Suécia e Holanda pedem cortes maiores na política de coesão. O desafio de António Costa é o de não perder o que está em cima da mesa e somar-lhe pelo menos mais dois mil milhões de euros
Por enquanto ninguém cede. Portugal e os restantes “amigos da Coesão” continuam a tentar recuperar os envelopes nacionais, enquanto a Suécia, Holanda, Dinamarca e Países Baixos insistem em puxar para baixo o orçamento global da União Europeia. O choque entre interesses contrários manteve-se no arranque de mais uma cimeira extraordinária.
A proposta em cima da mesa é a do presidente do Conselho Europeu. Charles Michel cortou na ambição da proposta inicial da Comissão Europeia que, em si, já era menos ambiciosa do António Costa e a maioria dos líderes desejaria.
O corte na política de coesão para Portugal ronda agora os 9 a 10%, ao que o Expresso apurou. É mais do que a redução de 7% proposta pelo executivo comunitário. Noutras contas, significa que o primeiro-ministro português tem de conseguir negociar mais de dois mil milhões de euros, para além do que está em cima da mesa, se quiser manter o envelope de 22 mil e oitocentos milhões de euros que o país recebe no quadro financeiro de 2014-2020.
Uma negociação difícil, principalmente quando os fundos estruturais são um dos alvos dos chamados quatro frugais. “Podemos reduzir tanto na coesão, como na agricultura”, disse, sem rodeios, o primeiro-ministro da Suécia, à entrada para a reunião, em Bruxelas.
Stefan Löfven continua a insistir em reduzir a proposta global de Charles Michel de 1,074% da riqueza europeia para os 1% do Rendimento Nacional Bruto. Com ele estão o holandês Mark Rutte, o austríaco Sebastian Kurtz e a dinamarquesa Mette Frederiksen.
Novas prioridades
Os quatro estão alinhados no discurso. Dizem que não se importam de ser contribuintes líquidos e pagar mais para o orçamento, comparado com o que lá vão buscar. No entanto, consideram que já pagam demasiado e que há prioridades onde preferem ver o dinheiro investido.
“Falta mais modernização a esta proposta”, diz Rutte, criticando o facto de um terço do orçamento ser “ainda para a coesão” e outro terço “para a agricultura”. Modernização que, aos olhos dos nórdicos, significa também uma maior canalização de verbas para controlo de fronteiras, investigação e desenvolvimento ou ambiente.
Portugal não está contra o investimento nestas áreas, o que não quer é que o financiamento das novas prioridades sacrifique as antigas. E, no braço-de-ferro, Costa tem ainda de defender a agricultura. A proposta em cima da mesa é melhor do que a da Comissão, mas continua a cortar nos pagamentos diretos aos agricultores e também no desenvolvimento rural. “A minha paciência é infinita”, responde Costa, face à insistência dos frugais, a quem já chamou “forretas”.
No entanto, um acordo é preciso, ou a entrada em vigor do quadro financeiro para 2021 a 2027 corre o risco de derrapar, como derrapou o anterior. Sem acordo até ao final de 2020, não há enquadramento legal, nem dinheiro para gastar com novos programas e nem com novos compromissos na política de coesão.
O que os países podem fazer – Portugal incluído – é executar o dinheiro dos fundos estruturais e de coesão autorizados até ao final do atual quadro. Têm três anos para fazê-lo. E é aqui que Costa acredita ter alguma margem. Mas, mesmo que o caos nesta área não seja eminente, existe: “será um problema sério em 2023 e 2024, é isso que temos de evitar”, admite.
Bolachinhas para contentar os líderes
É a pressão do tempo face à pressão de um mau acordo. Para acalmar os líderes, Charles Michel pôs de lado onze mil milhões de euros, a que alguns chamam de “gifts” (presentes) ou “cookies” (bolachas). Uma soma posta à margem, que ainda não está atribuída e que pode servir para os líderes negociarem entre si e reduzirem as perdas globais. Cerca de seis mil milhões deverão ser para a coesão.
Outra “cenoura” para os contribuintes líquidos mais teimosos passa por manter ou mesmo melhorar o descontos (rebates) que têm atualmente na contribuição nacional. É algo que é reivindicado pelos quatro frugais e pela Alemanha.
“Ainda não estamos totalmente satisfeitos”, afirmou Angela Merkel esta quinta-feira. A chanceler alemã até admite que o seu país tenha “de pagar mais do que outros estados-membros” para ajudar à convergência europeia, mas pede “um equilíbrio” no que tem de pagar face a outros contribuintes líquidos, como França, Itália ou Espanha.
E para satisfazer Alemanha, Dinamarca, Suécia, Áustria e Países Baixos, o presidente do Conselho Europeu previu também um “montante fixo”, que terá ainda de ser negociado. Esse montante será descontado das contribuições dos cinco países e pago pelos restantes estados-membros.
Um quebra-cabeças que está ainda longe do fim. É certo que os defensores da coesão e da agricultura – e neste ponto França e o presidente Emmanuel Macron também tem fortes interesse – estão em maioria, mas esta negociação só se resolve por unanimidade.
Em Bruxelas, ainda ninguém sabe se a cimeira acaba já esta sexta ou se prolonga até domingo. E as dúvidas são muitas de que haja já um acordo.