Até agora, do setor agrícola entraram 68 candidaturas num total de 31 milhões de euros à linha de crédito Covid-19. Das 150 mil pequenas explorações nenhuma concorreu.
Restaurantes e cafés fechados. Mercados a menos de meio gás. Exportação “quase a zeros”. Apoios do Estado “só a crédito e talhados para os grandes”. Produto a acabar no lixo. É esta a realidade para muitos pequenos agricultores. São mais de 150 mil explorações, que empregam 600 mil pessoas, em muitos casos marido, mulher e filhos. Reclamam “ajudas diretas urgentes”. De outra forma, diz a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), muitos, em setores como as flores, as hortícolas ou os produtos com Denominação de Origem Protegida (DOP) – queijos e enchidos -, não vão sobreviver e, sem eles, “morre grande parte do mundo rural”.
“Na agricultura familiar, os principais clientes perderam-se: primeiro, a restauração e, depois, os mercados e feiras”, explicou, ao JN, Pedro Santos, da CNA. Nalguns setores, continua a contar, há agora “excesso de oferta” – o caso das hortícolas ou da carne -, noutros – como as flores ou os produtos DOP -, simplesmente não há clientes e o produto acaba no lixo.
Do lado do Governo, diz, por enquanto, “só linhas de crédito” a que os “pequenos, obviamente, não vão concorrer, ou porque não têm escala, ou porque não se podem endividar mais”. A prová-lo estão as 68 candidaturas apresentadas até agora entre mais de 250 mil explorações.
“Está-se muito à espera da União Europeia. O Governo não pode continuar com a ideia de não gastar um tostão do Orçamento do Estado”, acrescenta, defendendo “o apoio direto às explorações com mais dificuldades”.
BANCO ALIMENTAR
Ao JN, a ministra da Agricultura, Maria do Céu Albuquerque, diz que já se começaram a dar passos. Explica que foi alterada a portaria para permitir retirar do mercado pequenos frutos sem casca – framboesa, amora, mirtilo e morango. Mais perecíveis e habitualmente destinados, em grande parte a exportação, os frutos vermelhos podem, agora, ser entregues, por exemplo, ao Banco Alimentar. O produtor recebe 40% do valor médio de mercado dos últimos cinco anos.
A CNA e a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) defendem que a medida possa ser aplicada noutros setores e “possível para agricultores em nome individual e não só para organizações de produtores”.
A ministra admite essa hipótese, mas espera luz verde de Bruxelas para “acudir” aos setores mais afetados: hortícolas, leite e queijo, carnes autóctones, vinho, flores e plantas aromáticas.
MERCADOS FECHADOS
Como forma de ajudar os pequenos produtores, a ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa, já disse que os mercados podem – e devem – manter-se abertos e que as autoridades estão ainda “a permitir a venda ambulante”. A ministra da Agricultura enviou mesmo uma carta a todos os autarcas a pedir que voltem a abrir os mercados que, nalguns casos, foram fechados e, noutros, estão com reduções de horários. Para Pedro Santos esta é uma “boa notícia”. O dirigente da CNA espera que, em maio, todos os mercados possam reabrir normalmente e ajudar os pequenos agricultores.
Medidas
Ajudas da PAC antecipadas
Maria do Céu Albuquerque diz que adiantou todos os pagamentos de fundos comunitários aos agricultores que deram entrada até 3 de abril. Até 10 de abril tinham já sido pagos 40 milhões de euros. Prevista está ainda a antecipação para julho do pagamento de 85% das ajudas diretas da Política Agrícola Comum (PAC). “É dinheiro que já era dos agricultores”, diz a CNA.
Apoio à armazenagem no leite e na carne
A Comissão Europeia aprovou, na quarta-feira, o apoio à armazenagem nos setores do leite e da carne. É, diz a ministra, uma garantia de que o produto pode ser retirado do mercado e recolocado quando os preços já estiverem mais equilibrados.
Linha de crédito Covid-19
Até ao final da segunda semana de abril, tinham dado entrada 68 candidaturas à linha de crédito Covid-19. Todas juntas somam 31 milhões de euros. Em média 456 mil euros por candidatura. Pedro Santos, da CNA, diz que esta “é a prova de que só os grandes estão a concorrer”
48 euros/dia para deslocações
O Ministério reconhece que carne de raças autóctones, queijos, enchidos, frutas sem casca e legumes estão entre os setores mais afetados. Assim, no âmbito das medidas excecionais, foi alterada a portaria que regulamenta as cadeias curtas e criado um apoio de 48 euros diários para deslocações de agricultores aos mercados locais ou pontos de entrega.
Plataforma “alimente quem o alimenta”
A plataforma “alimente quem o alimenta” foi lançada há pouco mais de uma semana. Já tem 700 produtores inscritos e já registou cerca de 50 mil interações com possíveis consumidores. A ideia é agilizar o escoamento de produtos locais, frescos e de qualidade. É uma parceira do Ministério da Agricultura com a Federação Minha Terra, os grupos de ação local e as autarquias. O agricultor regista-se e anuncia os seus produtos e cabazes. O consumidor pode pesquisar por produto e por concelho e fazer a sua encomenda.