As autoridades pró-Rússia na região ucraniana de Zaporijia anunciaram hoje o transporte por comboio do primeiro lote de cereais com destino à península da Crimeia, anexada por Moscovo em 2014.
Os cereais foram transferidos da cidade de Melitopol para a Crimeia a bordo de onze carruagens, explicou Yevgueni Balitski, chefe da administração civil-militar de Zaporijia, em declarações à televisão estatal russa.
A Ucrânia tem acusado a Rússia de se apropriar da sua colheita de cereais nas regiões ocupadas no sul do país, Zaporijia e Kherson, para vender a outros países, como a Síria.
Kiev acusa também Moscovo de obstruir as suas exportações, ao bloquear os seus portos no mar Negro.
O conflito em curso desde 24 de fevereiro está a aumentar os preços e representa um sério risco de fome em países que dependem desse mercado, nomeadamente em África e no Médio Oriente.
O Exército russo assumiu o controlo do canal da Crimeia do Norte em Kherson, para fornecer água à árida península após um bloqueio ucraniano de oito anos.
No final de abril, a água do rio Dnieper regressou às terras da Crimeia, onde agora podem ser cultivados cereais com o ‘selo de qualidade’ da Ucrânia.
O ministro da Defesa russo, Serguei Shoigu, também anunciou hoje a abertura da comunicação rodoviária entre o território russo e a Crimeia através do corredor terrestre que atravessa o Donbass e as regiões de Kherson e Zaporijia.
Na quarta-feira, o chefe da diplomacia russa, Serguei Lavrov, estará em Ancara para discutir com o homólogo turco, Mevlut Cavusoglu, um que permita a exportação de trigo e alimentos dos portos ucranianos.
Sobre este tema, a Turquia confirmou na terça-feira que foram feitos progressos significativos nas negociações com a Rússia e Ucrânia.
A visita de Lavrov deverá servir para finalizar os mecanismos, que incluem a desminagem do porto de Odessa (mar Negro) e outras áreas da costa ucraniana.
O Presidente turco Recep Tayyip Erdogan propôs a ajuda do seu país para permitir que a Ucrânia exporte cereais e outros alimentos, uma proposta que foi aceite pelo líder russo Vladimir Putin.
Na última sexta-feira, Putin garantiu que Moscou não atacará os portos ucranianos quando forem desminados para a transferência de navios de grãos.
O chefe de Estado russo negou também que a Marinha russa esteja a bloquear os portos ucranianos e considerou as exportações de cereais da Ucrânia insignificantes para o comércio mundial de alimentos.
A proposta turca é que Ancara assuma a desminagem dos portos ucranianos no mar Negro e a escolta de navios com cereais ucranianos para águas neutras.
Posteriormente, esses cargueiros seriam revistos pelo lado russo e escoltados para os estreitos de Bósforo e Dardanelos, opção que a Ucrânia tem rejeitado até agora.
Pouco antes da guerra, a Ucrânia estava a caminho de se tornar o terceiro maior exportador mundial de trigo e forneceu metade do comércio mundial de sementes de girassol e óleo.
Kiev exportava mensalmente 12% do trigo do mundo, 15% do milho e 50% do óleo de girassol.
A Rússia lançou na madrugada de 24 de fevereiro uma ofensiva militar na Ucrânia que causou já a fuga quase 15 milhões de pessoas de suas casas – mais de oito milhões de deslocados internos e mais de 6,9 milhões para os países vizinhos -, de acordo com os mais recentes dados da ONU, que classifica esta crise de refugiados como a pior na Europa desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
Também segundo as Nações Unidas, cerca de 15 milhões de pessoas necessitam de assistência humanitária na Ucrânia.
A invasão russa – justificada pelo Presidente russo, Vladimir Putin, com a necessidade de “desnazificar” e desmilitarizar a Ucrânia para segurança da Rússia – foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que respondeu com o envio de armamento para a Ucrânia e a imposição à Rússia de sanções que atingem praticamente todos os setores, da banca ao desporto.
A ONU confirmou hoje que 4.253 civis morreram e 5.141 ficaram feridos na guerra, que hoje entrou no seu 104.º dia, sublinhando que os números reais poderão ser muito superiores e só serão conhecidos quando houver acesso a zonas cercadas ou sob intensos combates.