Casa do Douro: regresso a 1932 – Editorial de Teresa Silveira + Suplemento AgroVida

[Fonte: AgroVida]

Lê-se a letra do projeto de lei conjunto do PS+PCP+BE que quer restaurar a Casa do Douro (CD) como associação pública de inscrição obrigatória para todos os viticultores da Região Demarcada do Douro (RDD) e não se quer acreditar. O calendário diz que estamos em 2019, mas assola-nos o sentimento de estarmos perigosamente a regressar a 1932.

Consultada a memória, fui recuperar uma intervenção a que assisti em fi nais de 2014 na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douto (UTAD). Interveio um técnico do GPP do Ministério da Agricultura sobre o tema “Cenários de viabilização das Organizações Agrícolas regionais”.

O autor, cujo nome não lembro, lembrou as cooperativas agrícolas criadas pelo Estado Novo a partir da década de vinte, citando os grémios da lavoura, casas do povo e de pescadores. E apontou o cooperativismo agrícola como elemento fundamental do sistema corporativo de planificação central, com concentração da produção e controlo dos mercados, mas, atenção!, cerceando a liberdade destas organizações e controlando-lhes as atividades, não fossem por ali emergir focos de oposição ao regime.

Não é crível que, 45 anos depois do 25 de abril de 1974, e pela mão dos três partidos da esquerda democrática parlamentar, voltemos a um passado tão bafiento, centralista e controlador. Porém, o projeto de diploma que se conhece – de criar uma associação pública de inscrição obrigatória na RDD, que é caso único no país e de que não há exemplo noutra região demarcada do mundo – não deixa de ser revelador das tentações do poder central quando olha para o Interior.

À parte da constitucionalidade duvidosa e da aparente violação do princípio da livre associação apontada por juristas, estamos perante um olhar paternalista de Lisboa sobre o Douro e a RDD. Como se os seus viticultores fossem diferentes, acéfalos ou incapazes de tomar nas mãos o seu destino e tivesse de ser o Estado a ditar regras e guiá-los para o futuro.

É um facto que há desequilíbrios graves entre produção e comércio, que vendeu 556 milhões de euros de vinho em 2018. E é certo que, nos cerca de 45 mil hectares de vinha do Douro trabalhada por 33 000 viticultores (em média cada um com um hectare), o preço pago pelas uvas, para mais com tamanhos custos de produção, está muito aquém do justo.

Mas, em Portugal, na UE e em 2019, tal não faz sentido.

Teresa Silveira

→Descarregue aqui o Suplemento AgroVida de abril de 2019←


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