Perderam-se “irremediavelmente” soutos para o cancro do castanheiro

O cancro do castanheiro é um problema “grave” nalgumas zonas do país. E “já se perderam irremediavelmente” alguns soutos, alerta uma investigadora do INIAV. A esperança vem agora da “gente jovem”, que está a “instalar novas plantações”. A FAO declarou 2020 o Ano Internacional da Fitossanidade.

Aquilino Ribeiro, que nasceu no Carregal de Tabosa, concelho de Sernancelhe, terra abundante em castanheiros com honras de denominação de origem protegida (DOP), chamou a esta árvore de crescimento lento e de soberba longevidade (pode atingir 1500 anos de vida), “o rei da vegetação lusitana” e “o derradeiro gigante da nossa flora”.

É, porém, uma espécie arbórea que vem sendo castigada pelas doenças. Entre elas, o cancro, desde o final dos anos 80 do século passado. O seu agente causal é o fungo Cryphonectria parasítica.

“Nos anos 90 ainda se supunha que a doença estava circunscrita ao nordeste do país”, mas, no início da década 2000, no âmbito de alguns projectos nacionais na ainda Estação Florestal Nacional, hoje integrada no INIAV – Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV), foi possível “concluir que a doença já estava presente em todo o país”, conta ao PÚBLICO Helena Bragança, investigadora do Instituto.

Ao mesmo tempo, “detectámos cicatrização natural e provámos a presença de estirpes hipovirulentas do fungo, o que foi uma boa notícia”, prossegue a investigadora. Esse trabalho, diz, “também permitiu fazer um mapeamento da diversidade genética do fungo em Portugal e do seu modo de reprodução”. Um mapeamento que é, aliás, “ainda hoje, a informação mais abrangente e disponível para escolher as zonas que têm boas condições para fazer luta biológica”.

Apesar do esforço desenvolvido no combate à doença, “nalgumas zonas, a situação do cancro é grave, principalmente quando há cancro e tinta em simultâneo”. Helena Bragança constata que “já se perderam irremediavelmente soutos”, o que ela própria constatou “nalgumas zonas que foram reavaliadas agora no âmbito do projecto Biochestnut”. É o caso da Serra de S. Mamede, no Alto Alentejo, embora haja aí “uma população muito envelhecida e, como esta é uma doença de evolução relativamente lenta, enquanto as árvores forem tendo alguns ramos vivos, as pessoas vão tirando castanha sem fazerem grandes investimentos”, comenta a investigadora do INIAV.

“Ameaça à própria sobrevivência humana”

Se um castanheiro apresentar ramos secos na copa, fendilhamento longitudinal da casca, pequenas pústulas alaranjadas ou castanho-avermelhadas no tronco e nos ramos ou manchas de cor branco-amarelada em forma de leque sob a casca, é mau sinal. A árvore pode estar infectada pelo cancro. O fungo infecta o castanheiro através de uma qualquer ferida no lenho, provocada por cortes de poda ou através da enxertia. E os esporos são facilmente transportados pelo vento, pela chuva e, até, por insectos.

“Num tempo em que tanto se fala de como os agentes de doença podem ser tão devastadores e rápidos a dispersarem-se pelo mundo, poucos têm consciência de que com as doenças das plantas se passa algo muito semelhante”, alerta Helena Bragança. Refere mesmo que “as doenças das plantas são uma ameaça à própria sobrevivência humana”, já que, “sem plantas, não vivemos”.

Ora, “a frequência com que são detectados todos os dias novos agentes fitopatogénicos é muito preocupante”. A investigadora do INIAV não tem dúvidas de que “a globalização e os desequilíbrios ecológicos, eventualmente acelerados pelas alterações climáticas”, são “as causas mais prováveis para o aparecimento de novos focos de doença”.

E, na maior parte dos casos, “não há cura possível”, diz Helena Bragança.

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