A advogada do comandante dos Bombeiros de Pedrógão Grande disse hoje que foi uma “absoluta surpresa” o pedido do Ministério Público para que aquele seja condenado a prisão superior a cinco anos devido aos incêndios de 2017 no concelho.
“Só vos posso transmitir a minha absoluta surpresa. Isto é, a sensação que tenho hoje é de que não estive no mesmo julgamento que a senhora procuradora”, afirmou Filomena Girão aos jornalistas, à saída do Tribunal Judicial de Leiria, onde hoje começaram as alegações finais.
O Ministério Público (MP) defendeu a condenação a prisão efetiva, superior a cinco anos, do comandante dos Bombeiros Voluntários de Pedrógão Grande, Augusto Arnaut, no processo sobre os incêndios de junho de 2017, após os quais foram contabilizados 63 mortos e 44 feridos quiseram procedimento criminal.
“[Augusto Arnaut] Deve ser condenado pelos crimes de que foi pronunciado numa pena de prisão efetiva, superior a cinco anos, atendendo à culpa e às elevadas necessidades de prevenção geral e especial que se fazem sentir”, afirmou a procuradora da República Ana Mexia, nas alegações finais do julgamento, no Tribunal Judicial de Leiria.
O arguido está a ser julgado por 63 crimes de homicídio e 44 de ofensa à integridade física, 12 dos quais graves, todos por negligência.
A mandatária do comandante referiu que a fundamentação do pedido da procuradora da República Ana Mexia ignorou “uma quantidade de testemunhos fulcrais dos operacionais, do Comando Nacional da ANEPC [Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil], da senhora ministra da tutela à época [Constança Urbano de Sousa], todos eles dizendo, de uma forma simplificada (…), que o senhor comandante não tinha meios, fez tudo o que podia, não podia ter feito mais do que fez”.
Quanto às imputações relacionadas com o facto de o seu constituinte não ter pedido atempadamente o Arome, uma previsão meteorológica específica para um local, a causídica respondeu que “a prova valorizada nesse ponto” foi o relatório da Comissão Técnica Independente (CTI).
“Ouvimos os membros do CTI falar aqui sobre esse assunto e todos eles disseram muito mais e diferente do que está escrito no relatório. E, portanto, a esse propósito, devo ainda realçar que a CTI não tem climatologistas”, declarou, sustentando que “o modelo não é fiável”.
Filomena Girão frisou ainda que, em sede de julgamento, testemunharam climatologistas, como outros operacionais, que “disseram ‘olhando para aquele Arome não era previsível o que veio acontecer’”, facto que “não é possível ignorar”.
À pergunta se considera que no julgamento se está a tentar encontrar no comandante um bode expiatório, Filomena Girão anuiu: “Há um ‘ditote’ popular que diz isto muito bem, que fala de moluscos. O comandante Arnaut é aqui o mexilhão”.
A CTI foi criada pela Assembleia da República na sequência dos incêndios florestais ocorridos nos concelhos de Pedrógão Grande, Castanheira de Pera, Ansião, Alvaiázere, Figueiró dos Vinhos, Arganil, Góis, Penela, Pampilhosa da Serra, Oleiros e Sertã de 17 a 24 de junho de 2017. A sua missão foi fazer uma avaliação independente sobre estes fogos.
Em julgamento estão 11 arguidos. Além de Augusto Arnaut, então responsável pelas operações de socorro, foram pronunciados dois funcionários da antiga EDP Distribuição (atual E-REDES) e três da Ascendi, e os ex-presidentes das Câmaras de Castanheira de Pera e de Pedrógão Grande, Fernando Lopes e Valdemar Alves, respetivamente.
O presidente da Câmara de Figueiró dos Vinhos, Jorge Abreu, também foi acusado, assim como o antigo vice-presidente da Câmara de Pedrógão Grande José Graça e a então responsável pelo Gabinete Florestal deste município, Margarida Gonçalves.
Pedrógão Grande: MP defende prisão superior a cinco anos para comandante dos bombeiros