Francisco Sarmento

Segurança Alimentar | Entrevista a Francisco Sarmento

A segurança alimentar é algo imprescindível. Porém, “podem ocorrer quebras muito importantes na produção alimentar mundial se a saúde das plantas não for encarada de forma responsável e com inovação”, afirma o chefe do escritório de informação da FAO – Organização da ONU para a Agricultura e Alimentação, em Portugal – Francisco Sarmento.

1. Quais são as linhas prioritárias de atuação do escritório da FAO em Portugal e no que consiste a Estratégia de Segurança Alimentar e Nutricional da CPLP?

A nossa principal missão é a sensibilização da opinião pública para os objetivos estratégicos da FAO e o apoio na implementação da Estratégia de Segurança Alimentar e Nutricional da CPLP-Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, assinada pelos chefes de Estado dos 9 países membros em 2012.

Esta Estratégia surgiu no contexto da grave crise dos preços dos alimentos em 2008-2009 e na sequência da reforma do Comité Mundial de Segurança Alimentar da ONU, que visa estabelecer uma plataforma alargada de governo do sistema alimentar global, com vista a eliminar o flagelo da fome. A Estratégia é uma parceria entre a FAO e a CPLP com 3 eixos de ação: construção de uma governança adequada para o sistema alimentar dos países da CPLP; proteção social de grupos vulneráveis à insegurança alimentar (quem tem fome não pode esperar) e fortalecimento da agricultura familiar. A FAO considera que a fome e a má nutrição se resolvem com políticas públicas adequadas.

2. Qual o papel de Portugal no fortalecimento da agricultura familiar da CPLP?

Portugal posiciona-se como país cooperante dos restantes membros da CPLP, com recursos e meios técnicos e humanos, mas também tem os seus problemas para resolver em matéria de agricultura familiar. No entanto, é preciso que se diga que Portugal iniciou um processo de alguma desconexão face aos sistemas alimentares dos restantes países da CPLP, que ainda não conseguiu inverter. Portugal tem um imenso know-how em matéria de agricultura e alimentação que deve ser aproveitado para cooperar com estes países, embora com um novo modelo face à sua posição de membro da União Europeia.

3. Considera que a população (maioritariamente urbana) está ciente dos desafios da agricultura? Que medidas devem ser tomadas pelo setor agrícola para aproximar o consumidor da agricultura?

Tenho dúvidas, porque o grau de industrialização dos alimentos e os locais onde se compram (maioritariamente supermercados) distancia os consumidores da base produtiva. No entanto, as gerações mais jovens mostram maior preocupação com o que comem, pode ser uma tentativa de aproximação.

A educação e a sensibilização dos consumidores nos locais de venda é importante, tal como a inclusão das preocupações da agricultura nos currículos escolares do ensino básico e secundário. O trabalho conjunto entre os ministérios da Agricultura e da Educação, com a participação dos agricultores, é o que pode gerar maior aproximação entre consumidor e agricultura. Os Conselhos Nacionais de Segurança Alimentar e Nutricional nos países da CPLP podem ser fóruns relevantes para concertar ações conjuntas.

4. Qual é a importância da fitossanidade na prossecução dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável?

A fitossanidade (saúde das plantas) tem uma repercussão imensa no sistema alimentar. A disseminação de pragas e doenças é agravada pela globalização e se estas não forem devidamente controladas podem pôr em causa o aprovisionamento regular de alimentos numa série de geografias. É um problema grave e muito preocupante devido às resistências crescentes das pragas e doenças a determinados produtos fitossanitários, que deixaram de ser eficazes, tal como acontece com os medicamentos para a saúde humana. Há um mundo imenso de desafios na sanidade vegetal e se não forem abordados de forma séria e responsável, numa perspetiva multiator, podemos ter quebras muito importantes na produção alimentar mundial. É preciso que o consumidor não dê a alimentação por garantida.

5. Como conciliar a necessidade de produzir mais alimentos com políticas cada vez mais restritivas ao uso de produtos fitofarmacêuticos?

Inovação é a resposta. Deve haver uma forte determinação da indústria em inovar, mas é necessário um ambiente institucional e regulamentar que favoreça a Inovação. A atitude responsável por parte dos Governos e dos organismos internacionais consiste em remover obstáculos à construção da Inovação. Devemos olhar para os problemas da fitossanidade e o seu impacto na produção de alimentos e construir coletivamente um caminho merecedor do envolvimento ativo e do compromisso de todas as partes. Conciliar os circuitos de produção e fornecimento regular de alimentos à população mundial com questões de sustentabilidade ambiental, saúde e equidade alimentar só é possível com Inovação: técnica, institucional e de políticas públicas. E isso só se consegue com um pacto, onde a indústria é uma parte fundamental.


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