A Propósito de Equinócio – João Filipe Flores Bugalho

1 – Vai esta Primavera quase um Verão! Vivo na cidade (contrafeito porque, na infância, aprendi a viver no campo) onde ouço todos os dias: Que belo dia! Está tempo de praia! Oxalá que este tempo se mantenha! Então bom fim de semana (subentende-se com muito Sol)…

É assim. Dependesse a chuva de uma decisão citadina, como é o caso da maioria das que hoje mais importam à sociedade, que não voltaria a chover tão cedo!

2 – É assim, nesta questão mas também em muitas outras. Isto é, a população que vive da agricultura tem vindo a decrescer e aumenta aceleradamente o número daqueles que vivem na cidade, sobretudo em actividades de serviços. O número de votantes de mentalidade citadina, mentalidade que era apanágio de Lisboa, do Porto e duas ou três outras urbes mais importantes mas que hoje já se encontra em muitas vilas – o que, eventualmente, também é bom e sinal de progresso – o número maior dos votantes, dizia eu, está hoje longe dos problemas da agricultura e do campo. Logo os políticos têm tendência para querer agradar a estes. Os meios de comunicação tendem a informar como estes sentem ou querem ouvir.

3 – É crescente o número dos que se preocupam com os problemas ambientais. É normal, num pequeno globo com uma população em explosão demográfica. Mas muitos dos problemas que são apresentados publicamente como os de maior relevância, muitas vezes não me parece que o sejam. Confunde-se o essencial e o acessório. Por exemplo, a constituição de parques e áreas protegidas é muitas vezes um simulacro de conservação. Os parques e reservas, mesmo que sejam cientificamente correctos os critérios que levaram à sua constituição – o que é muito discutido com profundidade em inúmeros países do mundo, e certamente muito discutível também em muitas circunstâncias no nosso país – falham inúmeras vezes os objectivos que estiveram na sua origem. Para além de que a resolução de alguns problemas ambientais em “ilhas” não resolve os problemas de fundo. No limite, deveríamos viver num país ordenado no seu todo, onde todos os recursos fossem utilizados sabiamente e de forma sustentada. Mas o ordenamento e o planeamento, ou aquilo a que se dá esse nome, é tantas vezes fruto de tão diversas pressões e interesses!

4 – Muitas das áreas que se pretendem preservar e que hoje se chamam de “naturais” são afinal o produto de actividades humanas. Por vezes de actividades milenárias. O agricultor, o florestal, o pastor, intervieram profundamente no meio e moldaram, tantas vezes com dureza, os espaços que hoje queremos para contemplação!

5 – Só muito recentemente a sociedade tem vindo a reconhecer aos que utilizam a terra esta função de ambientalistas. Há dez anos não se falava tão pouco nas medidas agroambientais, hoje reconhecidas na PAC e através das quais os agricultores são compensados (ainda muito incipientemente) por serviços ambientais que prestam à comunidade. Quantas vezes sem sequer terem a noção de que o estão a fazer.

6 – Equinócio da Primavera. Dia estabelecido, vai para um século, para festejarmos a Árvore. Depois para o consagrarmos como o Dia Mundial das Florestas. Árvores e Florestas que são essenciais para salvaguardar o futuro da humanidade. Dos habitantes deste pequeno globo superpovoado, rodando sem parar em torno do Sol…

7 – Se só dispensarmos à Árvore e à Floresta um só dia, que será de nós? Porque será que a cidade e os políticos, e os meios de comunicação se ocupam tão pouco de um bem tão precioso, tão essencial num país de magros recursos, onde os números provam sobejamente que a actividade florestal pode ser – já o é – uma das molas essenciais do desenvolvimento? Cuja política terá um papel preponderante em diversas facetas desse poliedro complexo dos problemas ambientais, da produção sustentada, da conservação dos recursos e do mundo? É preciso bradá-lo aos quatro ventos…

8 – Equinócio da Primavera, ano 2000. Era da globalização, da comunicação. Era em que há biliões, na sua maioria jovens, a navegar na internet. É preciso colocar aí, nesse espaço aberto e livre de informação, de debate, de construção de uma sociedade diferente, alguns dos temas que referi. Trazer a gestão das árvores, das florestas, dos espaços florestais para esta ribalta. Para que ganhem força e popularidade e os políticos lhes prestem mais atenção.

9 – É preciso trazer para a internet, para a sua primeira linha – e permito-me felicitar por isso a iniciativa da criação deste agroportal – a informação necessária para que a sociedade se aperceba da importância da função do agricultor e do silvicultor na conservação do meio. É preciso que a sociedade entenda que sem agricultores, vivendo uma vida digna e próspera, não será possível conservar os espaços rurais, a que na cidade ouço chamar… naturais.

10 – Assim o tempo mude. Oxalá chova… em breve.

20/03/2000

João Filipe Flores Bugalho
(Eng. Silvicultor, Prof. Convidado do I.S.A.)


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