Subida da cotação das matérias-primas agrícolas nos mercados, por causa da pandemia, gera alertas.
O risco de a crise de saúde se transformar numa crise alimentar é real. A subida dos preços de bens alimentares nos mercados de capitais tem gerado alertas. Essa é a conclusão da gestora de fundos Sixty Degrees que “considera que os efeitos nefastos da pandemia, ao nível das cadeias de produção e oferta dos produtos alimentares, podem ser suficientemente gravosos e prolongados para desencadear uma nova e grande crise no setor global de alimentos”. Segundo a gestora de fundos, “é expectável que, nos próximos três anos, venhamos a assistir a subidas mais acentuadas das cotações das commodities agrícolas, criando, por um lado, um novo episódio de estagflação (como nos anos 70) e, por outro, uma excelente oportunidade de investimento”.
São vários os fatores que contribuem para esta conclusão. A Sitxty Degrees alerta, numa análise recente, para o facto de uma elevada proporção dos stocks mundiais de cereais estar “localizada num reduzido número de países, nomeadamente na China e na Índia”. “Assim sendo, apesar dos níveis elevados de stocks mundiais de cereais, em termos absolutos, a situação atual é vulnerável no sentido em que potenciais disrupções das cadeias de oferta poderão comprometer o abastecimento generalizado dada a dependência de um reduzido número de países”. A análise destaca ainda que “uma elevada concentração de exportadores torna os mercados mais sensíveis a eventuais restrições logísticas ou intervenções em matéria de protecionismo comercial, dificultando o acesso a alimentos por parte dos importadores”. Depois, “o mercado laboral está a ser afetado pelas restrições de mobilidade, especialmente no que se refere à força de trabalho emigrante e pelos impactos diretos da covid-19, em termos de saúde dos trabalhadores”. Além disso, “o transporte marítimo de contentores e o transporte rodoviário já estão a ser prejudicados”.
A gestora avisa que “os mercados de crédito também podem tornar-se noutro canal de transmissão desta crise, afetando de forma adversa a agricultura de capital intensivo e os seus níveis de produtividade”.
Na análise da gestora, “a espelhar todos os constrangimentos atrás referidos, bem como o aumento da incerteza no mercado global de alimentos, os preços das commodities agrícolas têm vindo a registar uma recuperação consistente”. E cita dados do último Food Outlook, publicado pela Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO), que aponta que o FAO Food Price Index, em dezembro passado, subiu 2,2% em base mensal e 3,1% em termos anuais. “O valor de dezembro corresponde ao máximo dos últimos três anos e representou o sétimo aumento mensal consecutivo”. No entanto, o valor do índice ainda se encontra cerca de 25% abaixo do seu máximo histórico de 131,9, atingido em 2011. Há ainda a somar o facto de os bancos centrais estarem a contribuir para estes aumentos de preços. A excessiva liquidez existente nos mercados faz com que os investidores procurem ativos onde investir, o que faz disparar os preços. A agenda europeia de aposta na agricultura sustentável pode também agravar a situação.