Em 1992, trinta anos após a criação das primeiras Organizações Comuns de Mercado, concretizou-se finalmente a que, até então, foi a maior de todas as reformas da Política Agrícola Comum (PAC). Não apenas importante pelo significado económico das matérias abrangidas, mas especialmente pelo seu carácter pioneiro. Com ela o velho modelo de sustentação dos rendimentos agrícolas exclusivamente através da política de preços e mercados começou a dar lugar a uma separação crescente entre esta política e uma política de apoio ao rendimento através de ajudas directas, baseadas em critérios objectivos, facilmente mensuráveis e moduláveis, além de mais transparentes.
Com a reforma de 1992 foram criados novos mecanismos de controle da produção e reforçadas as dimensões ambientais, estruturais e florestais da PAC, numa evolução sem precedentes na sua história.
Mas como todas as reformas, também esta iria evidenciar progressivamente sinais de erosão, tendo surgido, neste contexto, a Agenda 2000, que se pretendia que fosse o arrumar da casa para o período 2000 a 2006.
Mas a reforma da PAC da Agenda 2000 acabou por ser uma desilusão na medida em que quase se limitou a reproduzir a reforma de 1992, quando era evidente, mais do que nunca, a necessidade de consolidar uma evolução no sentido de um reequilibrio interno profundo entre as suas componentes sectoriais tradicionais e as novas dimensões territoriais, ambientais, de emprego e de qualidade e segurança alimentar.
A prova da necessidade desta evolução está expressa no amplo consenso que hoje em dia existe a respeito do modelo europeu de agricultura como realidade europeia a preservar a todo o custo. Por razões que têm a ver com o processo decisório não é de esperar uma revolução na UE a respeito da PAC. Mas parece óbvio que a perspectiva multifuncional da agricultura e toda a realidade que o conceito do modelo agrícola europeu encerra não poderá ser apenas invocada para consumo externo a fim de defender a pele nas negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC). Isso seria um contra-senso e uma contradição facilmente desmontada pelos nossos adversários comerciais. Mas como essa contradição entre o discurso político e a realidade que a PAC ainda é existe, impõe-se ultrapassá-la na primeira oportunidade.
Com as negociações da OMC a decorrer pelo menos até 2004 não é previsível que a UE proceda a alterações profundas na sua política agrícola antes dessa data. No entanto, será muito provável que seja iniciado antes dessa data um processo de reforma mais substancial, a concluir antes de 2007.
É neste quadro que o objectivo principal da presente obra se traduz na elaboração de algumas reflexões sobre os futuros contornos de uma nova PAC que o autor acredita venha então e finalmente a transformar-se numa “Política Agrícola e Rural Comum” (PARC), capaz de assegurar a presença da agricultura em todo o território da União Europeia como matriz ordenadora de todo o seu espaço agro-rural. As diferentes dimensões da futura PARC precisarão então de ser integradas de forma coerente. Por exemplo, as políticas de modernização estrutural e de desenvolvimento rural não podem ser o prémio de consolação pelos efeitos distorçores da política de preços e mercados, que em si mesma deve ser financeiramente razoável, e minimizar as desigualdades de tratamento entre produtos, produtores e regiões. Por sua vez, as ajudas permanentes ao rendimento só fazem sentido numa óptica de equidade e coesão, o que significa que não podem continuar a consolidar as assimetrias que a PAC de agora tem perpetuado.
A situação específica de Portugal, especialmente perdedora nesta última reforma, é também analisada no presente livro.
Arlindo Cunha
(Eurodeputado, relator do PE para o dossier Agrícola da OMC)