Sistemas agroflorestais desenvolvem o interior

Na Quinta da Póvoa, em Torres Vedras, a nova plantação de eucalipto cresce em equilíbrio com vinhas e pomares seculares de pera rocha.

A agrofloresta está a abrir novos caminhos no Interior, juntando a produção florestal a outros tipos de agricultura. Na Quinta da Póvoa, em Torres Vedras, os velhos pomares de pereiras geram um destilado de pera rocha – o premiado Old Nosey – num mosaico que inclui vinhas e um eucaliptal sustentável que já permitiu recuperar o solo e proteger as outras culturas de pragas e doenças.

O avô de Miguel Vasconcelos Guisado foi pioneiro na cultura do eucalipto na região de Torres Vedras, ao plantar os primeiros eucaliptos na serra do Socorro. Quando o neto decidiu substituir eucaliptais com 60 anos, não hesitou em ser também pioneiro: um dos terrenos foi reconvertido em vinha de sequeiro e, nas encostas onde as tropas de Wellington vigiaram o invasor francês, nasceu um novo eucaliptal, mais sustentável. A inspiração para tudo isto surgiu de outros dos componentes da Quinta da Póvoa: os seculares pomares de pereiras.

“Antigamente, alguns dos pomares tradicionais estavam no meio de vinhas e outros isolados, mas instalados de uma forma que pretendia a não mobilização vertical e algum pastoreio de animais. Técnicas que hoje são recuperadas”, explica à “Produtores Florestais” Miguel Vasconcelos Guisado, que vê a vinha plantada em 2016 a produzir 15 toneladas por hectare.

Um clone adequado e pH equilibrado

O produtor assegura que a substituição do eucalipto por vinha não implicou cuidados especiais. “Incorporámos matéria orgânica, fizemos a preparação do terreno – sem terraplanagens ou operações que pudessem danificar o solo –, uma boa drenagem e instalámos a vinha. Houve um intervalo em que fizemos uma cultura de aveia para limpar o terreno, mas é uma prática normal”, recorda.

“O eucaliptal faz uma barreira junto dos pomares e das vinhas e permite criar uma faixa tampão à entrada de pragas e doenças”, explica Miguel Vasconcelos Guisado, da Quinta da Póvoa.

A plantação do novo eucaliptal seguiu a mesma filosofia. “Nessa zona da propriedade, os solos são como uma manta de retalhos. Numa mancha com dois hectares que tinha um pH muito elevado, nefasto à introdução de eucaliptos, além de escolher um clone mais adequado, optei pela não mobilização, e instalei o eucaliptal como se fosse uma vinha ou um pomar dos antigos”, recorda. O controlo do coberto vegetal passou a ser feito com corta mato ou, como aconteceu este ano, com recurso às vacas de um produtor vizinho.

Controlo biológico natural

A experiência não podia ter corrido melhor. “Como não houve lixiviação nem mobilização, consegui criar um microclima e o pH acabou por suavizar. Neste momento temos um equilíbrio no solo muito mais interessante e os eucaliptos estão a crescer muito bem”, assume Miguel Vasconcelos Guisado, para quem, em silvicultura, não há “espécies más”.

“Naquele sítio, o eucaliptal faz uma barreira junto dos pomares e das vinhas e permite criar uma faixa tampão à entrada de pragas e doenças. Na vinha mais antiga que tenho, que é de 2015, nunca apliquei inseticida, porque na quinta há um microclima, morcegos e pássaros que se abrigam nas árvores centenárias que rodeiam os pomares e no próprio eucaliptal. É um controlo biológico que me permite uma poupança enorme, além do bem ambiental”, diz.

Para este equilíbrio contribui ainda o apiário, localizado dentro do eucaliptal, onde existem ainda algumas árvores antigas.

O artigo foi publicado originalmente em Produtores Florestais.


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