A Confederação Nacional da Agricultura (CNA) alertou hoje para a baixa de preços ao produtor, apenas mitigada na última semana, exemplificando que o preço para o consumidor chega a ser o quádruplo do que foi pago aos agricultores.
“O que nós assistimos foi a uma baixa de preços aos produtores, o que é evidente nos hortícolas e nas carnes, que não se refletiu no preço ao consumidor, que até subiu. O que quer dizer que quem está a meio – os intermediários e grande distribuição -, acabam por ganhar mais dinheiro com esta situação”, afirmou Pedro Santos da direção da CNA, em declarações à Lusa.
A diferença entre o preço para o consumidor e o valor pago ao produtor, conforme apontou, fica assim na grande distribuição, que lucra, por exemplo, no caso dos hortícolas 200% e 300%.
“É uma diferença muito grande para produtos que não sofrem qualquer tipo de transformação e são vendidos em frescos”, apontou.
O impacto da pandemia de covid-19 fez-se sentir também em subsetores como a carne e o leite, não só pela diminuição da procura e consequente baixa de preços, mas também pelo aumento dos custos associados aos cereais e a rações.
Este aumento, ao não ser refletido no preço pago aos produtores, traduz-se em “situações financeiras muito difíceis, depois de um ano que já não correu nada bem”, podendo levar “muitos agricultores a desistir de produzir”.
Segundo a CNA, na última semana, estes preços registaram um aumento “ténue”, influenciado pelo aproximar da Páscoa e pelo início do desconfinamento desfasado, que, porém, permanece “muito longe” de valores “justos e compensadores” para os agricultores.
Para os próximos meses a perspetiva é que, com a abertura da restauração, seja parcialmente recuperado o problema do escoamento.
Contudo, em matéria de preços, “olhando para o caminho feito no ano passado, não se perspetiva que haja aumentos significativos”.
Pedro Santos lembrou ainda que a venda direta nos mercados locais, encerrados durante o primeiro confinamento, é um fator importante para o escoamento dos produtos, apelando às autarquias para que seja possível a abertura destes espaços.
Paralelamente, os agricultores reivindicam medidas concretas que colmatem os prejuízos causados, um programa de compra de produtos da agricultura familiar para abastecer as cantinas e um “melhor aproveitamento” dos fundos europeus.
“Propostas não têm faltado à senhora ministra da Agricultura para acudir o setor. Vemos é uma ministra com um discurso muito fácil de milhões de euros. Estamos a falar de medidas normais da PAC [Política Agrícola Comum]. Em termos de medidas extraordinárias tivemos muito pouco”, lamentou o dirigente da CNA.
Para o responsável da confederação, este tipo de discurso acaba por ser prejudicial para a agricultura, uma vez que cria, na opinião pública, “a ideia de que o setor está a ser altamente apoiado, o que não acontece”.
No entanto, Pedro Santos reconheceu existir abertura do Ministério da Agricultura para ouvir o setor, situação que diz não acontecer no caso do Ministério do Ambiente, que tem a tutela das florestas.
Já no que se refere ao Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), os agricultores defendem que é “muito modesto” e que não apresenta uma “resposta imediata aos problemas”, situação que esperam ver colmatada por via do Programa de Desenvolvimento Rural (PDR).
Uma das principais reivindicações da CNA é também a concretização do Estatuto da Agricultura Familiar, dependente de cerca de nove ministérios, tendo, por isso, apelado à intervenção do primeiro-ministro, António Costa.
“O setor agrícola, felizmente, nunca parou e os agricultores estiveram cá para responder às principais necessidades do país, com o fornecimento de alimentos. Estiveram sempre na primeira linha de combate a esta crise que todos atravessamos”, vincou.