O Ministério Público (MP) defendeu hoje a condenação a prisão efetiva, superior a cinco anos, do comandante dos Bombeiros Voluntários de Pedrógão Grande, Augusto Arnaut, no processo sobre os incêndios de junho de 2017, após os quais foram contabilizados 63 mortos e 44 feridos quiseram procedimento criminal.
“[Augusto Arnaut] Deve ser condenado pelos crimes de que foi pronunciado numa pena de prisão efetiva, superior a cinco anos, atendendo à culpa e às elevadas necessidades de prevenção geral e especial que se fazem sentir”, afirmou a procuradora da República Ana Mexia, nas alegações finais do julgamento, no Tribunal Judicial de Leiria.
Augusto Arnaut está a ser julgado por 63 crimes de homicídio e 44 de ofensa à integridade física, 12 dos quais graves, todos por negligência.
A magistrada do Ministério Público considerou “errada” a avaliação de Augusto Arnaut sobre o incêndio que deflagrou em Regadas, que deveria ter sido “considerado uma ocorrência, autónoma” e que a “autonomização do combate” lhe “daria outra relevância e proporcionaria mais meios”.
Nas alegações, a procuradora afirmou que o arguido assentou “a sua estratégia em pressupostos que se vieram a revelar errados”, vincando por diversas vezes que o mesmo deveria ter solicitado o ‘Arome’ (um instrumento de previsão meteorológica específico para um local), o que possibilitaria “definir outras medidas a tomar”.
Citando vários testemunhos em sede de julgamento e os relatórios efetuados pela Comissão Técnica Independente e pelo Centro de Estudos sobre Incêndios Florestais, a magistrada salientou que “eram diminutas as perspetivas de dominar rapidamente o incêndio”, pelo que medidas de proteção civil como a retirada de pessoas das localidades ou o corte de estradas “deveria ter sido equacionado logo às 18:00”.
Depois disso, acrescentou, as indicações deveriam ter sido no sentido de que as pessoas “se mantivessem em casa”.
Por outro lado, ao não avaliar convenientemente as condições climatéricas, em especial o comportamento do vento, desconsiderou o flanco direito do incêndio de Escalos Fundeiros, as suas projeções e o efeito do encontro deste com o de Regadas.
Aludindo a um relatório da Polícia Judiciária, anexo aos autos, defendeu que “havia rede” de comunicações na zona afetada pelos incêndios e que o comandante de operações de socorro poderia ter “desencadeado mecanismos de informação à população”, através das redes sociais e rádios locais, por forma a veicular conselhos para “diminuir o risco existente”.
Considerando que devem ser dados como provados, entre outros pontos, que face ao crescimento do incêndio o arguido não promoveu o corte de vias onde ocorreram vítimas mortais, nomeadamente a Estrada Nacional 236-1, e não efetuou uma avaliação eficaz da situação existente, a procuradora entendeu que Augusto Arnaut “não promoveu as ações de proteção civil que se justificavam”, devendo por isso “ser condenado”.
O MP, nesta parte subscrita pelo juiz de instrução criminal, atribui a Augusto Arnaut, enquanto comandante das operações de socorro, responsabilidades pelo atraso na montagem do posto de comando operacional, por não ter pedido mais meios ou por não ter informado cabalmente o Comando Distrital de Operações de Socorro de Leiria sobre a evolução do incêndio.
O comandante omitiu “procedimentos e deveres obrigatórios e elementares em razão das funções que exercia e cuja obrigatoriedade conhecia, que era capaz de adotar e cumprir, devendo tê-lo feito para evitar um resultado que podia e devia prever”, a morte de pessoas e ferimentos noutras.