A União Europeia tende para uma construção cada vez mais centralista que tem causado desagrado a alguns povos, cujo descontentamento já se concretizou com a saída dos britânicos, que poderão vir a ser acompanhados por outros países. Na verdade, a história mostra-nos como o centralismo estatal pode conduzir a insucessos graves, designadamente no domínio da agricultura. Sumariamente trago à colação três exemplos ilustrativos de desastres causados pelo dirigismo planificado e centralmente conduzido pelo Estado.
Entre nós, a Campanha do Trigo (1931-1938) fortemente apoiada pelo Doutor Salazar com vista à autossuficiência alimentar do País, conduziu por um lado ao uso de práticas agrícolas ecologicamente desastrosas e conducentes a graves problemas, nomeadamente de erosão dos solos e de biodiversidade; por outro lado, as elevadas colheitas registadas de 1931 e 1936 deram origem à prática de preços muito baixos.
Sumariamente recordo também a pseudociência que o agrónomo Trofim Lysenko impôes na URSS, de 1927 a 1948, causando um atraso considerável na agricultura daquele país, mormente no que concerne ao melhoramento genético de plantas e de animais, pois Lysenko não acreditava na existência de genes e por isso recusava-se a aceitar a teoria de hereditariedade proposta por Mendel.
A teoria de Lysenko, conhecida como da herança ambientalmente adquirida, foi posteriormente transferida para a China, nomeadamente aquando do Grande Salto em Frente (1958-1960), o que juntamente com a coletivização das terras, acompanhada por forte burocracia e corrupção, para além da ocorrência de condições climáticas desfavoráveis, causou a morte por fome de muitos milhões de chineses.
Atualmente e para ilustrarmos de forma clara a dinâmica centralizadora de Bruxelas, apresentamos em seguida o Quadro Financeiro Plurianual (QFP) 2021-27, comparando-o também ao período precedente (2014-2020), que consagra uma expressiva redução das políticas que mais valorizam o princípio da subsidiariedade e que conferem maior margem de manobra aos Estados-Membros, mais precisamente a Política de Coesão e a Política Agrícola Comum, aumentando significativamente os recursos financeiros para as políticas geridas diretamente pela Comissão Europeia.
Também as imposições decorrentes do Pacto Ecológico Europeu, aplicadas sem atender às especificidades de cada país, representam um forte golpe nomeadamente para a agricultura portuguesa, caraterizada por dispor de uma escassa área de solos com aptidão agrícola, uma área irrigada particularmente reduzida para uma região de clima mediterrânico e uma elevada percentagem de explorações agrícolas de pequena dimensão – tudo concorrendo para um ainda mais acentuado desequilíbrio da balança comercial de produtos agrícolas e agroalimentares.
Na sequência das Estratégias do Prado ao Prato e da Biodiversidade (i) a consagração de 25% dos solos agrícolas ao modo de produção biológico; (ii) a redução de 20% do uso de adubos inorgânicos (quando Portugal já é o país que na UE menos usa fertilizantes minerais e, por outro lado, onde a fertilização com estrumes e outros corretivos orgânicos enfrenta enormes dificuldades para ser oficialmente autorizada) e o (iii) decréscimo de 50% no uso de produtos fitofarmacêuticos (mesmo que devidamente aprovados pelas entidades oficiais competentes nesta matéria científica), irão concorrer de forma acentuada para o aludido desequilíbrio da balança comercial, não obstante o notório incremento que se tem vindo a verificar nas exportações dos alimentos para cuja produção Portugal dispõe de condições edafo-climáticas adequadas e de empresas dinâmicas.
Ainda no tocante ao modo de produção biológico, será oportuno recordar que apesar dos estímulos que desde há muitos anos vêm sendo atribuídos para a sua expansão, a resposta tem sido tímida, nomeadamente no que respeita à produção de alimentos para consumo direto humano. No setor da produção animal observa-se um crescimento ainda mais anémico no tipo de produção em apreço. Além do mais, quem conhece o comportamento da generalidade dos consumidores portugueses sabe que estes frequentemente orientam as suas compras de alimentos tendo em atenção o respetivo preço, pelo que manifestam maior preferência pelos alimentos produzidos em modo de produção eficiente, conducente a preços competitivos com os dos alimentos importados.
Finalmente e a propósito do já citado desequilíbrio da balança comercial, o acentuar desta assimetria entre importações e exportações irá implicar maior endividamento externo, o que é bastante grave dado que o nosso País (Estado, Empresas, Famílias) já atingiu uma dívida extremamente elevada e que, dado que a economia portuguesa se encontra estagnada desde o início do século XXI, a aludida dívida irá ser paga pelas gerações futuras que em nada contribuíram para a mesma (excepto por aqueles profissionalmente mais qualificados e com mais coragem para se afastarem da Família, que entretanto irão continuar a emigrar).
Engenheiro Agrónomo, Ph. D.
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