – Monitorização pelos técnicos das Direções Regionais, da evolução do ciclo vegetativo das culturas e variedades escolhidas, os quais passariam a, periodicamente, recolher informação diversa, designadamente no que se refere às datas de inicio e fim dos vários estados fenológicos, e à existência de eventuais anomalias associadas, quer à ocorrência de fenómenos meteorológicos (envolvendo no programa a colaboração do IPMA), quer provocadas por pragas ou doenças. A recolha desta informação seria feita através do preenchimento de um relatório de acompanhamento, elaborado para o efeito com itens predefinidos, que permitisse o carregamento dos dados numa aplicação informática criada como suporte do referido programa. Na altura da colheita, o relatório seria complementado com o registo dos dados produção/produtividade, quer em termos quantitativos quer qualitativos, correspondentes à área da cultura em estudo.
4 – Tratamento da informação recolhida ao nível de um serviço central do Ministério da Agricultura, cruzando os dados da produção, com os parâmetros meteorológicos ocorridos ao longo dos vários estados fenológicos do ciclo da cultura
A recolha, o tratamento e a análise desta informação (ao longo de uma série representativa de anos), quer assente no processo atrás referido, quer noutro qualquer( por exemplo envolvendo as OP´s e associações de agricultores), poderia constituir um referencial importante, para avaliar da adaptabilidade das culturas e variedades às várias zonas do país onde são cultivadas (quer se tratem de culturas e variedades ainda relativamente novas, como é o caso dos frutos secos, atualmente em grande expansão, quer das já há muito existentes, mas que podem vir a mostrar-se desadaptadas face às alterações climáticas).
A existência desta informação, poderia assim, dar um contributo precioso em vários aspetos, não só quanto à criação de instrumentos de gestão de riscos adequados, mas também para servir de referência aos agricultores, ajudando-os a optar pelas soluções mais ajustadas, quando pretendem efetuar investimentos.
Joaquim Sampaio
Engenheiro Agrónomo
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