Manuel Chaveiro Soares

Desafios para a Agricultura Portuguesa

No início do Verão o meu distinto Colega e Amigo Fernando Mouzinho, ilustre Presidente do Conselho Nacional do Colégio de Engenharia Agronómica, dirigiu-me um honroso convite para participar no presente Congresso da Ordem dos Engenheiros, sugerindo para a minha intervenção o seguinte tema: Desafios Globais para o Desenvolvimento.

Confesso que não me apercebi prontamente da dificuldade da matéria proposta, pois sobre o futuro da agricultura, nomeadamente europeia, são amplamente controversas as opiniões emitidas por decisores políticos, cientistas e académicos, técnicos, agricultores, múltiplos grupos de interesses ideológicos, comerciais ou outros, e população em geral.

A razão primeira destas divergências de opinião decorre da crescente dificuldade em compatibilizar a inevitabilidade de aumentar a produção de alimentos – a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) prevê a necessidade de um incremento de 70% até 2050 – com a proteção do ambiente, nomeadamente no que respeita ao aquecimento global, à poluição, à biodiversidade, à erosão e à sustentabilidade.

  1. Principais marcos da evolução da agricultura

Para perspetivar o andamento da atividade agrícola, começaria por evocar aqui o célebre soneto de Camões quando refere “Todo o mundo é composto de mudança, tomando sempre novas qualidades”.

Recorde-se que até à Revolução Neolítica, também denominada Agrícola, os humanos foram caçadores-recoletores e, portanto, nómados, o que corresponde a 90% da história do Homo Sapiens, em que este dispôs de um modo de vida harmonioso com o ambiente; ainda hoje existem alguns grupos de caçadores-recoletores, designadamente no Ártico, em África e na Austrália.

Entre dez e doze mil anos atrás, durante o período do neolítico, ocorreu um acidente genético natural, mas muitíssimo improvável: um triplo híbrido de gramíneas que tornou a cultura do trigo muito mais produtiva. Este acidente, ocorrido no Médio Oriente, está na origem da agricultura, que veio possibilitar o cultivo de alimentos, fomentar o aumento populacional e a vida sedentária, conduzindo assim à nossa civilização.

Comparativamente ao aludido acidente genético natural, o Doutor António Coutinho (2000) referiu que o atual milho transgénico é uma palidíssima imagem genética, e acrescentou que, então, só lentamente a agricultura ocupou o espaço dos caçadores-recoletores, dada a recusa destes em aceitar a nova tecnologia.

Posteriormente os conhecimentos agronómicos foram desenvolvidos principalmente por filósofos gregos e romanos, que através da observação foram expondo algumas teorias, com relevo para a chamada teoria do húmus, apresentada por Aristóteles cerca de 400 anos antes da atual Era, segundo a qual o húmus dava vida às plantas e estas davam vida ao homem e aos animais.

Só em meados do século XIX é que a teoria do prestigiado Aristóteles foi corajosamente destruída pelo químico alemão Liebig, ao afirmar que as plantas se alimentavam de nutrientes minerais e não de matéria orgânica. Como sublinha o Engenheiro Agrónomo e meu Mestre Quelhas dos Santos (2012), Liebig abriu o caminho para a descoberta dos adubos minerais.

De realçar a descoberta do processo Haber-Bosch, no início do século XX, que permite a obtenção do amoníaco a partir do azoto atmosférico. Estavam assim criadas as condições para se produzirem os adubos azotados, o que foi de suma importância porque o azoto é um constituinte de interesse vital para a planta. Segundo Roser & Ritchie (2013), sem o recurso à adubação azotada das plantas, a insuficiência de alimentos iria provavelmente reduzir a metade a população mundial.

Outro avanço científico que muito contribuiu para combater a fome no mundo deve-se ao Engenheiro Agrónomo Norman Borlaug, que em meados do século XX desenvolveu, nomeadamente, a variedade de trigo semi-anão de alto rendimento e resistente a doenças fúngicas; o arroz e o milho vieram igualmente a beneficiar de um importante melhoramento genético.

Estima-se que o trabalho de Borlaug tenha salvo da inanição próximo de mil milhões de vidas. Foi premiado com o Nobel da Paz em 1970 e defendeu a biotecnologia como forma de também diminuir a fome no mundo. No presente ano, o filantropo Bill Gates considerou Borlaug (sic) «um dos maiores heróis da história da humanidade».

Em meados do século XX registou-se um terceiro importante avanço tecnológico: o recurso à mecanização e à motorização, substituindo os músculos pelos combustíveis fósseis, dando assim origem a uma «agricultura nova», conforme se lhe referiu em 1959 o Engenheiro Agrónomo e Silvicultor Vieira Natividade, em conferência intitulada A velha agricultura e os novos tempos, quando cerca de 49% da população ativa do País ainda se ocupava da agricultura.

Uma outra área científica que viria a ter reflexos notáveis na saúde humana e na sanidade vegetal reside na descoberta dos modernos pesticidas. Em 1941 foi usado em larga escala o primeiro, o inseticida dicloro-difenil-tricloroetano (DDT), que viria a salvar cerca de 500 milhões de vidas devido principalmente à erradicação da malária. Em 1948, o químico suíço P. Müller ganhou o Prémio Nobel de Fisiologia & Medicina pela referida descoberta.

Todavia o DDT possuía elevado efeito residual e as suas agressões ecológicas foram denunciadas em 1962 pela bióloga norte-americana Rachel Carson, num famoso livro intitulado Primavera Silenciosa.

Este viria a suscitar a oposição dos fabricantes de pesticidas, mas finalmente, em 1970, esteve na origem da criação nos EUA da Environmental Protection Agency (EPA), com a missão de proteger a saúde humana e o ambiente, com poderes para legislar e fiscalizar, tornando-se uma das mais respeitadas instituições dos EUA.

Graças aos progressos agronómicos supramencionados, associados à chamada Revolução Verde, entre 1961 e 2009, a quantidade de terras cultivadas expandiu-se 12%, porém a quantidade de alimentos produzidos aumentou 300% (Pinker, 2018).

De notar que, todavia, os quatro avanços supramencionados apresentam externalidades ambientais negativas, que importa minimizar, e, ademais, compaginar com a necessidade de aumentar a produção de alimentos, a meu ver recorrendo designadamente à moderna biotecnologia, a que adiante me referirei mais detidamente, à expansão do regadio, nomeadamente nas regiões com clima mediterrânico, e ainda à agilização da burocracia, em que o passo mais profícuo consiste na aplicação ampla do princípio do deferimento tácito. Concomitantemente importa minorar as perdas devidas a pragas e doenças e também diminuir o elevado desperdício alimentar que se verifica nos países ricos.

Por outro lado, os progressos supramencionados contribuíram para contrariar a tese defendida por Malthus, em 1798, segundo a qual a população crescia em progressão geométrica, enquanto a produção de alimentos crescia em progressão aritmética.

Na verdade, a população mundial triplicou nos últimos 70 anos e, além disso, a pobreza extrema baixou de 85 por cento em 1800 para cerca de 9 por cento da população mundial atualmente – o maior sucesso da minha geração, sem precedente na história da humanidade e graças ao capitalismo. Acresce que a redução do número de pessoas em pobreza extrema será acompanhada pelo decréscimo das famílias numerosas, pois existe uma forte relação entre o rendimento e o número de filhos por mulher.

De salientar que atualmente os europeus despendem menos de 15% do seu rendimento em alimentação, quando na década de 1950 gastavam mais de 50%.

No que concerne à produção animal, importa referir os progressos científicos realizados nos domínios do melhoramento zootécnico, da alimentação, da sanidade e do bem-estar.

A fim de ilustrar esta evolução, cito o trabalho desenvolvido pelo ilustre Engenheiro Agrónomo Arriaga e Cunha, que em 1957 trocou o conforto do laboratório de investigação pelas galochas e o fato de macaco, a fim de instalar uma exploração eficiente de bovinos leiteiros, tendo em mente duas preocupações principais: contribuir para melhorar a dieta do povo português e defender da erosão os solos declivosos e delgados da propriedade onde se encontrava a referida exploração. No que ao primeiro objetivo diz respeito, importa realçar a preocupação em utilizar sémen suscetível de dar origem a vacas leiteiras de alta produção e em adequar com rigor científico a alimentação às necessidades dos animais, conforme explanou detalhadamente na comunicação que apresentou em 1978 no Congresso da Ordem dos Engenheiros. Neste estudo o autor defendeu insistentemente a opção por vacas de elevada produção, como forma de diluir as despesas fixas por litro de leite (energia de manutenção do animal, mão-de-obra, equipamentos, etc), sublinhando mesmo que uma política de vacas de baixa produção (como então muitos preconizavam) «teria efeitos sociais desastrosos».

No que toca à preservação do ambiente, o Engenheiro Arriaga e Cunha considerou o espectro da erosão como um fenómeno que compromete seriamente a existência das futuras gerações de portugueses como nação independente, pelo que instalou pastagens permanentes melhoradas, capazes de fixar o azoto atmosférico e de aumentar a fixação de carbono atmosférico, melhorando assim a capacidade de retenção de água e a fertilidade dos solos, que – sublinhe-se – não dispunham de condições para instalar culturas para consumo humano direto.

A exploração em apreço constituiu um modelo para o setor leiteiro português, com destaque para a alta genética atingida na raça bovina Holstein e também proporcionou inúmeros estágios a estudantes do ensino superior. O seu fundador foi um Engenheiro Agrónomo de referência, não só pela sua elevada competência profissional, como também pela responsabilidade, tanto social como ambiental, que assumiu ao longo da vida.

Para ilustrar outros progressos científicos alcançados no domínio da Zootecnia nas últimas décadas, apresento em seguida um exemplo que conheço bem de perto. Trata-se da que é presentemente a maior empresa europeia de multiplicação avícola (Gallus gallus) com instalações próprias, onde o desempenho das galinhas reprodutoras pesadas tem experimentado uma melhoria notória desde a fundação da empresa, em 1986, até à presente data. Esta evolução deve-se principalmente às técnicas de seleção a que as reprodutoras foram sujeitas e, também, à melhoria do condicionamento ambiental, das condições de bem-estar e ainda à administração de uma dieta de precisão.

Concretamente, em 1986 uma galinha às 60 semanas de vida produzia 115 pintos do dia e consumia 500 g de alimento por pinto (futuro frango de carne). Atualmente, à mesma idade, uma galinha reprodutora pesada atinge 168 pintos, com um consumo de 358 g de alimento composto por pinto do dia produzido.

Também no caso do desempenho do frango de carne – o mais representativo no segmento da carne de aves – os geneticistas deram prioridade à velocidade de crescimento, tendo para o efeito recorrido à seleção massal. Ao crescimento rápido do frango corresponde uma menor despesa energética de manutenção e, consequentemente, um menor consumo de alimento para atingir o peso vivo pretendido ao abate. Consideremos o exemplo de um frango abatido aos 28 dias de idade: em 1957 atingia o peso vivo de 316 g e um índice de conversão alimentar de 4,4, isto é, precisava de consumir 4,4 kg de alimento por kg de aumento de peso vivo; em 2014, à mesma idade um frango apresentava um peso vivo de 1501 g e um índice de conversão de 1,4. Adicionalmente, o melhoramento zootécnico fixou-se também na maior proporção de peito – a parte mais valorizada pelo mercado – e numa seleção genética balanceada.

Os dois exemplos avícolas supramencionados – que ilustram uma melhoria crescente da eficiência alimentar, tanto na fase reprodutiva como na produtiva – conduziram ao abaixamento dos custos de produção e, portanto, dos preços de venda aos consumidores; adicionalmente, minimizaram o impacto ambiental por kg de carne produzida, pois implicam menor consumo de alimentos vegetais, logo menor área cultivada.

A OCDE/FAO (2021) prevê que, na presente década, a produção de carne de aves sofra um incremento de 13% a nível mundial, tendo em consideração a crescente eficiência alimentar das aves, as preocupações com a sustentabilidade ambiental, o elevado valor nutritivo da referida proteína, constituindo uma opção económica para os consumidores e apelativa do ponto de vista gustativo, além da inexistência de restrições de cariz religioso ao seu consumo. Assim sendo, este é encarado não só como uma opção alimentar saudável, mas também económica e produzida eficientemente em termos ambientais, para um crescente número de consumidores.

Curiosamente, atualmente, nalguns países afluentes, assiste-se à emergência de uma tendência para promover a criação de frangos de crescimento lento, na suposição que tal proporciona melhor bem-estar às aves; anote-se a menor eficiência alimentar destes animais, e, consequentemente, a necessidade de  uma maior área de cultivo para produzir os alimentos ingeridos pelas aves. Mais: observa-se também alguma preferência pela criação de aves ao ar livre, o que eleva os riscos para a saúde pública e a economia dos avicultores, com relevo para o perigo da gripe aviária. Entre nós, porém, talvez porque a menor eficiência alimentar conduz a um custo de produção mais elevado, a procura dos referidos frangos é reduzidíssima.

  1. Uma Europa centralista e a reforma da Política Agrícola Comum (PAC)

Na sequência da crise das dívidas soberanas da década passada, da intervenção da Comissão Europeia na pandemia e da estratégia que desenhou para o combate às alterações climáticas, decorre a construção de uma União Europeia (UE-27) cada vez mais centralista e menos liberalizante.

E trata-se de uma dinâmica centralizadora com significativa e preocupante expressão financeira: conforme se ilustra na figura seguinte, o Quadro Financeiro Plurianual (QFP) 2021-27, comparativamente ao período precedente de 2014-2020, consagra uma expressiva redução das políticas que mais valorizam o princípio da subsidiariedade e que conferem maior margem de manobra aos Estados-Membros, mais precisamente a Política de Coesão e a Política Agrícola Comum, aumentando significativamente os recursos financeiros para as políticas geridas diretamente pela Comissão Europeia.

Confesso que não encontro razões favoráveis à economia e, em particular, à agricultura, que justifiquem o dirigismo planificado centralmente pelo Estado.

Os exemplos do passado, alguns apresentados em seguida, até ao presente só foram praticados em regimes autocráticos e nunca em democracias liberais com iniciativa privada, tendo todos conduzido a resultados calamitosos. Na minha modesta opinião, os dirigentes políticos da UE-27 não deveriam encorajar a implementação de modelos de agricultura planeada centralmente.

Entre nós, a Campanha do Trigo (1929-1938), assente no modelo ideológico da autarcia, incluiu inúmeras medidas de apoio à produção de trigo, nomeadamente no Alentejo. As práticas agrícolas então adotadas, como as arroteias e a substituição do montado por áreas de cultivo de cereais, tiveram efeitos desastrosos no que à defesa do ambiente diz respeito, designadamente agravando a erosão dos solos e afetando a biodiversidade. Também em termos económicos, as elevadas colheitas de 1931 e 1936 desvalorizaram fortemente o preço do trigo, dando origem a uma grave crise do setor.

Na União Soviética o “caso Lysenko” constitui um exemplo de pseudociência utilizada para manipulação política e ideológica, que teve como consequências o atraso da agricultura soviética e a forte penalização dos cientistas soviéticos que se recusaram a aceitar as teorias – de herança ambientalmente adquirida – defendidas por Lysenko.

De 1927 a 1948, por razões de cariz político, Trofim Lysenko beneficiou do apoio de Josef Stalin, o que lhe permitiu uma ascensão vertiginosa no poder político. Lysenko rejeitou a teoria da herança genética mendeliana, não acreditava que existissem genes e entendia que a produtividade das vacas leiteiras não dependia do seu património genético, mas apenas do maneio.

As teorias pseudocientíficas de Lysenko vieram a ser adotadas também na China, quando Mao Tsé-Tung, entre 1958 e 1960, lançou a campanha denominada Grande Salto em Frente: milhões de chineses foram transferidos para comunas na sequência de uma coletivização forçada, as ideias absurdas de Lysenko foram postas em prática e as condições climáticas foram adversas. Como consequência do que precede ocorreram “Três Anos Amargos” na China, responsáveis por algumas dezenas de milhões de vítimas, tendo a maioria morrido de fome no campo.

Esta situação sofreu uma inversão total nas últimas décadas, tendo o Partido Comunista da China substituído a economia planificada pelo capitalismo e a economia de mercado – bases do seu milagre económico.

Passando à União Europeia e antes de considerar a reforma da PAC, será pertinente observarmos que os dirigentes europeus têm denotado uma atitude de Velhos do Restelo no tocante à aplicação da moderna biotecnologia no domínio agrícola, frequentemente denominada biotecnologia verde.

Na realidade, desde a década de 1990 que a UE se tem revelado refratária a esta nova tecnologia, nomeadamente não permitindo a cultura de plantas melhoradas com recurso à engenharia genética (OGMs ou transgénicos), as quais recebem um gene de outro organismo doador, para designadamente lhes conferir resistência a herbicidas, ao ataque de insetos ou para melhorar o seu valor nutritivo.

A título de exceção, em 1998 na Península Ibérica foi autorizada a cultura do milho Bt (que recebeu genes da bactéria Bacillus Thuringiensis), resistente à broca europeia e, portanto, evita a aplicação de inseticidas, diminuindo assim o impacto ambiental da cultura, que ocupa cerca de 121 mil ha.

Cabe notar que as culturas transgénicas ocupam uma área de aproximadamente 200 milhões de hectares em 26 países e outros 44 países importam alimentos GM, com destaque para os 27 da UE que, em particular, importam anualmente cerca de 35 milhões de toneladas de soja transgénica destinada à alimentação animal.

Posteriormente, em 2012, duas cientistas – que vieram a ser distinguidas em 2020 com o Prémio Nobel da Química – desenvolveram um método extraordinário de edição do genoma, conhecido como CRISPR-Cas9 ou “tesoura molecular”, incluído nas denominadas “Novas Técnicas Genómicas” (NTG).

Cabe notar que as modificações genéticas induzidas por esta recente tecnologia não inserem genes de outros organismos nas plantas, permitindo alterações pontuais no ADN. O aludido método apresenta um enorme potencial no campo da medicina e também no melhoramento das plantas, de modo que estas possam suportar melhor as alterações climáticas, reduzir a suscetibilidade a pragas e doenças, e ainda diminuir a produção de substâncias indesejáveis, como o glúten no trigo. Vários países (e.g. EUA, Brasil, Argentina e Japão) já isentaram de regulamentação as culturas editadas de genoma, que não incluem ADN transgénico, admitindo que as alterações poderiam acontecer por mutações naturais.

Na UE a edição genética de plantas (NTG) conheceu alguma resistência por parte dos decisores políticos; recentemente, porém, o Conselho de Ministros da Agricultura mostrou-se favorável à adaptação da legislação às NTG.

Entretanto, mais recentemente têm emergido novas tecnologias com base na biologia molecular, em particular com preocupações de índole ambiental: (i) a empresa Pivot Bio criou o primeiro fertilizante biológico designadamente para milho, que tem como ingrediente ativo uma bactéria geneticamente modificada que consegue fixar o azoto atmosférico e transferi-lo para a planta, numa relação simbiótica; (ii) diversos investigadores vêm desenvolvendo diferentes tecnologias com vista a remover o CO2 da atmosfera, aumentando a eficiência fotossintética das plantas, alterando a relação entre as raízes e a parte aérea das plantas, elevando a produtividade das culturas, etc; (iii) em junho de 2021, a revista Nature Biotechnology publicou um estudo que demonstra a importância da desmetilação do ácido ribonucleico (RNA) no aumento substancial da produtividade das plantas de arroz e de batata, promovendo a eficiência fotossintética e também a tolerância à seca.

Já no que à farmacologia diz respeito, os decisores políticos europeus têm revelado uma atitude mais recetiva, ou mesmo entusiástica, como recentemente aconteceu com o desenvolvimento em tempo recorde de vacinas contra a COVID-19, em que os cientistas, inclusive europeus, recorreram à biologia molecular. Esta, aliás, revela-se altamente promissora no campo da medicina.

Parece importante assinalar que, no que concerne à aplicação da moderna biotecnologia e a outras matérias relacionadas com os riscos associados aos alimentos, os decisores políticos europeus nem sempre aceitam os pareceres emitidos pela entidade científica oficial – Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA) –, criada em 2002 justamente para, nomeadamente, prestar aconselhamento científico independente e atualizado sobre questões relacionadas com a segurança dos alimentos, tendo em vista apoiar a legislação e as políticas europeias.

De salientar que os dirigentes políticos europeus não raro ignoram os pareceres emitidos pela aludida EFSA, mesmo que os mesmos coincidam com as decisões tomadas pelas também prestigiadas agências norte-americanas: Food and Drug Administration – FDA (respeitante à segurança dos alimentos, inclusive dos geneticamente modificados) e Environmental Protection Agency – EPA (que se ocupa, designadamente, da legislação e fiscalização atinentes aos produtos fitofarmacêuticos).

A este propósito importa assinalar que no âmbito do Pacto Ecológico Europeu, a denominada Estratégia do Prado ao Prato, aprovada pela Comissão Europeia, fixa como meta até 2030 a expansão do Modo de Produção Biológico (MPB) em pelo menos 25% da área agrícola. Ora como nesta área será proibido o uso de herbicidas, recorrendo-se, portanto, nomeadamente à mobilização do solo para eliminar as plantas infestantes, as perdas de carbono do solo aumentam, por erosão e mineralização; é certo que as aludidas perdas poderão ser compensadas com a aplicação de estrumes, mas neste caso está-se a transferir carbono dos solos que produziram o alimento administrado aos animais. Para evitar a referida causa das perdas de carbono, os Engenheiros Agrónomos Mário de Carvalho e Nuno Marques (2021) têm promovido a agricultura de conservação, não procedendo à mobilização do solo e incorporando os resíduos das plantas; em estudos de longo prazo registaram um aumento do teor de carbono orgânico do solo a um ritmo de 0,1% ao ano (note-se que nos acordos de Paris o desafio consiste num crescimento anual de 0,04% para o combate às alterações climáticas). Sublinhe-se que a matéria orgânica constitui a base da fertilidade dos solos e representa o principal sumidouro de carbono dos ecossistemas terrestres.

Os autores supramencionados estimam que, ao elevar-se dos atuais 8% para 25% da área ocupada com agricultura biológica, a redução da produção agrícola da UE-27 atingirá 56,13 Mt.

Em Portugal, conforme observa o Engenheiro Agrónomo Francisco Avillez (2021), a expansão das áreas em modo de produção biológico, não obstante todos os apoios públicos em vigor nas últimas décadas, tem registado uma expressão reduzidíssima, principalmente no que respeita à produção de alimentos para consumo direto humano. E interroga: será que a meta dos 25% da superfície agrícola utilizada (SAU) é realista? E eu pergunto se a referida área não deveria ser definida em função da procura dos alimentos ditos biológicos ou orgânicos por parte dos consumidores.

A concretizar-se esta expansão, bem como as restrições adiante mencionadas, a balança comercial agrícola portuguesa ficará ainda mais desequilibrada, o que implicará mais importações que irão elevar: (i) a já enorme dívida externa; (ii) a pressão noutros países com regulamentação diferente; (iii) o preço dos produtos agrícolas; (iv) a pegada de carbono dos alimentos.

Para supostamente tornar mais sustentáveis os nossos sistemas alimentares, na aludida Estratégia do Prado ao Prato, a Comissão Europeia também estabeleceu como objetivos: a redução da utilização de pesticidas (50%), de fertilizantes (20%) e de agentes antimicrobianos (50%).

Não se conhece a base científica em que se apoiou a decisão referente aos produtos fitofarmacêuticos, previamente aprovados pela EFSA. Admitindo que estes sofram uma possível perda de autorização da utilização de um conjunto de mais de 80 substâncias ativas na UE, a prestigiada AGRO.GES realizou um estudo para avaliar as repercussões económicas que tal decisão teria em cinco fileiras agrícolas – milho-grão, vinha para vinho, tomate para indústria, olival para azeite e pêra Rocha – que representam um terço da produção vegetal em Portugal. Como conclusão, a AGRO.GES considerou que o milho-grão e a vinha para vinho poderiam perder a viabilidade económica por completo, enquanto o tomate, o olival e a pêra sofreriam uma perda de receita anual de, respetivamente, 111,4 M €, 28,9 M € e 26,2 M €.

No que se refere à proposta de redução da aplicação de fertilizantes inorgânicos, importa salientar que Portugal, em 2019, registou um consumo baixíssimo (31 kg por hectare de SAU), correspondente a menos de metade da média da UE-27.

No passado mês de Setembro, o estudo publicado pela Comissão Europeia  sobre as consequências da Estratégia do Prado ao Prato revela-se em sintonia com os resultados anteriormente difundidos pelos norte-americanos (USDA-ERS), prevendo um decréscimo de 12% da produção, um incremento de 17% nos preços, uma diminuição de 20% nas exportações, um aumento de 2% nas importações e um acréscimo do custo da alimentação na UE na ordem dos 130 € per capita. 

No caso particular de Portugal, na minha opinião a aplicação das três medidas anteriormente comentadas – MPB, pesticidas, fertilizantes inorgânicos – deve observar algumas caraterísticas estruturais específicas, tanto da economia como da agricultura portuguesa.

No que respeita à primeira, importa relevar três importantes caraterísticas, a saber: elevada dívida externa, economia estagnada há duas décadas e envelhecimento acentuado da população.

Relativamente à agricultura portuguesa, cumpre realçar as seguintes caraterísticas: (i) reduzida área de solos com aptidão agrícola (28%), segundo o Engenheiro Agrónomo e distinto pedologista Carvalho Cardoso (1973), antes, portanto, da nossa entrada no atual espaço económico, pois a concorrência de produtos de outras regiões pode impedir que se cultivem solos de classes mais baixas; (ii) escassa superfície irrigável (15,9% da SAU em 2020, segundo o INE), da qual a superfície regada corresponde a cerca de 89,8%,  o que é manifestamente insuficiente num país com clima mediterrânico e por isso com um acentuado défice hídrico na maior parte do território, o que afeta a produtividade da generalidade das culturas; (iii) em decorrência do que precede e na sequência da reforma da PAC de 1992, segundo o Engenheiro Agrónomo Francisco Avillez deixaram de ser cultivados 1,3 milhões de hectares, devido à falta de competitividade das culturas neles instaladas, o que corresponde a uma ampla área propícia à biodiversidade, em linha com a Estratégia do Pacto Ecológico da União Europeia; (iv) segundo a PORDATA, em 2019 as explorações agrícolas de Portugal correspondiam a 3,96 milhões de hectares de SAU – equivalente a 43,5% do território nacional, cabendo notar que as pastagens permanentes ocupam mais de metade da SAU; (v) 2/3 do número total de explorações agrícolas tem uma dimensão muito reduzida (< 5 ha) e representam 9,4% da SAU, as quais só poderão ser competitivas em situações particulares, designadamente com disponibilidade de água e em alguns nichos de mercado, pelo que muitas acabarão por sair da atividade produtiva, agravando assim a desertificação rural.

  1. Desafios para a agricultura portuguesa

Seja-me permitido começar por manifestar a minha opinião no sentido de reconhecer que Portugal não dispõe de condições para assegurar a sua soberania alimentar, nomeadamente desde que a sua economia se encontra integrada num amplo mercado agrícola. Com efeito, para múltiplas culturas, Portugal não beneficia de condições edafoclimáticas que lhe permitam ser competitivo com outros países pertencentes ao mesmo espaço económico. Mas, por outro lado, Portugal possui algumas regiões com caraterísticas pedológicas e climáticas favoráveis a determinadas culturas típicas da região mediterrânica, como a vinha e o olival, ou muito temporãs, mormente nos domínios das frutas e dos produtos hortícolas. Assim sendo, podemos delinear uma estratégia suscetível de equilibrar a balança comercial de produtos agrícolas e agroalimentares, mas não a autossuficiência alimentar.

Em qualquer caso não advogo o planeamento central da economia, mas defendo a «economia social de mercado altamente competitiva», conforme proposto para a UE no Tratado de Lisboa.

Gostaria também de anotar que, nos últimos anos, os políticos europeus referem-se à agricultura sem dar ênfase à sua principal função, ou seja, à produção de alimentos que garantam a nossa sobrevivência – parece que acreditam que somos capazes de viver na Europa apenas como consumidores. Além disso, não raro revelam um egoísmo eticamente inaceitável ao esquecerem que cerca de mil milhões de seres humanos vivem em pobreza extrema, deitando-se todos os dias com fome e, ademais, não dispondo de casa com água potável, condições de salubridade e eletricidade. Acresce que os demógrafos das Nações Unidas estimam que a população virá a experimentar um aumento de 26% até 2050 (a UE representará então cerca de 5% da população mundial).

Com vista a tornar a agricultura portuguesa mais competitiva, próspera e amiga do ambiente, defendo as seguintes áreas principais de intervenção governamental:

(i) Implementação de uma cadeia de valor agrícola equilibrada, entre agricultores e fornecedores de fatores de produção por um lado e, por outro, entre produtores agrícolas e cadeias de distribuição alimentar; no primeiro caso os empresários agrícolas estão não raro submetidos a situações de monopólio ou oligopólio (e.g. matérias-primas para alimentação animal, animais selecionados, medicamentos, pesticidas, sementes, energia elétrica, etc.), enquanto no segundo caso assistimos a um desequilíbrio acentuado entre produtores agrícolas e empresas da grande distribuição, o qual é mais evidente quando estas realizam campanhas promocionais de algum bem alimentar.

A meu ver, estas são as duas razões principais que tornam a atividade agrícola cada vez menos atrativa, quer para os empresários agrícolas (que cada vez são menos, nomeadamente jovens agricultores), quer para os trabalhadores agrícolas por conta de outrem, pelo que os trabalhadores portugueses vêm sendo progressivamente substituídos por imigrantes provenientes de regiões de pobreza extrema, estabelecendo-se um relacionamento simbiótico entre ambas as partes; para maior dignidade dos agricultores europeus, defendo que em vez de se distribuírem aos agricultores subsídios com cariz de apoio social, as entidades competentes se esforcem para que sejam estabelecidos preços justos, sem prejuízo para os agricultores, controlando práticas negociais abusivas, monitorizando a relação entre fornecedores diretos e grandes cadeias de distribuição alimentar, promovendo a transparência na cadeia (e.g. usando rótulos explicativos da formação dos preços), proibir vendas com prejuízo (atente-se às típicas promoções), etc.

É oportuno assinalar que a vulnerabilidade dos agricultores, face aos grandes operadores (alimentares e florestais), é também sentida pelos decisores polítios de Bruxelas. Assim sendo e tendo em vista assegurar um nível de vida equitativo à população agrícola, foi publicada a Directiva (UE) 2019/633, sendo que, a menos de duas semanas da Comissão Europeia ter aberto procedimento de infracção contra Portugal, a transposição da aludida Directiva foi feita por via do Decreto-Lei 76/2021, que permite aos pequenos e médios fornecedores da cadeia de abastecimento agrícola e alimentar apresentarem queixa confidencialmente contra políticas desleais impostas unilateralmente pelos compradores de maior dimensão; resta saber se o diploma supramencionado será correctamente aplicado, ou mesmo se será efetivamente aplicado, em ordem a conceder efectiva protecção aos segmentos mais fracos da cadeia de abastecimento em apreço.

No setor florestal observa-se idêntico desequilíbrio, pelo que não será por acaso que, por um lado, cada dia há mais agricultores a não investirem na atividade, o que também tem implicações negativas nos fogos florestais.

Cumpre observar que, sobretudo nas últimas três décadas, o reduzido número de detentores dos segmentos finais das fileiras agrícola, agroalimentar e florestal alcançaram lucros excecionalmente elevados;

(ii) Expansão da área irrigada, na medida em que nas atuais condições climáticas de grande parte do território continental e num quadro de alterações climáticas, o regadio permite aumentar consideravelmente a produtividade da generalidade das culturas vegetais, proporcionando assim maior competitividade aos produtos agrícolas, maior rentabilidade aos investimentos agrícolas e apoio à agricultura familiar, tudo contribuindo para uma menor desertificação das áreas rurais e um decréscimo do défice da nossa balança comercial agrícola e agroalimentar (destaque-se a concretização do Programa Nacional de Regadios, a construção da barragem do Pisão e a realização do auspicioso Projeto Tejo);

(iii) Agilização da burocracia, nomeadamente no Ministério da Agricultura (como procedimento expedito, recorde-se o antigo programa Vitis, que exigia apenas um pedido de ajuda – pré-fixada) e em especial no Ministério do Ambiente que, a meu ver, não raro constitui um obstáculo ao investimento (tão necessário a um país cuja economia se encontra estagnada há duas décadas), sugerindo que, para superar a burocracia, o passo mais profícuo consistiria na aplicação ampla do princípio do deferimento tácito (atualmente, por exemplo, um simples pedido de espalhamento de efluentes pecuários pode aguardar resposta durante vários anos – não obstante promover a bioeconomia circular e tratar-se do procedimento recomendado pelo ministro da tutela); ainda a propósito de burocracia, de salientar que esta tem um peso considerável quando se trata do modo de produção biológico, dadas as exigências inerentes à certificação do sistema de produção;

(iv) Maior recetividade à moderna biotecnologia verde, cujo progresso se tem revelado cada vez mais interessante e promissor, principalmente no que concerne à defesa do ambiente, na medida em que pode tornar as plantas mais resistentes a pragas, doenças e défice hídrico, para além doutros progressos, nomeadamente no domínio dos fertilizantes biológicos e da retenção do CO2 atmosférico;

(v) Apoio às decisões políticas fundamentalmente com base na ciência e não em preconceitos ideológicos; a este propósito, importa ter presente o pensamento do insigne Engenheiro António Guterres e atual distinto secretário-geral das Nações Unidas: «Ao recusar a importância da ciência na fundamentação das decisões políticas, caímos no exemplo do Galileu e naqueles que o combateram. E decisões políticas desse género não têm futuro».

  1. Declínio da União Europeia

i) Como é sabido, a mortalidade diminui e a esperança de vida aumenta à medida que as sociedades se tornam mais prósperas, o que no caso português se agrava devido à elevada emigração de jovens, especialmente dos melhores preparados profissionalmente – o que concorre para pôr em causa a sustentabilidade da Segurança Social e elevar os encargos com a Saúde – e decorre da estagnação da economia portuguesa que se vem registando desde o início do século XXI.

Na génese desta esteve a conjugação de vários fatores: a) os excessos de burocracia e de centralismo (e.g., no caso particular da produção animal, e embora Portugal seja deficitário em carne, a dificuldade de licenciamento de uma exploração pecuária não raro repele o investimento); b) espartilhos ideológicos que dificultam a iniciativa privada; c) constituição de diversas empresas monopolistas (ou oligopolistas) na sequência das nacionalizações ocorridas em 1975 e que posteriormente foram reprivatizadas, usufruindo lucros anormalmente elevados (rendas), reduzindo assim os benefícios para a sociedade; d) ao arrepio das práticas doutros países da União, Portugal tem prosseguido uma política fiscal pouco amiga do investimento produtivo criador de riqueza social e de emprego qualificado;

A estagnação do crescimento económico no decurso do século XXI ;resulta das causas a que fiz referência, mas também das opções macroeconómicas. Mesmo com o efeito indutor do Plano de Recuperação e Resiliência e o próximo ciclo de fundos europeus para o período 2021-2027, o fraco crescimento económico perspetivado pelo Governo para 2022 compara mal com as previsões da OCDE divulgadas no passado mês de Setembro.

Desde 2011, quando foi pedido o apoio financeiro da troika, até 2020, o nosso PIB evoluiu em média -0,2%/ano. Será com as mesmas políticas públicas que vamos passar a crescer ao nível da Zona Euro em 2021 (+5,3%)?

Com o crescimento anémico que Portugal tem vindo a evidenciar nos últimos anos, qual é o racional de uma política agrícola que visa reduzir a atividade económica e a produção competitiva?

ii) No que à agricultura diz respeito, o referido inverno demográfico torna necessário recorrer cada vez mais a mão-de-obra estrangeira, nomeadamente para realizar as operações que não é ainda possível mecanizar (e.g. colheita de fruta);

iii) Ao contrário do que se verifica nos EUA, onde as inovações na biotecnologia são apoiadas e colocadas no mercado para progresso da sociedade, na UE os partidos políticos que defendem a liberdade e a iniciativa privada não têm revelado capacidade para impulsionar a moderna biotecnologia verde, e assim contribuírem para o avanço tecnológico e a prosperidade dos europeus;

iv) Na sequência da globalização e da implementação na UE de políticas ditas ambientais, assistiu-se à desindustrialização da Europa, o que representa um erro estratégico claramente exposto na atual crise socioeconómica;

v) Confome já comentado anteriormente, estou em crer que o acordo de princípio sobre a reforma da PAC, recentemente adotado pelos Estados Membros, irá condenar a agricultura europeia e, em especial, a já frágil agricultura portuguesa, com um acentuado desequilíbrio da balança comercial, pelo que defendo enfaticamente que a reforma supramencionada não venha a ser concretizada nos moldes atualmente previstos;

vi) Ainda no âmbito do declínio da UE, recorde-se que, desde o fim da II Grande Guerra, a segurança da Europa Ocidental tem sido assegurada por um ‘guarda-chuva’ norte-americano, sólido deus ex-machina do Ocidente; esta fragilidade da UE acentuou-se na sequência da saída do Reino Unido, o único país da União com uma força militar de defesa poderosa;

vii) Com grande parte da indústria transferida para países terceiros e com o setor digital a continuar irrelevante, refletindo-se negativamente na indústria 4.0, no setor financeiro e no comércio online, a UE tornou-se fortemente dependente de terceiros; agora, ao apresentar uma proposta tendente a fragilizar igualmente a agricultura, e, adicionalmente, sem dispor de poder militar próprio, podemos concluir que a UE está a tornar-se irrelevante na cena internacional (a recente decisão tomada unilateralmente pelos EUA acerca da deprimente retirada do Afeganistão ilustra a atual debilidade europeia);

vii) Por tudo o que antecede, na minha humilde, mas firme e convicta opinião, importa que os decisores políticos da UE se apercebam que a trajetória que vem sendo adotada terá reflexos económicos e sociais negativos, para além de afastar algumas externalidades ambientais para países terceiros; adicionalmente, poderá até vir a ter consequências políticas altamente lesivas – nomeadamente para os europeus que perfilham a democracia liberal, que lhes tem proporcionado liberdade individual e prosperidade sem precedentes históricos.

Manuel Chaveiro Soares

Engenheiro Agrónomo, Ph. D.


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