Gonçalo Castel Branco

A paisagem florestal portuguesa é pobre – Gonçalo Castel’Branco

A paisagem florestal portuguesa é pobre. De uma perspetiva macro, se retirarmos as áreas de montado de sobro, as áreas de pinhal do litoral (nomeadamente algumas matas nacionais) e as grandes florestas comerciais de eucalipto, ficamos com tudo o resto. Esse tudo o resto, que é a maior parte do território florestal de Portugal, é extremamente pobre.

A paisagem florestal portuguesa é feita de retalhos, de pequenas propriedades que possuem matos, pinheiro bravo e eucalipto. Nessa paisagem não há continuidade da cobertura florestal, a qual deveria ser dada pelas copas das árvores dessas espécies. Quantos aos pinheiros bravos, há grandes clareiras sem estes, mas também há áreas demasiado densas. Quanto aos eucaliptos, há aqueles que brotam cheios de varas muito além da 3ª rotação, consequentemente com baixo crescimento e muitas falhas (mortalidade elevada). Toda essa panóplia é caracterizada por um zero de operações de silvicultura. Há matos por todo o lado, há regeneração de jovens pinheiros bravos abundante (devido à facilidade com que esta espécie se dissemina), os pinheiros bravos não são desramados, os caminhos vão ficando fechados e os aceiros e áreas de descontinuidade agrícola cada vez menos existem. Estas áreas sem divisões no território muitas vezes são intransponíveis a pé e constituem um barril de pólvora pronto a arder. E é pobre, pois o espaço está sistematicamente mal aproveitado, sem continuidade e sem escala em dimensão, de forma que seja economicamente interessante investir nas operações de manutenção (remoção de cepos de eucalipto, desramação dos pinheiros bravos, limpeza da regeneração natural, limpeza do mato, fogo controlado, etc.). A escala é tão diminuta que não permite sequer prover operações que seriam supostamente rentáveis, como o desbaste, o corte raso e a resinagem.

A terra florestal está tão mal aproveitada por árvores que facilmente se olham para 5 hectares de floresta adulta portuguesa sabendo que conseguir-se-ia concentrar tudo aquilo em apenas 1 hectare! Isso significa que cada hectare de terra que tem apenas 50m3 de madeira poderia ter 250m3. A minha perceção florestal diz-me que não devemos andar longe dessa proporção.

O problema dos incêndios florestais em Portugal está intimamente relacionado com a pobreza da nossa floresta. E em espaços sem valor não há razão para se investir. Aguarda-se apenas que surja uma qualquer ignição para o incêndio o consumir.

Mudar o estado de coisas e tornar esses espaços florestais mais resilientes ao fogo é possível se conseguirmos uma só coisa que tudo resume: tornar também essas florestas valiosas.

Gonçalo Castel’Branco

Engenheiro Florestal

 

Algumas fotografias que complementam o artigo:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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