Produção da vindima definida quinta-feira, no IVDP, mas deverá situar-se em torno das 90 mil pipas. Com a reserva fica ainda 8 mil abaixo de 2019.
Há fumo branco no Douro para a produção de 10 mil pipas de vinho do Porto na próxima vindima, em regime de reserva qualitativa – que ficará bloqueado durante três anos e será depois colocado no mercado, gradualmente, nos sete anos seguintes. E foi isso mesmo que produção e comércio foram ontem dizer à ministra da Agricultura, agradecendo o reforço de três para cinco milhões das verbas que serão “descativadas” aos saldos de gerência do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto (IVDP) para financiar esta medida de armazenamento específica para a Região Demarcada do Douro.
Mesmo assim, o benefício da próxima vindima (a autorização de produção de vinho do Porto) deverá ficar-se pelas 90 mil pipas (mais as 10 mil de reserva qualitativa), o que significa que a região perderá 8 mil pipas face a 2019. Ou seja, serão menos oito milhões de euros a chegar ao bolso dos viticultores. O valor exato da produção será conhecido amanhã, dia 23 de julho, no final da reunião do Conselho Interprofissional do IVDP que votará o quantitativo de benefício. O comércio propõe 87 a 90 mil pipas, a produção contrapõe com 90 a 92 mil pipas.
“O quadro [provocado pela pandemia da covid-19] é sempre difícil, estamos a trabalhar para o amenizar. Partíamos com expectativas muito derrotistas para a próxima campanha, mas com estas 10 mil pipas já conseguimos que a quebra não fosse tão abrupta”, diz António Lencastre, presidente da Federação Renovação do Douro – Casa do Douro, que representa os viticultores.
António Saraiva, presidente da Associação das Empresas de Vinho do Porto (AEVP), destaca que o comércio sempre se comprometeu a “minimizar os efeitos” da crise mas não a manter a produção de 2019, sublinhando que as vendas totais de vinho do Porto, no mercado interno e internacional, caíram 11,9% em volume e 13,9% em valor no primeiro semestre.
À saída da reunião com Maria do Céu Albuquerque, António Saraiva agradeceu à ministra “todo o trabalho feito” para satisfazer as necessidades do setor e as especificidades do Douro, com a atribuição dos cinco milhões para a reserva qualitativa, mas também a majoração dos montantes relativos à destilação de crise especificamente para a região. Sublinhou, no entanto, que há que não esquecer os apoios à promoção. “As duas questões mais urgentes estão resolvidas, que era o mais importante com a vindima à porta, mas não baixamos os braços. Pedimos à senhora ministra que os dois milhões de euros que o IVDP tem destinados à promoção pudessem transitar para o próximo ano, caso não possam ser totalmente usados neste ano”, explicou.
No mesmo sentido, António Lencastre destaca o “sentimento de batalha ganha”. É a primeira vez que os representantes da produção duriense são recebidos pelo atual governo, e Lencastre diz-se “bem impressionado”, salientando que “as principais expectativas estão cumpridas”. Faltam, agora “questões de pormenor”, designadamente a redação final da portaria que irá estabelecer a criação da reserva qualitativa no Douro. Para a produção é vital que os apoios sejam pagos diretamente ao viticultor, de forma “transparente”, propondo por isso que no cartão de benefício deste ano conste a parcela de produção normal e a parcela da reserva, para que estes “tenham consciência de uma e de outra”.
Mas não é só o Douro a beneficiar do reforço das verbas de apoio ao setor do vinho. O Ministério deu a conhecer, no sábado, que iria reforçar os apoios à destilação de crise e à armazenagem de vinhos em todo o país, passando de 15 para 18 milhões de euros, e o setor aplaude. Francisco Mateus, presidente da Comissão Vitivinícola Regional Alentejana (CVRA), garante que a medida “traz tranquilidade” ao vinho; Manuel Pinheiro, líder da Comissão de Viticultura da Região dos Vinhos Verdes (CVRVV), fala em notícias positivas, mas considera que precisam de ser “colmatadas” com um “apoio à tesouraria” das adegas e dos vinificadores para que estes “paguem as uvas aos viticultores em setembro”. A medida “pode ser financiada com os resultados transitados do Instituto da Vinha e do Vinho, tal como se fez, e bem, com o IVDP”, diz Manuel Pinheiro, que não quantifica o montante necessário.
Recorde-se que o governo anunciou, a 20 de junho, a aprovação de “medidas excecionais de apoio ao setor dos vinhos”, no valor de 15 milhões de euros, sendo 10 milhões para suportar a destilação de crise e cinco milhões para apoio ao armazenamento. Logo na altura não se fizeram esperar as duras críticas dos produtores e comerciantes de vinho, salientando que os montantes a que a destilação de crise estava prevista – 40 cêntimos por litro para os vinhos com Denominação de Origem Controlada (DOC) e 35 cêntimos para os de Indicação Geográfica (IG), o chamado vinho regional – não cobriam os custos de produção.
Os dados das candidaturas apresentadas até ao momento – o prazo terminou a 15 de julho – vieram comprová-lo. As 315 candidaturas apresentadas representavam uma ajuda estimada da ordem dos 2,8 milhões de euros, ou seja, da ordem dos 18% do montante total disponível. Os dados resultam do levantamento feito pela ANDOVI – Associação Nacional de Denominações de Origem junto dos seus associados e mostram que “claramente não houve adesão dos produtores” às medidas excecionais. As candidaturas à destilação, por exemplo, correspondem a pouco mais de 1 milhão de euros, ou seja, 10% do valor disponível.
“Estes números vieram confirmar que o nível das ajudas proposto era baixo. Mas o Ministério da Agricultura foi capaz de reagir com grande rapidez, reforçando as verbas para valores bastante mais interessantes o que são boas notícias para o setor”, diz Francisco Mateus.
O governo vai, agora, pagar 60 cêntimos por litro de DOC e 45 cêntimos no IG para destilação e duplica o valor unitário a pagar pela armazenagem de vinho, que passa de oito cêntimos por hectolitro/dia para 16 cêntimos, com o montante máximo por beneficiário a passar dos 7500 euros para 15 mil euros. Montantes que se aplicarão já às mais de 300 candidaturas entregues. Significa isto que, só nas candidaturas já apresentadas para os apoios à armazenagem, estão mais de 3,4 milhões de euros (dos seis milhões disponíveis).
Francisco Mateus fala num “bom conjunto de medidas” que vai “ajudar a preservar o preço” na próxima vindima e a “manter ativas as empresas e o emprego”. Permitem, defende, um final de campanha “com nota positiva”, trazendo “alguma tranquilidade” a um mercado que atravessa grandes desafios, já que os números das exportações até maio “não foram bons” e os dados internos disponíveis para junho parecem indicar que a quebra irá acentuar-se.
Recorde-se que as exportações portuguesas de vinho caíram 18% no mês de maio, passando de 68,9 milhões para 56,4 milhões de euros, contra os 4% de decréscimo homólogo no mês de abril. E no acumulado dos primeiros cinco meses, o setor está já em terreno negativo, ao contrário do mês de abril: a quebra é de 4%, correspondente a 299,4 milhões de euros. São menos quase 13 milhões de euros, comparativamente a 2019.