Portugal é o maior produtor de alfarroba do mundo e mais de metade da sua produção é exportada. Ao seu valor socioeconómico, junta-se o valor histórico desta cultura centenária, particularmente marcante no Algarve.
A produção mundial de alfarroba era, na década de 60, superior a 600 mil toneladas, e decresceu para cerca de 159 mil toneladas em 1991. Desde essa data, a produção tem variado entre 100 e 170 mil toneladas por ano e Espanha perdeu a liderança da produção para Portugal.
Ano após ano, Portugal tem sido o maior produtor de alfarroba do mundo, com uma produção anual superior a 40 mil toneladas em 2016 e 2017, de acordo com as estatísticas da FAO – FAOSTAT. Este número reforça o valor da alfarroba em Portugal e coloca o nosso país numa posição destacada no top dos produtores mundiais, que incluem também Itália e Marrocos, com cerca de 29 e 22 mil toneladas produzidas, respetivamente, nos mesmos anos
A produção de alfarroba tem uma longa tradição nos países mediterrânicos, especialmente para alimentação animal. Pensa-se que terão sido os gregos e árabes os responsáveis pela sua disseminação na bacia mediterrânica a partir do Médio Oriente.
Grande parte da alfarroba portuguesa destina-se ao exterior, com mais de 23 milhões de euros e de 27 mil toneladas exportados em 2018, segundo o INE – Instituto Nacional de Estatística.
A mesma fonte indica que, na campanha 2017-2018, 4948 pés de alfarrobeira foram vendidos por viveiristas portugueses, mais de metade (2879) no Algarve.
É esta a região que concentra a maioria das alfarrobeiras em Portugal, quer as de regeneração espontânea, quer as de pomar industrial, e é também no Algarve que o valor da alfarroba é mais revelante, por estarem aí localizadas as unidades de transformação existentes no país.
O valor da alfarroba na região sul de Portugal não é recente. Referências de 1579 referem que o fruto já era comercializado em feiras algarvias e, em 1777, a alfarroba estava em quinto lugar na lista dos produtos que o Algarve mais exportava por via marítima, segundo a DGADR – Direção Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural.
Mais antiga do que estas referências histórias é a alfarrobeira da Quinta da Parra, em Moncarapacho: tem pelo menos 600 anos.
Balança comercial portuguesa de alfarroba, 2017 e 2018
Aplicações numa dezena de indústrias, da farmacêutica à alimentar
No entanto, só há cerca de meio século, quando a ciência começou a desvendar os “segredos” da sua composição, é que o valor da alfarroba começou a ser realmente reconhecido, em particular nas indústrias farmacêutica, nutracêutica e alimentar, nas quais é hoje amplamente aplicada.
Parte significativa destas aplicações estão relacionadas com a goma extraída da semente da alfarroba: um aditivo de origem biológica ao qual não se conhecem efeitos adversos, o E-410, usado como espessante, estabilizante, emulsionante ou gelificante em medicamentos e alimentos, inclusive em fórmulas para lactantes, mas também na impressão de têxteis e papel ou na cosmética, por exemplo.
Já a polpa da alfarroba, triturada e torrada, dá origem à farinha de alfarroba (ou alfarroba em pó), hoje reconhecida como um substituto do cacau. A fartinha de alfarroba é utilizada na confeção de dezenas de produtos alimentares, incluindo pão, doçaria ou gelados.
Os triturados são também usados na produção de bebidas, desde licores a aguardantes e até cerveja artesanal. São também matéria-prima de alimentos para animais, uma das suas aplicações mais antigas, embora hoje seja usada em novas soluções alimentares para animais de companhia.
Por sua vez, os açúcares extraídos da polpa permitem ainda a produção de álcool para bioetanol.
Em 2019 foi aprovado um projeto europeu que apoio o lançamento no mercado de uma bebida de alfarroba 100% portuguesa, que pode bebida individualmente ou adicionada a cereais e batidos e que cria a espuma ideal para cappuccinos.
Na pesquisa de sistemas mais eficientes de administração de medicamentos para tratar a tuberculose, a goma de alfarroba parece promissora para criar micropartículas de polissacáridos capazes de transportar as substâncias ativas exatamente até à zona onde as bactérias se alojam, o que poderá permitir a redução da dose e do tempo de tratamento.
O valor da alfarroba: cultura, tradição e turismo
Além de ser amplamente estudada do ponto de vista científico, o que apoia o valor da alfarroba – semente, polpa e folhas – para a saúde humana, e abre novas oportunidade para a criação de valor socioeconómico, importa ainda lembrar o valor desta planta como símbolo da história e da cultura algarvias.
Este é um valor imaterial relevante e reconhecido pela UNESCO, quando em 2013 inscreveu a “Dieta Mediterrânica” na Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade. Lembre-se que esta candidatura foi feita conjuntamente por Chipre, Croácia, Espanha, Grécia, Itália, Marrocos e Portugal, países onde a cultura da alfarrobeira é secular. Entre as tradições destacadas esteve a apanha da alfarroba.
Este valor imaterial pode também contribuir para um novo valor económico, por exemplo, através da promoção de novos polos de atração turística, como sugerido num trabalho académico (tese apresentada na Universidade do Algarve), que propõe a criação dos Roteiros da Alfarroba e define uma rede de percursos capazes de desvendar aos turistas os preceitos da cultura da alfarrobeira e da transformação da alfarroba e de os levar a experimentar alguns dos seus produtos.