Secagem em estufa manteve o teor de antocianinas. Substância é antioxidante e responsável pelos tons azul, roxo e vermelho de frutas, raízes e folhas. Processo de liofilização não obteve o mesmo resultado. Espécie tem ampla adaptação em todo o território nacional. Sua farinha pode ser usada na indústria em substituição à de trigo.
Uma pesquisa da Embrapa Hortaliças (DF) analisou dois métodos de desidratação de raízes de batata-doce de polpa roxa para determinar qual seria mais eficaz em manter os parâmetros de qualidade no processo de produção de farinha. Na comparação, as polpas submetidas à secagem na estufa obtiveram valores de antocianinas mais elevados do que as polpas que passaram pela liofilização, processo de remoção da água da hortaliça congelada por sublimação, com a passagem da água do estado sólido para o gasoso em temperaturas baixas e a vácuo.
“É sabido que qualquer tipo de processamento térmico afeta a concentração dos compostos antioxidantes, como as antocianinas, por isso, as análises laboratoriais serviram para determinar em qual método de secagem a redução nos teores de substâncias bioativas é menos expressiva”, comenta a pesquisadora Lucimeire Pilon. As antocianinas e demais compostos fenólicos presentes na batata-doce de polpa roxa são substâncias bioativas associadas à redução do risco de doenças degenerativas, uma vez que possuem ação antioxidante no organismo.
Assim como o betacaroteno é um pigmento natural associado às cores laranja e amarela, as antocianinas são pigmentos responsáveis pelos tons de azul, roxo e vermelho nos alimentos como frutas, raízes e folhas. “A produção de batata-doce de polpa roxa vem ganhando espaço, o que é uma vantagem para os agricultores – visto que essa cultura apresenta ampla adaptação em todo o território brasileiro e um elevado rendimento de raízes por área, bem como para os consumidores, pois a batata-doce roxa tem um preço mais acessível do que outras fontes importantes de antocianina como uva, amora, açaí e mirtilo”, compara o pesquisador Raphael Melo, da área de Fitotecnia.
No Laboratório de Ciência e Tecnologia de Alimentos (LCTA), a equipe avaliou a qualidade físico-química e os teores de antocianinas totais de farinhas obtidas a partir de seis clones diferentes de batata-doce de polpa roxa, que fazem parte dos genótipos avaliados no programa de melhoramento genético dessa hortaliça. A análise comparativa também considerou os parâmetros de qualidade das batatas-doces in natura, ou seja, na forma fresca, antes de passar por qualquer tipo de processamento.
O desenvolvimento de produtos a partir do processamento de batata-doce é uma forma de agregar valor à produção ao fornecer alternativas para sua comercialização. “A farinha de batata-doce pode ter inúmeros usos pela indústria de alimentos, como substituta da farinha de trigo no preparo de pães, biscoitos e bolos, e até como corante alimentício natural”, pontua Lucimeire. Além disso, ela acrescenta que a farinha de batata-doce pode também substituir a maltodextrina, comumente derivada do amido de milho, no preparo de shakes e outros suplementos para atletas e praticantes de atividade física.
Qualidade pós-colheita de novas cultivares
No laboratório, depois de colhidas, as raízes dos seis genótipos de batata-doce roxa foram lavadas, descascadas e fatiadas com espessura de 2 mm. Uma vez realizado esse procedimento, os pesquisadores testaram os dois diferentes métodos de desidratação. A principal diferença entre eles, em linhas gerais, é que na liofilização, a desidratação acontece em condições de temperatura e pressão muito baixas, e na estufa, a remoção da água presente no alimento é devida ao aquecimento.
Na secagem por estufa (foto à esquerda), as fatias foram submetidas a uma faixa de temperatura entre 60 e 65º C. Na liofilização, elas foram previamente congeladas a -18º C em freezer e, no liofilizador, havia um aumento de 5º C, a cada duas horas, até a temperatura atingir 35º C. Terminado o processo de secagem, cada amostra foi triturada em moinho para obtenção da farinha e armazenada em embalagens laminadas, na ausência de luz e umidade.
As condições ambientais da lavoura, tais como umidade relativa e temperatura, influenciam na quantidade de antocianinas presentes em batatas-doces de polpa roxa, apesar de ser uma característica determinada pelo potencial genético de cada clone avaliado. Assim acontece também após a colheita, na etapa do processamento térmico e, seja na via do congelamento ou do aquecimento, há degradação de antocianina por fatores como luz e temperatura.
Em ambos os métodos, houve perda de antocianinas em todas as amostras analisadas, mas os pesquisadores puderam identificar que, na liofilização, que é um método bastante eficaz na conservação das propriedades nutritivas dos alimentos, as perdas desses pigmentos (antocianinas) foram mais acentuadas, sendo a secagem por estufa mais indicada para preservar os teores de antocianinas no processo de produção de farinha de batata-doce de polpa roxa. Além disso, a estufa é um equipamento de secagem com melhor custo do que um liofilizador e, sendo um método mais barato, torna a produção de farinhas mais acessível aos pequenos produtores.Considerando os dois genótipos mais promissores após o processamento, os teores de antocianinas totais foram de 199,98 e 193,78 miligramas por grama de farinha, na secagem em estufa, contra 75,77 e 75,96 mg/g, na secagem por liofilização. “Mais do que confirmar o melhor método para a desidratação, nós também identificamos os genótipos de batata-doce roxa que mantiveram teores mais elevados de antocianina mesmo após o processamento. Isso é importante para que possamos avançar na seleção de clones com melhores valores de compostos bioativos que, no futuro, serão lançados no mercado como novas cultivares”, sintetiza Lucimeire.
Nesse sentido, a pesquisadora Larissa Vendrame, responsável pela seleção de genótipos que vão originar novas cultivares, comenta que as análises de pós-colheita estão entre os principais alicerces do projeto. “É preciso, sim, obter cultivares mais produtivas e precoces, mas é igualmente fundamental que elas tenham excelência em qualidade de raiz para atender tanto o mercado in natura quanto a indústria processadora”, pondera a agrônoma, que também lidera o programa de melhoramento genético de batata-doce da Embrapa Hortaliças. Ela ressalta que os aspectos relacionados à qualidade pós-colheita da batata-doce são determinantes para a adoção bem-sucedida de uma nova cultivar pelos setores produtivo e industrial.
Além dos valores de antocianinas, as análises de pós-colheita de batata-doce de polpa roxa também consideraram a intensidade da coloração das farinhas (foto à direita) obtidas a partir do processamento; os teores de sólidos solúveis, que estão correlacionados à doçura do produto; e os teores de matéria seca das raízes, que é um aspecto importante para obtenção de maiores rendimentos no processamento industrial e para uma textura mais crocante em caso de produção de chips.
O detalhamento das análises sobre o processo de produção de farinha de batata-doce roxa, sob o ponto de vista de diferentes aspectos de qualidade pós-colheita, foi publicado em boletim de pesquisa sob o título “Avaliação físico-química e compostos bioativos de farinhas de batatas-doces de polpa roxa”. Na próxima etapa da pesquisa, a equipe vai realizar a repetição de experimentos e levantar novos dados associados à qualidade pós-colheita de batata-doce.