A Floresta Privada na Região Centro – Raquel Onofre

O estado de abandono do pinhal português merece especial atenção de todos aqueles que se preocupam com a floresta portuguesa. A floresta na região Centro de Portugal representa 39,5% da superfície florestal da região e 27% do total nacional, sendo constituída em 80% por espécies madeireiras (maioritariamente eucalipto e pinheiro bravo). Possui mais de 200 mil explorações, o que corresponde a 58,6% do total nacional.

Segundo o INE, 56% da floresta portuguesa encontra-se em explorações agrícolas com superfícies florestais. A elevada pulverização da propriedade, de muito pequena dimensão, a ausência de registos na matriz predial, o desconhecimento dos limites da propriedade por parte dos proprietários, a idade avançada dos proprietários e o baixo nível de formação profissional e educacional, a inexistência de organizações profissionais e económicas, a inexistência de serviços de assistência técnica e de formação, os efeitos dos incêndios florestais, constituem graves restrições ao nível da gestão e da exploração florestal. Por outro lado, a indústria de pinho em particular não tem exercido pressão sobre a produção no sentido de receber madeira com melhor qualidade, dado não estar disposta a pagar por essa mais valia. Desta situação resulta a não intervenção por parte dos proprietários, uma vez que as operações silvícolas, nomeadamente as limpezas, desramações e desbastes são dispendiosas, nunca sendo economicamente compensadas. Por outro lado, os comerciantes de madeira escolhem as árvores a abater junto dos proprietários, que querem fazer um negócio rápido sem grande envolvimento pessoal. Essa selecção é feita de forma a retirar os melhores exemplares para satisfazer as exigências da indústria madeireira, deixando no solo as árvores com pior conformação. A qualidade dos povoamentos florestais tende assim a decrescer, bem como a produtividade e rendimento expectável das referidas áreas.

A fraca representação dos produtores nesta região está intimamente relacionada com as relações desprovidas de carácter profissional entre estes e os intermediários e indústria. A organização da produção é fundamental desde o elo mais simples – o interesse do produtor pela sua propriedade florestal advém dos rendimentos que este possa auferir. O fraco rendimento oriundo da floresta, e consequente desinteresse são aspectos, entre outros, que contribuem fortemente para a ocorrência de incêndios em área de pinhal.

Urge um planeamento cuidado do pinhal, de modo a podermos desfrutar da sua existência nesta região, num futuro não muito longínquo. A organização da produção é fundamental no rendimento dos produtores, e na ausência de rendimento é impossível falar em gestão. Através do incremento do associativismo na região, é possível fortalecer os laços entre a produção e a propriedade, através da prestação de serviços com maior impacto no rendimento dos proprietários, na defesa da floresta contra os incêndios, na formação profissional e na divulgação de informação. A actividade das associações de produtores deve estar perfeitamente adaptada às necessidades específicas dos produtores.

Tem sido analisada de perto uma resposta ao elevado fraccionamento da propriedade: a gestão de áreas agrupadas no concelho da Covilhã da responsabilidade da Associação de Produtores Florestais do Paúl, associada da Federação dos Produtores Florestais de Portugal – Conselho Nacional da Floresta. A gestão de áreas agrupadas consiste na gestão por parte da associação de produtores de uma área razoável constituída por terras de diferentes proprietários, obrigando assim ao emparcelamento, permitindo artificialmente superar os graves problemas fundiários. As maiores dificuldades na sua implementação devem-se quer à ausência de registos de propriedade e desconhecimento dos limites da mesma, quer à desconfiança dos proprietários que receiam perder o direito de propriedade.

No caso do Paúl, a estas dificuldades naturais acrescem a descrença por parte dos proprietários de que a floresta seja um meio real de auferir rendimento, o bloqueio da administração pública em viabilizar subsídios há muito aprovadas apesar do reconhecimento geral sobre o valor do trabalho realizado por esta associação e ainda alguns conflitos de interesses com propriedades de uma empresa de celulose nacional.

O trabalho realizado pela Associação dos produtores Florestais do Paúl abrange a arborização de mais de 40.000 ha em termos globais, em projectos que são modelo de profissionalismo e de muita dedicação. Foram utilizados na florestação 48.465 Castanheiros, 77.396 Cerejeiras bravas, 4.502 Nogueiras, 17.823 Freixos, 43.250 Carvalhos americanos, 34.000 Cedros atlântica, 42.250 Pinheiros negros, 11.625 Ciprestes, 1.491.343 Pinheiros bravos, 1000 Pinheiro silvestre, 2000 Pseudotsugas, 3150 Carvalhos negral, 3700 Bétulas, 2000 Carvalhos roble e 1000 Bordo negundo, totalizando 1.786.504 árvores. Para além destas medidas de florestação, foram construídos 46,23 km de rede viária e beneficiados 68,70 km, aspecto fundamental na prevenção e combate aos incêndios florestais.

A actividade desta associação está presentemente muito ameaçada, subsistindo apenas devido à persistência e trabalho do seu presidente. Não andarão os responsáveis da administração um pouco desatentos?

Raquel Onofre
Eng.ª Florestal
Técnica da Federação dos Produtores Florestais de Portugal


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