O Douro, a mais antiga região demarcada e regulamentada do mundo, alia a tradição à inovação para a produção de vinhos de qualidade e para se tornar num território cada vez mais sustentável e resiliente às alterações climáticas.
O Douro é, para Cristina Carlos, diretora técnica da Associação para o Desenvolvimento da Viticultura Duriense (ADVID), “tradição, inovação e futuro”.
A região foi regulamentada em 1756, classificada como Património Mundial da UNESCO em 2001, possui a “maior área de vinha de encosta a nível mundial” e é uma das maiores produtoras de vinho do país.
Cristina Carlos destacou à agência Lusa o trabalho que está a ser feito para preservar o património duriense, considerando que assim se consegue “vender melhor” os seus produtos e “fazer face a um futuro cada vez mais resiliente”.
O negócio dos vinhos é a base da economia na Região Demarcada do Douro e, em 2018, representou cerca de 555 milhões de euros.
Segundo dados do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP), entre janeiro e outubro de 2019, a região vendeu cerca de 10 milhões de caixas de nove litros de vinho das várias categorias, com destaque para o vinho do Porto e Denominação de Origem Protegida (DOP) Douro, que se traduziram num volume de negócio de 450 milhões de euros.
No mesmo período foram comercializados 6,5 milhões de caixas de nove litros de vinho do Porto, que representaram um volume de negócios de 300 milhões de euros. Os principais mercados para o vinho do Porto são a França, Portugal e Reino Unido.
Os viticultores estão, na opinião de Cristina Carlos, empenhados em proteger o legado ancestral e preservar a paisagem, ao mesmo tempo que olham para o futuro onde o cenário de alterações climáticas é uma das principais preocupações.
O objetivo é conjugar a atividade produtiva do Douro, a viticultura, com a preservação do património natural e, assim, obter um vinho mais sustentável de todos os pontos de vista, desde o ambiental ao económico.
No terreno sucedem-se projetos. A responsável elencou a recuperação e construção de muros de pedra posta, uma técnica ancestral nesta região que ajuda “na preservação da paisagem e no controlo da erosão, diminuindo a perda do solo”.
A ADVID está, neste momento, a trabalhar num guia para a construção destes muros, que serpenteiam o Douro e são um elemento importante na classificação pela UNESCO.
“O setor já se apercebeu que é preservando o que existe, quer do ponto de vista paisagístico, faunístico, florístico ou das castas, que dá resiliência à vinha, para, num cenário de alterações climáticas também fazer face aos eventos extremos, aos episódios de stress e de escaldão, que se irão certamente agravar”, salientou.
E, na sua opinião, a vinha instalada em muros é mais sustentável do que em outros sistemas em que a erosão é mais intensa (patamares e vinha ao alto)”.
A ADVID tem vindo a dinamizar outras práticas de conservação da biodiversidade como o enrelvamento da entrelinha das vinhas, a instalação ou preservação de sebes com espécies autóctones e a técnica da confusão sexual. O objetivo é a limitação natural de pragas, a redução do uso de pesticidas e dos custos de produção.
A confusão sexual é, segundo Cristina Carlos, uma “técnica inovadora” de controlo da traça-da-uva que é considerada “completamente amiga do ambiente” e “que não deixa resíduos nas uvas”.
Este modelo de combate à pior praga que afeta as vinhas do Douro implica a colocação de difusores (pequenos filamentos) nas cepas que lançam a “confusão sexual” e iludem o macho, pois estão impregnados com feromona (hormona sexual das fêmeas da traça-da-uva) e vão criar uma nuvem de hormona artificial que atrai e baralha os machos, impedindo o acasalamento.
Outro projeto desenvolvido numa cooperação internacional é o Wetwine, que procura fornecer soluções para os problemas de tratamento dos resíduos do setor vitivinícola, com base no desenvolvimento de um ensaio piloto sustentado na codigestão anaeróbia de efluentes de estações de tratamento de águas residuais (FITOETAR).
O objetivo é promover o uso racional dos recursos do território (água e solo), reduzindo os resíduos gerados no processo de vinificação e a contaminação dos solos e águas, através da otimização do sistema de tratamento e também da elaboração de fertilizante e estabelecimento de ensaios agronómicos com fertilizante produzido a partir das lamas.
A ADVID é também parceira do projeto Vinovert que está a estudar a produção sustentável e soluções para responder à crise ambiental da fileira, nomeadamente com o recurso à utilização de variedades de castas resistentes às doenças, a adoção de práticas ambientais para reduzir os pesticidas e diminuir a aplicação de ‘inputs’ no processo de vinificação (sulfitos ou alérgenos).
No âmbito do projeto estão a ser também estudados mercados experimentais, para analisar a procura destes vinhos mais amigos do ambiente, identificando o preço que os consumidores estão dispostos a pagar por esse tipo de produtos (vinho biológico e vinho natural).
O objetivo é garantir, a longo prazo, a competitividade das empresas antecipando as exigências ambientais e sanitárias dos mercados e dos circuitos de comercialização, oferecendo garantias de “naturalidade e de responsabilidade ambiental”.
Cristina Carlos referiu que, no Norte do país, é onde existe “o maior número de castas autóctones por quilómetro quadrado”, uma diversidade genética que distingue os vinhos do Douro “a nível mundial”.
A ADVID é uma associação privada, sem fins lucrativos, criada pelas principais empresas de vinho do Porto com o objetivo de contribuir para a modernização da viticultura do Douro e melhoria da qualidade dos vinhos. A organização possui cerca de 200 associados.
O artigo foi publicado originalmente em Notícias ao Minuto.