[Fonte: Terra Maronesa] A cadeia causal que relaciona o consumo de combustíveis fósseis com o crescimento económico, a concentração de CO2 da atmosfera e a temperatura do planeta é corroborada por um manancial tão vasto de evidências que pode ser assumida como verdade científica.
Se o aquecimento global compromete irremediavelmente a capacidade de sustentabilidade de populações humanas do planeta, então a descarbonização da economia é um imperativo social.
Desde a publicação pela FAO em 2006 do relatório “Livestock’s Long Shadow: Environmental Issues and Options” que a pegada ecológica e as emissões de gases de estufa (CO2 + CH4) da produção animal e, implicitamente, o consumo de carne, têm sido objeto de um amplo escrutínio científico. Dele emerge uma importante conclusão: os sistemas de produção animal não são idênticos e o consumo de carne nem sempre está associado a uma pegada ecológica de sinal negativo.
Os novilhos engordados a milho e soja ou nas pastagens da América do Sul têm custos ambientais devastadores que, para além da eructação de gases de estufa, passam pela destruição da floresta tropical amazónica, a aplicação de quantidades maciças de fertilizantes fosfatados (um recurso não renovável), e a emissão de CO2 de origem fóssil através do transporte de animais e carnes por via terreste a longas distâncias (o sistema ferroviário sul-americano é incipiente) e da travessia do atlântico em navios ou aviões com sistemas frigoríficos.
Os criadores de gado Maronês, uma raça bovina autóctone com solar na Serra do Alvão e montanhas limítrofes, estão a desenvolver um sistema inovador, alternativo, de produção animal amigo do ambiente, assente na maximização do bem-estar animal.
Aqui, a maior parte dos alimentos animais é gerado no monte ou nos lameiros, um habitat rede natura 2000. A substituição de ração pela forragem reduz o consumo de combustíveis fósseis por unidade de produto, e deprime a expansão da vegetação arbustiva e a acumulação de combustíveis no monte. Em contrapartida, a vegetação responde com uma maior produtividade primária, predominantemente constituída por plantas herbáceas palatáveis.
Os antibióticos e as contas de veterinário foram praticamente excluídos do sistema.
As nossas vacas vivem permanentemente, ou quase, ao ar livre. O solar da Maronesa é a terra das vacas livres. Os nossos animais expressam sem restrições comportamentos inatos jamais silenciados pela domesticação. Em poucos anos reaprenderam a defender-se do lobo, a escolher os rebentos mais nutritivos da carqueja e do tojo e a abrigarem-se das intempéries. Sobem, sozinhas, ao planalto no Verão, e descem ao vale no Inverno. Boa parte são cobertas, parem e amamentam na montanha sem a intervenção do Homem. Organizam-se em grupos de defesa mútua, sob a liderança de uma vaca alfa. E os vitelos socializam em creches e desde cedo aprendem com as mães a adotar comportamentos defensivos, a cooperar e a alimentar-se.
As manadas de Maronesa pouco se distinguem, quer no fenótipo, quer no comportamento, do auroque ancestral que há milhares de anos percorria as nossas serras, e cuja pressão de herbivoria condicionou a evolução da nossa flora.
Os homens seguiram as vacas. Há mais criadores na serra que, entretanto, recuperaram saberes erosionados por décadas de apoio público aos sistemas de estabulação ou semi-estabulação. Os nossos criadores são agora mais eficientes e têm mais tempo livre. Estão cientes dos riscos ecológicos representados pelos fogos severos que martirizaram a montanha e as suas pastagens nas últimas décadas, e disponíveis para aderir às técnicas de fogo controlado.
Sabemos hoje que os fogos severos mineralizam (queimam) a matéria orgânica do solo com emissões que podem ultrapassar as 60 t de CO2/ha. E uma pastagem de montanha que tenha como ponto de partida um solo degradado pelo fogo fixa ainda mais carbono que o padrão de 6,5 t de CO2 por hectare e por ano de uma pastagem semeada em solos devassados pela cerealicultura.
Graças à pastorícia extensiva, o fogo deixou de ser uma ameaça e converteu-se num instrumento de gestão.
A associação Terra Maronesa é um grupo de interesses preocupado com a sustentabilidade ambiental das montanhas do Noroeste e a sustentabilidade económica dos seus cuidadores – os nossos criadores de gado. Tendo em consideração a argumentação exposta, e em resposta às preocupações publicamente demonstradas por Vossa Excelência, vimos por este meio oferecer os nossos préstimos à Universidade Coimbra.
A posição tomada publicamente por Vossa Excelência é contraproducente – contribuí para a desinformação da opinião pública com consequências ecológicas e económicas potencialmente perversas. Permita-nos, por isso, uma sugestão: em vez da exclusão da carne bovina, que se integre o consumo de carne Maronesa no sistema de cantinas da sua Universidade. Disfrutar de um prato de carne Maronesa, sentados à mesa com colegas e amigos, a recompor dos esforços que o estudo implica, é uma forma simples e saborosa dos alunos da Universidade de Coimbra contribuírem para um ambiente melhor, que afinal é o seu habitat.