José Martino

Faço votos que não seja desta! – José Martino

O Sr. Presidente da direção da ANPOC – Associação Nacional de Produtores de Proteaginosas, Oleaginosas e Cereais, José Palha, assina um artigo aqui publicado no Agroportal no dia 8 de dezembro último, com o título “Será que é desta?” onde compara coisas e processos que não se esperava que acontecessem, e.g. a falha nas redes sociais por algumas horas, à falta de componentes para a industria automóvel e a falta de fabrico de folhas de papel, assim como, a subida de preços de matérias-primas e energia, com a pouca produção de cereais em Portugal, neste caso, acenando com o “papão” da eventual falta de cereais para a alimentação dos portugueses.

Este artigo bem como, outros e peças jornalísticas, promovidos e incentivadas por esta Associação e este lóbi dos cereais, querem fazer crer aos portugueses que este seu argumento é verdadeiro, pode haver falta de abastecimento de cereais por não haver produção em Portugal e desta forma, colocarem os portugueses a pressionarem o governo para subsidiar a produção desta fileira de modo artificial, ao arrepio da sua sustentabilidade natural.

Portugal apesar de produzir poucos cereais, falta de aptidão de solos e climas (no Alqueva os agricultores alentejanos podiam ter feito cereais de regadio, não o fizeram, preferiram a fruticultura (amendoal) e olival), não tem e não terá falta de cereais para alimentação da população porque está integrado na União Europeia e esta garante o aprovisionamento de alimentos, cereais à cabeça, para os seus nacionais, tal como o fez com o abastecimento de vacinas para a COVID19.

Quem se movimenta nos “mentideiros” do Ministério da Agricultura (MA) sabe que desde há alguns anos se fala da existência de compromissos entre os governos do PS, o anterior e este que está em fim de mandato, subsídios para a fileira dos cereais (na minha opinião, parece-me que há também compromisso da Macroestrutura do MA).
Do ponto de vista público este processo iniciou-se com a elaboração por parte do MA da Estratégia Nacional para a Promoção da Cultura dos Cereais, no ano de 2018, tendo como objetivo justificar a alocação de meios financeiros públicos a esta fileira dos cereais.
Parece ter existido uma “zanga de comadres” quando a atual ministra da agricultura, Maria do Céu Antunes, não colocou os apoios aos cereais no pacote das ajudas de transição 2022-2023, mas afinal parece ser um “arrufo momentâneo”, uma estratégia para que o subsídio que agora aparece previsto no documento do PEPAC, ajudas financeiras da agricultura 2023-2027, sujeito a consulta pública até 6 dezembro último, seja visto como natural (cito o artigo do presidente da ANPOC: “A tutela tem ido exatamente em sentido contrário ao da resolução do problema, mas, e tanto quanto sabemos, no novo PEPAC a situação finalmente será corrigida, assim esperamos…!”

Factos:

  • Portugal tem um défice alimentar estrutural à volta de 3600 M€ por ano que não se sabe quando será eliminado;
  • Pelo menos 20% dos portugueses estão em risco potencial de pobreza e o Estado Social não os pode ajudar pela deficiente criação de riqueza no país;
  • Portugal tem um défice estrutural de jovens agricultores, 4,2% face ao número total de agricultores, enquanto a média nos países da União Europeia é de 11%. A maioria dos agricultores de Portugal tem mais de 50 anos;
  • O relatório do PDR2020 relativo ao ano de 2020 informa que paticamente um em cada cinco projetos de 1.ª instalação de jovens agricultores, candidaturas aprovadas, não são financiadas por falta de orçamento (2495 candidaturas em 11399 (21,9%) segundo o descrito no texto do relatório a páginas 145 a 147);
  • A hortifruticultura contribuiu no ano de 2020 com 1683 M€ para as exportações, um aumento de 4,4% face a 2019, mesmo com a pandemia do COVID19.

Deixo aos leitores as seguintes questões para reflexão e retirarem as suas auto-conclusões sobre as ajudas ao lóbi da fileira dos cereais:

  1. O que explica que o MA só tenha elaborado um documento estratégico para os cereais, para na melhor das hipóteses chegar aos 35% das necessidades, e não o tenha feito para outras fileiras mais sustentáveis em Portugal, e.g. hortofrutícolas, vinha, etc. fileiras estas que poderiam eliminar o défice alimentar em valor, dentro de poucos anos?
  2. O leitor se tivesse investido com a capacidade de decisão onde alocar as ajudas financeiras públicas da União Europeia e Estado Português, teria como prioridade a fileira dos cereais com os factos indicados acima e na questão 1. ou a fileira dos produtos mediterrânicos onde Portugal tem excelentes solos e climas para produzir, exportar e poder usar esse excedente em valor para adquirir cereais no mercado internacional no âmbito da UE aos países onde a produção é mais barata que em Portugal?

Para mim, espero que não sejam desta vez que os cereais sejam apoiados em detrimento dos jovens agricultores e dos hortofrutícolas!

José Martino

Cidadão, Lutador pelo Desenvolvimento de Portugal

Artigo em resposta ao artigo de opinião “Será que é desta?” de José Palha, publicado no Agroportal no dia 8 de dezembro.

Parabéns, Sra. Ministra da Agricultura – José Martino


Publicado

em

,

por

Etiquetas: