Maaike Smits

A solução para o leite é muito simples, falta vontade da indústria e distribuição – Maaike Smits

A crise dos produtores de leite está na ordem do dia e ainda bem, porque todos os dias sinto a corda a apertar no meu pescoço… Precisamos de comprar alimentos para os animais, peças para máquinas que avariam, contratar serviços para terminar as sementeiras, pagar as contas da colheita de verão, pagar os salários aos colaboradores e todos os meses uma ou outra fatura vai sendo empurrada para a frente e essa bola de neve vai ficando maior.

Não tenho dúvidas que o valor da cadeia do leite entre o consumidor e o produtor está mal distribuído. Não sei exatamente onde fica, apenas tenho a certeza de que a nós, produtores, não chega. No início do verão as receitas já não davam para as despesas e o mercado internacional ainda não tinha sofrido as subidas alarmantes que agora acontecem a cada dia que passa no que respeita aos fatores de produção (matérias-primas para alimentação animal, gasóleo, adubos, electricidade) nem o preço do leite a nível internacional tinha batido os recordes que anda a bater. Estamos cada vez pior e a sensação de injustiça é cada vez maior.

O ponto que se coloca agora é que os nossos factores de produção em Portugal estão indexados à volatilidade do mercado internacional, mas o preço do leite não está. Tudo sobe lá fora, incluindo o preço do leite, mas por aqui sobe tudo menos o leite…

Existe a eterna desculpa de que há leite a mais no mercado português, mas se efectivamente há, porque não valorizam mais os sólidos constituintes do leite? A verdade é que os valores da manteiga bateram recordes. Se a gordura do leite for mais valorizada compensa aos produtores produzirem menos litros com mais qualidade. Ganhávamos todos e solucionávamos o problema do leite em excesso no mercado interno.

Produzimos leite com os maiores cuidados no ambiente e bem-estar animal e o nosso produto é tão bom como o dos produtores do resto da Europa, as nossas vacas são tão eficientes como as deles, o nosso preço também tem de ser como o deles.

A solução é tão simples:

A distribuição tem de deixar de usar o leite como isco e praticar preços decentes nas suas superfícies e a indústria deve subir o preço base e valorizar mais a qualidade do leite que produzimos. Mais valorização pelos sólidos vai levar a menos excedentes no mercado interno e melhores rendimentos em queijo, manteiga e iogurte, os produtos que conferem valor acrescentado ao produto base.

Indústria e distribuição tem que parar com a guerra irresponsável por quotas de mercado baseada em preços baixos. Sentem-se à mesa, mas com a verdadeira intenção e compromisso de manter a base da pirâmide que os sustenta e comprometam-se com uma solução que faça chegar à produção um preço justo, que já devia ter vindo ontem. Indexem o preço pago ao produtor aos preços europeus. É o que precisamos e exigimos. Deixem de brincar ao empurra, deixem de assobiar para o lado, deixem-se de desculpas e passem das boas intenções à ação, senão depois de nós desaparecermos vão ficar vocês com o menino na mão…

Maaike Smits

Engenheira Zootécnica e Produtora de Leite

Leite: Por uma distribuição justa na cadeia de valor – Maaike Smits


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