O número de pessoas a passar fome no Brasil quase dobrou entre 2020 e 2022, passando de 19 milhões para 33,1 milhões em abril, refere um levantamento da rede brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional.
Para chegar ao montante de pessoas com fome no Brasil, um dos maiores produtores de alimentos do mundo, foram coletados dados em 12.745 domicílios, com entrevistas presenciais de uma pessoa adulta, ou seja, com mais de 18 anos, entre novembro de 2021 e abril de 2022, em 577 municípios em todos os estados do país.
O levantamento indicou que em 41,3% dos domicílios brasileiros os moradores alegaram estar em situação de segurança alimentar (88,1 milhões de pessoas), enquanto em 28% havia incerteza quanto ao acesso aos alimentos (59,6 milhões), em 15,2% havia insegurança alimentar moderada (32,3 milhões), e em 15,5 dos domicílios do país a fome voltou a ser uma realidade (33 milhões).
A investigação detetou que mais de metade da população brasileira (58,7% ou 125,2 milhões de pessoas) convive atualmente com insegurança alimentar em algum grau, ou seja, são pessoas preocupadas com a possibilidade de não ter alimento no futuro ou que já passam fome.
Na descrição geral da situação da população brasileira, a investigação destacou que “os resultados confirmam o quadro de pobreza e suas consequências neste tempo de sinergia entre as várias crises pelas quais passa o país”.
“Ao longo dos últimos anos, o povo brasileiro vem empobrecendo progressivamente e enfrentando as consequências da precarização da vida, sem o suporte adequado e efetivo de ações do Estado. O resultado da combinação desses fatores teve reflexos claros na capacidade de acesso à alimentação suficiente e adequada pelas famílias brasileiras e constitui violação do preceito constitucional no Brasil relativo ao direito humano à alimentação adequada”, destacou.
A rede Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan) frisou ainda que nos últimos anos a fome no “país regrediu para um patamar equivalente ao da década de 1990”.
As dificuldades de acesso aos alimentos no Brasil foram mais frequentes em domicílios rurais do que nas áreas urbanas.
“Entre os domicílios rurais, o segmento da agricultura familiar sofreu o impacto da crise económica, mas foi especialmente afetado pelo desmonte das políticas públicas voltadas para o pequeno produtor do campo”, avaliou o levantamento.
As formas mais severas de insuficiência alimentar moderada ou grave estavam presentes em cerca de 38% dos domicílios de agricultores familiares e produtores rurais, enquanto nas cidades ficou em 21,8% das habitações.
Regionalmente, nas regiões norte e no nordeste foram encontradas as maiores percentagens de famílias em situação de fome no Brasil.