O PEPAC é um instrumento fundamental da Política Agrícola Comum, que poderá permitir responder a necessidades e expectativas sociais de grande diversidade e importância, justificando assim um financiamento pelos Fundos Europeus Agrícolas proporcionalmente muitíssimo superior ao peso da agricultura na economia nacional e na da União Europeia.
No caso português o montante dos fundos europeus disponíveis, provenientes do Quadro Financeiro Plurianual e do Instrumento de Recuperação (Next Generation UE), é de 9 782 milhões de euro (5 509 milhões de euros, no I pilar da PAC, e 4 274 milhões de euros, no Pilar II)[1]. A este montante acrescerá o da despesa pública nacional para cofinanciamento de parte das intervenções do II Pilar, o que implicará uma despesa pública total significativamente superior a 10 mil milhões de euros para sete anos, na ordem dos 1 500 milhões de euros anuais. O PEPAC enquadrará a parcela de aplicação desses fundos a executar a partir de 2023 (inclusive).
Destacamos duas grandes finalidades que justificam a PAC e os recursos públicos a ela destinados:
– A primeira é a resposta da agricultura a necessidades vitais da sociedade: a defesa da segurança e da própria vida face a tragédias como as dos incêndios rurais, resultantes do abandono e desordenamento das paisagens agroflorestais e das alterações climáticas em curso; o acesso a uma alimentação saudável e sustentável, suportada numa agricultura resiliente e viável; a provisão de serviços ambientais, igualmente vitais, desde a conservação dos recursos naturais como o solo e a água, à preservação e incremento da biodiversidade, até à mitigação e adaptação às alterações climáticas e a proteção das amenidades que só uma paisagem ordenada pode oferecer.
– A segunda é o contributo para que agricultores, agricultoras, trabalhadores e trabalhadoras beneficiem de melhores rendimentos e condições de vida, equiparáveis aos dos outros grupos sociais, o que depende de mais conhecimento, de mais inovação, de mais investimento e de maior e mais justa retribuição pelos bens e serviços que efetivamente prestam à sociedade.
Para estabelecer as prioridades principais do PEPAC para Portugal[2] é indispensável ponderar as necessidades mais críticas e prementes identificadas através do diagnóstico da situação nacional, baseado na análise das forças/fraquezas e oportunidades/ameaças (análise SWOT) e, também, os objetivos e critérios de opção política considerados prioritários.
A Coligação considera o Diagnóstico realizado pelas Autoridades Portuguesas muito insuficiente e inadequado, não havendo até ao momento indicação de que o Ministério da Agricultura o pretenda melhorar e, também não se conhecendo os resultados e recomendações resultantes da Avaliação Ex-Ante, iniciada há cerca de um ano, sobre este e outros aspetos do PEPAC.
Apesar dessa carência, a Coligação, dada a necessidade de se ultimar o PEPAC nos próximos dois meses e meio e considerando os diagnósticos e análises que elaborámos, apresenta neste documento uma síntese de prioridades que, em nosso entender, devem nortear a definição dos objetivos a prosseguir, dos critérios de escolha das intervenções, de avaliação dos seus méritos e da repartição dos recursos financeiros disponíveis.
As dez prioridades para o PEPAC que propomos são consonantes com o conteúdo programático do documento de apresentação da Coligação (em anexo, a versão de 24 de setembro de 2021). Mas sistematizam-se de forma mais seletiva.
Dez Prioridades para o PEPAC
1- Incluir e tratar com equidade todos os agricultores, produtores florestais e agriculturas
Conferir alta prioridade a medidas que incluam e beneficiem o grande número de produtores agrícolas e florestais portugueses atualmente excluídos dos apoios da PAC e aos incentivos mais adaptados à diversidade do território e das agriculturas, promovendo uma repartição mais equitativa dos fundos agrícolas europeus e nacionais.
2 – Aumentar de modo sustentável o valor acrescentado da agricultura e silvicultura e o rendimento dos agricultores e produtores florestais
Promover o rejuvenescimento, renovação e capacitação técnica dos produtores e uma política correta de incentivos ao investimento e de inovação, incluindo a sua governança, essenciais para aumentar a produtividade, o valor acrescentado e os rendimentos agrícolas e florestais.
Agir no sentido de que produtores agrícolas e florestais não sejam privados da justa quota-parte que lhes deve caber na repartição do valor criado nas fileiras agrícolas e florestais.
Remunerar de forma eficaz e proporcional os serviços de ecossistemas associados às actividades agroflorestais e que os mercados não remunerem (biodiversidade, prevenção da erosão, redução do risco de incêndio, regulação do ciclo da água, sumidouro do carbono, qualidade estética das paisagens, etc.).
Incentivar a diversificação produtiva das explorações e garantir instrumentos apropriados de gestão de riscos, contribuindo assim para o reforço da resiliência da agricultura.
3 – Travar e inverter a degradação do valor ambiental, económico e social do património florestal e dos sistema agro-silvo-pastoris mais vulneráveis
Transformar as paisagens mais vulneráveis aos incêndios e a outros riscos, visando a maior heterogeneidade do mosaico agroflorestal e a melhoria estrutural da sua propriedade e gestão, baseada quer em ações integradas de base territorial protagonizadas por agricultores e produtores florestais, quer em incentivos adequados a produtores ainda não integrados em formas de gestão agrupada.
Implementar intervenções direcionadas especificamente para a recuperação de sistemas agro-silvo-pastoris e florestais mais vulneráveis e de grande valia social, ambiental e económica, como o pinhal bravo em contextos minifundiários e orográficos menos favoráveis, e os montados, em persistente e acentuado declínio nas últimas décadas.
4 – Dar atenção primordial à melhoria da gestão eficiente e parcimoniosa do solo e da água
Colocar a conservação e a promoção da qualidade destes dois recursos naturais no centro do desenvolvimento sustentável, económico e ecológico da agricultura, particularmente em zonas de maior stress hídrico e risco de desertificação ou sob maior pressão de sistemas e práticas mais intensivas e/ou consumidoras destes dois recursos vitais para a agricultura, para o ambiente e para o bem-estar humano.
5 – Preservar e melhorar a biodiversidade associada às atividades agrícolas e florestais
Assegurar uma gestão mais ativa e coerente das paisagens, habitats e sistemas agro-silvo-pastoris de maior valor natural e apoiar os sistemas agrícolas tradicionais que sustentem/recuperem uma elevada biodiversidade, como os pomares e outras culturas permanentes com cultivares de sequeiro.
6 – Melhorar o balanço das emissões de gases com efeito de estufa do complexo agroflorestal e criar paisagens mais resilientes às alterações climáticas
Promover a resiliência das paisagens às alterações climáticas, o maior armazenamento de carbono, em particular no solo e nas áreas florestais, e a redução das emissões resultantes dos incêndios rurais, dos excessos de carga ou más práticas pecuárias e de outros fatores adversos associados às fileiras agroalimentares e florestais.
7 – Reforçar os incentivos ao investimento e outras ações estruturais, subordinando-os a critérios de eficácia, eficiência e equidade na gestão e afetação dos recursos públicos
Rever e alterar em profundidade a arquitetura e o racional dos incentivos aos investimentos em função nomeadamente dos seguintes princípios e critérios:
– proporcionalidade dos incentivos quer face aos riscos económicos e ambientais, quer aos benefícios dos investimentos na ótica social, ambos avaliados com base no melhor conhecimento disponível e atendendo aos contextos territoriais de concretização dos projetos;
– exigência de demonstração de resultados, incluindo os acréscimos no valor ambiental, englobando a geração de benefícios na biodiversidade e na provisão de outros serviços dos ecossistemas;
– contributo dos investimentos para a adaptação às alterações climáticas;
– privilegiar os regimes de incentivo que favoreçam o retorno e a reaplicação dos recursos, evitando a sobrecompensação e excluindo do apoio público os projetos que tenham assegurada uma elevada rentabilidade privada, sem necessidade desse apoio.
8 – Reforçar e alterar o apoio à inovação e à capacitação técnica e tecnológica agrícolas e florestais
Focar o apoio à inovação e à capacitação técnica na resolução de problemas reais dos agricultores e produtores florestais, adequada à sua diversidade, e num acesso mais alargado e equitativo a estes bens públicos, incluindo o desenvolvimento de metodologias específicas para alcançar os produtores excluídos, promovendo o reforço e articulação dos centros de conhecimento agroflorestal públicos e a consultoria de proximidade.
9 – Incentivar as intervenções promotoras da cooperação e ação coletiva dos beneficiários, de base setorial e/ou territorial
Conferir elevada prioridade e incentivar através de programas e subprogramas específicos, as diversas formas de organização setorial e territorial dos agentes do desenvolvimento agrícola e rural.
Promover e gestão partilhada de recursos de instrumentos operacionais e a monitorização de resultados das intervenções.
10 – Reforçar a participação cívica, a nível local, regional e nacional, na definição, execução acompanhamento e avaliação das intervenções enquadradas no PEPAC
Assegurar de forma atempada, transparente e acessível a disponibilização pública de informação relevante e de qualidade.
Empoderar e legitimar o envolvimento da sociedade civil, nomeadamente através do investimento na animação territorial, que facilite a integração da agricultura numa visão global de promoção do “Bem Comum” e do desenvolvimento local sustentável.
Coligação – Participar no PEPAC
Contacto: coligação.pepac@gmail.com
[1] – NOTA DE IMPRENSA do Ministério da Agricultura, de 21 de julho de2020.
[2] – Refere-se mais precisamente a Portugal continental.