Apareceu, finalmente, o esperado relatório que a Comissão Europeia se comprometeu a fazer sobre a especificidade da agricultura portuguesa!
O compromisso da elaboração deste relatório foi apresentado como “grande conquista” na última cimeira, pelo primeiro ministro e pelo governo português ….
Pode-se dizer, agora, que a montanha pariu m rato e que, ainda por cima, esse rato é defeituoso.
Senão, vejamos:
1 – O QUE DIZ ESTE RELATÓRIO ?
Que a dimensão média das explorações portuguesas é metade da média da União Europeia;
Que o peso da agricultura portuguesa no PIB baixou de 5,3 para 2,4%;
Que há muita Mão-de-Obra e muito sub-emprego na nossa agricultura e que 90% da força de trabalho agrícola é de origem familiar;
Que 65% dos trabalhadores agrícolas têm mais de 55 anos e que só 1% recebeu formação profissional completa;
Que a produtividade agrícola por Unidade de Trabalho é apenas 23% da média europeia e que o Rendimento por UTA é no Alentejo mais de 4 vezes superior ao do Algarve;
Que passados quase 20 anos a agricultura portuguesa está na mesma ou pior do que quando entramos para a CEE apesar de terem vindo centenas de milhões de euros para nos apoiar;
Que o nosso futuro está no Vinho, Azeite, Frutas e Legumes;
Que os 60.000 Ha concedidos a Portugal, em 1999, para a produção de “Milho” ainda estão por utilizar;
Que uma “quota exclusiva” de 100.000 direitos para Bovinos à troca de reconversão de 200.000 Ha de terras ocupadas com Cereais, desde 1999 e prorrogada até 2005 não foi praticamente utilizada;
Que por tudo isto, Portugal não deveria exigir mais Quotas e Direitos de Produção.
BELO RELATÓRIO !!!
O que esta obra-prima de demagogia não explica nem analisa (e deveria explicar e analisar) é que:
Somos um País onde predomina o minifúndio e a agricultura familiar, onde as principais culturas não são apoiadas pela PAC (2/3 da nossa produção agrícola não tem qualquer apoio aos agricultores – Uva, Fruta, Batata, Hortícolas, Suinicultura e Leite);
Que o fraco peso da Agricultura no PIB se deve entre outras coisas à baixa de preços à produção (e isso é fruto de uma PAC errada e subordinada aos interesses do GATT/OMC, de Reformas e Revisões da Pac’s)
Basta lembrar quanto valia um quilo de Milho, de Centeio, de Cevada ou de Trigo em 1986 e quanto vale agora !!!
Basta recordar a estagnação dos preços do Leite e da Batata !!!
E convém não esquecer que é da responsabilidade da Política Agrícola Comum ficarem em Portugal anualmente 82.000 hectares sem produzir (ainda por cima com um prémio de 10 milhões de euros) por vias do Set-aside (pousio obrigatório e/ou voluntário).
Isto é, somos acusados pela Comissão de coisas que ela própria nos impôs e obrigou a fazer !!!
Que o envelhecimento da população agrícola também é da responsabilidade da “PAC da Comissão” ao não dar condições e rendimentos dignos e compensadores do trabalho na agricultura e manter os jovens numa incerteza e descrença quanto ao futuro desta PAC e da Agricultura …
Que a pouca Formação Profissional na Agricultura se deve a políticas erradas (que privilegiam a Formação Profissional nos outros Sectores – é uma forma de mascarar o emprego/ /desemprego) e também a que os Agricultores Portugueses, com as baixas condições e o muito trabalho que têm nas suas explorações, não se podem “dar ao luxo” de se ausentarem prolongadamente para um Centro de Formação.
É que o gado tem de ser tratado, a fruta colhida, as vacas ordenhadas, o cereal debulhado, a palha enfardada, a erva e o milho ensilados, a vindima feita , o batatal curado e as regas têm que se fazer …
E NÃO TÊM CRIADOS que façam o trabalho por eles (e por elas) !!!
O que este Relatório não explica é que as baixas produtividades e rendimentos por Unidade de Trabalho se devem, no nosso País, entre outras coisas, a:
– Áreas médias/por exploração muito inferiores à média europeia;
– Mão-de-Obra na agricultura superior aos outros E.M.;
– Falta de apoios às culturas mediterânicas;
– Solos e Climas que não podemos mudar;
– Baixas de preços à produção;
– Preços artificiais que não compensam o custo de produção e o trabalho dos agricultores.
ENTÃO OS AGRICULTORES PORTUGUESES SÃO UNS MANDRIÕES E PREGUIÇOSOS?
ENTÃO OS AGRICULTORES PORTUGUESES NÃO SABEM TRABALHAR?
ENTÃO A POLÍTICA AGRÍCOLA COMUM NÃO TEM AQUI QUOTA PARTE DA CULPA?
O que este Relatório não explica é que os 60.000 hectares de Regadio/”Milho” “oferecidos como brinde” em 1999 o foram à troca de 60.000 hectares de Sequeiro e com ajudas directas iguais às do Sequeiro …
O que este Relatório não explica é que a troca de 200.000 hectares de culturas de Sequeiro por 100.000 direitos de Bovinos tinham e têm destinatários específicos que NÃO SÃO AGRICULTORES FAMILIARES !!!
HÁ, EM TUDO ISTO, MUITAS CULPAS DOS SUCESSIVOS GOVERNOS QUE TIVEMOS.
MAS HÁ, TAMBÉM, MUITAS E MUITAS CULPAS DAS POLÍTICAS AGRÍCOLAS COMUNS DA UNIÃO EUROPEIA.
E A COMISSÃO EUROPEIA NÃO PODE LAVAR AS MÃOS, COMO “PILATOS” POIS TODOS SABEMOS QUE NA PRÁTICA, É ELA QUE “PÕE E DISPÕE” EM MATÉRIA DE POLÍTICA AGRÍCOLA.
2 – O QUE É QUE ESTE RELATÓRIO DEVERIA DIZER ?
Na mesma Fonte de Informação onde a Comissão se baseou para o “libelo acusatório” à Agricultura Portuguesa, também estão dados que permitiriam à Comissão dizer e explicar, no Relatório:
Que cada hectare de Superfície Agrícola portuguesa recebe, em média, de Ajudas Directas, 1/3 do que recebe cada hectare na Grécia;
Que cada exploração agrícola portuguesa recebe, em média, 39% do que se recebe em Espanha, 27% da Bélgica e somente 15% do que cada exploração em França;
Que cada Unidade de Trabalho Agrícola recebe em Portugal, das mesmas Ajudas Directas, 28% dos Gregos, 21% dos Espanhóis, 11% dos Franceses e 9% do que recebem os Irlandeses.
PORQUE É QUE ISTO ACONTECE É O QUE A COMISSÃO EUROPEIA DEVERIA EXPLIXAR NO SEU RELATÓRIO !!!
MAS, MAIS IMPORTANTE DO QUE RELATAR O QUE SE PASSA E PORQUE DE PASSA, O QUE A COMISSÃO DEVERIA DIZER É QUE, SENDO A AGRICULTURA PORTUGUESA UM CASO ESPECÍFICO, QUE MEDIDAS CONCRETAS PROPÕE PARA REPARAR INJUSTIÇAS, DESIGUALDADES E ASSIMETRIAS !!!
– Porque os Agricultores Portugueses, estando de acordo com a importância e o reforço do Desenvolvimento Rural, também precisam :
Produzir mais para diminuir o déficit da nossa Balança Comercial Agrícola, que já vai em mais de 3 mil milhões de euros (600 milhões de contos) por ano.
Produzir melhor (e para isso teremos que ter apoios para modernizar, reconverter, aumentar o regadio)
Mais apoios para as nossas principais culturas (Uva, Frutas, Hortícolas, Batata, Azeite, etc.)
– Porque a solução não passa pelo Desligar as Ajudas da Produção dado que com isso:
Nós não seremos competitivos;
Ainda se produzirá menos;
Haverá mais desertificação e êxodo rural
Aumentará a nossa dependência agro-alimentar;
Manter-se-ão (e agravar-se-ão ) as desigualdades entre culturas, agricultores, regiões e países.
– Queremos outra PAC
Que apoie de igual modo todos as culturas e actividades;
Que garanta preços justos à produção;
Que imponha uma Modulação efectiva;
Que Imponha o Plafonamento e que as economias daí resultantes sejam para reforçar o Desenvolvimento Rural;
Que permita produzir com Qualidade e Segurança para o consumidor.
– Queremos, também, outras Políticas Agrícolas Nacionais
De apoio ao Regadio;
De apoio ao Emparcelamento;
De apoio à Comercialização;
Com mais e melhor Formação Profissional Agrícola;
Com mais e melhor apoios à Agricultura Familiar.
Roberto Mileu