João Dinis

Alterações Climáticas – Quid pro cuo? – João Dinis

“… Todo o mundo é composto de mudança.
Tomando sempre novas qualidades.

…E afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía.”
Camões
(“como soía” = como de costume)

Estes versos premonitórios foram escritos há mais ou menos 450 anos pelo mui talentoso e mui sábio Camões. Sim, enquanto houver Mundo, haverá nele mudanças/alterações…com novas características…

Sim, atravessamos um tempo em que “aceleram” alterações climáticas com várias (más) consequências.  Portanto, trata-se de uma questão civilizacional o enfrentar-se, para anular, as causas profundas que determinam os exageros que “aceleram”, em mau sentido, tais alterações. Causa próxima são as emissões para a atmosfera dos “GEE, Gases do Efeito Estufa” com o  Anidrido Carbónico,  CO 2, à frente, e a subir lá para cima, a poluir e a proporcionar o aquecimento das atmosferas e deste nosso querido Planeta.

Mas, cá por baixo, o sistema dominante “fabrica” o CO 2 (e outros) através da produção super-intensiva de serviços, bens e mercadorias, e de transportes, de todos os tipos e para todas as finalidades, por forma a sustentar aquela perigosa mega-fraude – económica – social – política – da “competitividade dos mercados livres”, o tal “neoliberalismo” de tipo multinacional e imperialista, em que se especializaram os países ditos “desenvolvidos” e seus “trusts” económicos e financeiros, e respectivos “executivos”, nestes incluída a larga maioria dos governantes.  Entretanto, também cá por baixo, tentam resistir, e sobreviver, aqueles sistemas sócio-económicos menos “competitivos”, afinal os menos poluentes e menos emissores de GEE, incluindo o CO 2.

Assim, não passará de pura ingenuidade estarmos à espera que os grandes e mais poderosos países – os grandes emissores de GEE – venham, “simplesmente”, a deixar de os emitir sem que haja uma luta forte – externa e interna – e a convergir para  esse objectivo…

As Alterações Climáticas

Não podem servir como uma grande “lavandaria” do sistema dominante…

Não pretendemos subestimar o problema das mudanças críticas que se vêm precipitando nestes âmbitos do clima, e do ambiente em geral, e suas más consequências.  Não pretendemos menorizar todas aquelas Pessoas – e são muitíssimas — que estão alarmadas e de alguma forma procuram intervir e juntar forças para fazer inverter este processo.

Todavia, não devemos deixar-nos alarmar tanto, de forma quase acrítica, a ponto de pensarmos e actuarmos como o sistema dominante quer que pensemos e que actuemos…para o servirmos !  Ou seja, não podemos cruzar os braços ou calar a boca, e permitir que o “aquecimento global” e as “alterações climáticas” sirvam como uma grande “lavandaria” onde o sistema dominante lave cara e mãos, afinal, sujas dos GEE que “fabrica” e emite…

Sim, assiste-se a uma permanente e intensa intoxicação das nossas cabeças a pretexto dos problemas – reais – que temos com as alterações climáticas.  Enfim, não queremos meter estas Entidades todas no mesmo saco mas, na verdade, elas convergem para o tema em apreço:-  é que vem o famigerado FMI e fala em “alterações climáticas”… vem a União Europeia e quase não fala de outra coisa… o Governo Português fala nisso de microfone na boca para ampliar a propaganda…o Vaticano professa agora uma religião em estilo mais “ambientalista”…a ONU, e António Guterres (…) o mais que falam é em “alterações climáticas” e em “emergência climática” e dão-lhes toda a prioridade política. E fazem-no mesmo neste preciso momento em que o Médio Oriente arde e parece pronto para explodir em nova e mais perigosa guerra (Irão). Ou seja, as candentes questões da guerra e do desarmamento deixaram de ser muito preocupantes e não são “emergências” para tais senhores?  A propósito, será que “eles” já pensaram que, de repente, uma guerra ainda que “regional” pode causar o tal “inverno nuclear” e, “só” por aí, provocar uma “alteração climática” global, fatal e de facto definitiva?!…

É pois legítimo questionar se estamos perante uma genuína “preocupação ambiental” ou se somos confrontados com “alarmismo social” ou se há uma tentativa de diversificar e actualizar (ainda mais) os lucros multinacionais do sistema dominante, o tal “neoliberalismo imperialista” e seus tentáculos, servidos pelos seus “executivos” e maiores “propagandistas”?

Ou seja, estamos em crer que “nos bombardeiam” com doses maciças de “CO 2 ideológico” para nos formatarem o cérebro e manipularem as reacções.  Estes temas, e os excessos “colaterais” que geram, também produzem “modas” (alienatórias) nas avaliações por parte da opinião pública. E, assim, enviesam premissas, contaminam os debates, inibem conclusões  e iniciativas que destoem “da moda”.

É pois fundamental que nós, afinal daqueles que somos vítimas deste sistema dominante, nós não pensemos e actuemos como esse mesmo sistema dominante quer que pensemos e que actuemos…

“RNC 2050” é “mais papista que o Papa”!

Cá entre nós, e como exemplo exemplar, temos os conteúdos e objectivos do chamado “Roteiro para a Neutralidade Carbónica, RNC 2050” que este Governo quer impor por decreto. Gaba-se até de querer ir a mata-cavalos rumo à “neutralidade (económica) carbónica” em menos de 30 anos – o que mais não é do que assumir o papel do “betinho bom aluno” nesta União Europeia.  Na matéria em causa,  o Governo Português vai mesmo mais longe do que consagra o Acordo de Paris para o Clima e que a própria União Europeia, em geral, quer aplicar. 

No caminho esboçado neste “RNC 2050”, abundam várias tonterias tecnoburocráticas com destaque para as assumidas (agora com algum pudor…) pelos “mata vacas” oficiais e oficiosos nas suas projecções descabidas para a grande redução dos efectivos de Bovinos.

Porém, porquê e para quê tanta “invenção encomendada”, se Portugal não precisa nem merece – a Pecuária que o diga – de tamanho “aperto” nos tais “GEE, Gases do Efeito Estufa”? Acontece, e não é por acaso, que Portugal já reduziu as emissões bastante e emite GEE abaixo do “tecto” convencionado.  Então, repete-se, porquê tanto “aperto” ? 

Especulação oficial com as vendas das “Licenças de Emissão” nos “leilões” do Carbono.

Enfim, parece que este Governo quer deixar, “de herança”, receitas para o Orçamento do Estado superiores àquelas que até este ano lá entraram em resultado da venda nos “mercados do Carbono” – mesmo em Bolsa e leilões específicos – dos chamados “créditos do Carbono”, através das chamadas “transacções de licenças de emissão”, estas no âmbito do “CELE, Comércio Europeu de Licenças de Emissão” em particular ?!… 

É que, em Orçamento do Estado para este ano de 2019, prevê-se que o “Fundo Ambiental” atinja mais de 421 milhões de Euros em “receitas e despesas” e em que quase 239 milhões de euros em receitas – quase 57% do total – são directamente provenientes dos leilões CELE das “licenças de emissão de Carbono”.  Ora, em última análise, essas “receitas” contêm “lucros” especulativos para o Orçamento do Estado, provenientes da venda – autorizada pela União Europeia –  nos “leilões “CELE de Carbono”, de muitos milhares de toneladas de Carbono (e GEE). E, em Orçamento do Estado para 2019, também constam receitas na ordem dos 115 milhões de euros através das “Taxas do Carbono” sobre combustíveis fósseis.

Ora, e apesar das numerosas especificações que constam nos documentos oficiais, este “Fundo Ambiental”, na prática, está transformado em mais um discricionário “saco azul” para várias manobras orçamentais e políticas que o Governo opera…

Entretanto, empresas e países super-produtores de GEE compram esses “créditos do Carbono” e podem continuar a emitir os seus excessos para a atmosfera…  É a mercantilização especulativa do Carbono CO 2 (dos GEE) e do ambiente em geral, “coisa” que só pode dar maus resultados… Sim, é necessário manter a cabeça de fora das emissões de “CO 2 ideológico” com que o sistema dominante nos “bombardeia”!…

João Dinis

Membro da Direção da CNA, Confederação Nacional da Agricultura


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