O Futuro Desenvolvimento Rural – Roberto Mileu

A Comunicação Social tem trazido, nos últimos tempos, vários e repetidos anúncios de mais e mais milhões para a Agricultura.

As notícias, tal como são apresentadas, têm um enorme peso negativo na opinião pública que, não estando dentro da realidade, vai formando opinião deturpada.

Vamos aos factos:

– Dos 1.140 milhões de euros/ano, 640 milhões já têm destino e destinatários certos – são para os Pagamentos Directos, em Portugal conhecidos por “Ajudas INGA”, em que 2.000 dos 300.000 beneficiários recebem 50% desses dinheiros até 2013 (nada de novo como se sabe …).

– Os outros 500 milhões de euros/ano serão para o Desenvolvimento Rural no período de 2007 a 2013 (recorde-se que no actual Quadro Comunitário de Apoio estavam disponíveis 700 milhões de euros/ano).
Relativamente ao Desenvolvimento Rural para 2007 – 2013 a CNA apresentou ao MADRP um conjunto de Reflexões e Propostas para o futuro que a seguir se descrevem e traduzem a apreciação do “passado” e perspectivam uma correcção/melhoria para o futuro Plano Nacional de Desenvolvimento Rural.

REFLEXÕES E PROPOSTAS

1. Todo o PNDR 2007 – 2013 terá que se enquadrar em 4 Eixos:

Eixo 1 – Aumento de competitividade dos sectores agrícola e florestal
Eixo 2 – Melhoria do ambiente e da paisagem rural
Eixo 3 – Qualidade de vida nas zonas rurais e diversificação da economia rural
Eixo 4 – LEADER

Desde logo, deverá ficar assegurada uma coerência e articulação entre os diversos Eixos de modo a que não existam (como até aqui), diferentes sedes de análise e decisão, com tempos e critérios distintos, fazendo com que um Projecto ou Candidatura incluindo Medidas/Acções de mais que uma fonte de apoio esteja dependente de várias e diferentes análises.

Isto é, uma Candidatura/Proposta que envolva, por exemplo, a modernização de explorações agrícolas e o aumento do valor dos produtos agrícolas e florestais (Eixo 1), pagamentos Agro-Ambientais (Eixo 2) e Incentivos a Actividades Turísticas (Eixo 3) deve poder ser apresentada num Projecto Global, articulada, analisada e decidida por uma única “equipa” constituída por técnicos destas diferentes áreas.

2. EIXO 1

a) A Formação Profissional deve ser revista, tendo em conta uma maior eficácia, eficiência e resposta à realidade agrícola e rural portuguesa, nomeadamente no que reporta à Formação em contexto de trabalho, aos regimes laborais, pós-laborais e mistos e à descontinuidade das Acções.

Igualmente deverá ser acautelado e assegurado os atempados pagamentos de adiantamentos e reembolsos, tal como deverá ser reposto o adiantamento de 30%.

A capacitação/reciclagem de Formadores em novas áreas ou em áreas onde são manifestamente insuficientes (conhecimentos científicos, práticas inovadoras, aconselhamento, novos processos e tecnologias, regimes de qualidade dos alimentos, promoção de produtos, melhoria da qualidade de produção e dos produtos agrícolas, marketing, informática, etc.) deverá ser uma prioridade.

A aquisição de aptidões e competências profissionais adequadas aos Jovens Agricultores a instalar deverá ser revista nos seus diversos aspectos, abrangências e especializações.

b) A Instalação de Jovens Agricultores deverá ser melhorada, em diálogo com os mesmos e seus representantes.

Um dos aspectos a corrigir e a facilitar deverá ser a questão de acesso à terra, desde os apoios à aquisição, as cedências, ao pagamento de tornas a co-herdeiros, ao pagamento antecipado de rendas.

Deve ser fomentado e apoiado o acesso a explorações/terrenos “libertados” por candidatos à Reforma Antecipada e criado (e posto a funcionar) um Banco de Terras para disponibilizar aos Jovens Agricultores, no qual se incluem também terrenos/explorações do Estado.

c) Os principais inconvenientes verificados na obtenção de melhores resultados com a Reforma Antecipada deverão ser eliminados (existem relatórios sobre isso).

d) Deverão voltar a ser estipulados apoios à instalação da Contabilidade Agrícola de Gestão, que reforçarão a adesão aos Serviços de Gestão.

e) Na Modernização das Explorações agrícolas dever-se-ão privilegiar e priorizar investimentos produtivos e em estruturas e infraestruturas directamente ligadas à produção, à concentração, ao acondicionamento, embalagem e à comercialização, ao regadio e às plantações, evitando o peso esmagador verificado nos últimos QCA respeitantes a Máquinas e Equipamentos não específicos.

Por outro lado deverá ser facultado (proposta desde há muito apresentada pela CNA mas nunca posta em prática) o acesso e apoios à Aquisição em Comum de Máquinas e Equipamentos de elevado custo e fraca utilização individual por parte de Grupos de Agricultores com áreas/explorações de reduzida dimensão para o efeito.

Estas candidaturas deverão ser desburocratizadas ao máximo, sem exigência de constituição de sociedades formais.

f) Na melhoria do valor económico das Florestas deverão ter papel importante as Organizações de Baldios.

g) O Artº 35º do Regulamento 1698/2005 (Medidas transitórias para os novos E.M.), com apoios “a fim de facilitar a criação e o funcionamento administrativo dos agrupamentos de produtores”, continua a fazer muita falta em Portugal e o Governo Português deveria arranjar forma de se aplicar no nosso País, se não dentro deste artigo, incluído em qualquer outro do Eixo 1.

3. EIXO 2

a) O Artº 39º (pagamentos agro-ambientais), deverá, na adaptação a Portugal, merecer especial atenção.
Por um lado não contemplar, no PNDR 2007 – 2013, algumas Medidas/Acções que em QCA anteriores foram uma “segunda fonte” de financiamento e um grupo restrito de beneficiários mas detentores de grandes áreas (tipo contrapartida pela modulação). Referimo-nos, concretamente, a Sistemas Extensivos, Sistemas Cerealíferos, Conservação do Restolho e Manutenção de Palha no Solo.

Por outro lado deverá incluir, para além do apoio à Manutenção de Raças Autóctones, apoio ao Fomento, Manutenção e Preservação de Variedades Regionais, tradicionalmente adaptadas às condições edafo-climáticas próprias, geralmente pouco consumidoras e pouco necessitadas de adubos químicos, herbicidas e pesticidas. São os casos entre outros, dos Milhos Regionais, do Feijão, do Trigo Barbela, do Centeio, do Melão de Almeirim e da Amareleja, da Cebola de Alcochete …

b) O Artº 44º (primeira implantação de sistemas agro-florestais em terras agrícolas), deveria em nosso entender, aplicar-se não apenas à Primeira Implantação, mas também, à MANUTENÇÃO desses Sistemas.

Em Portugal e nomeadamente em muitas zonas de minifúndio e do interior do País, a estrutura fundiária, o nível etário e a falta de alternativas “obrigam” a uma interdependência e a uma complementaridade de orientações produtivas e sistemas de produção claramente preservadoras do ambiente e da natureza, com um equilíbrio ancestral que interessa manter.

São explorações e sistemas de explorações não “competitivos” aos olhos de muita gente, mas que ainda mantêm milhares de famílias no Mundo Rural, que têm combatido a desertificação, o abandono e o êxodo rural.

Pensamos, por isso, que deverão ter apoios específicos, ou no âmbito deste artigo, em alternativa, no âmbito do Eixo 3.

4. EIXO 3 e EIXO 4

Dois Eixos importantes para o futuro, deverá haver neles e na sua implementação alguns cuidados de forma a evitar que parte significativa das verbas alocadas sirvam para resolver problemas de falta de meios e dotações de entidades que as deviam obter noutras “sedes”, por exemplo autarquias.

5. ESTRATÉGIAS E IMPLEMENTAÇÃO

O PNDR 2007 – 2013 assumirá importância nos próximos anos.

Os QCA anteriores tiveram o seu “papel” como é sabido, havendo que com base na experiência adquirida corrigir erros e fazer com que seja mais eficaz e eficiente e atenda à nova realidade e necessidades.

Algumas considerações:

5.1 – Parcerias Estratégicas

5.1.1 de Nível Nacional

Deverão participar no estudo, análise, discussão e implementação, para além da administração, os “parceiros agrícolas” através das Confederações e Organizações de nível nacional.

As mesmas entidades deverão participar na avaliação e correcção do PNDR, bem como na co-decisão e co-gestão.

5.1.2. de Nível Regional

As O.A.’s representativas a nível regional deverão intervir de igual modo ao ponto anterior nas respectiva áreas geográficas de actuação.

5.2 – Estratégias

Deverá ser estabelecida uma Estratégia Nacional que congregue as várias Estratégias Regionais, atendendo às especificidades e potencialidades próprias.

Assim, em cada região, deverá ser feito uma análise:

– Da realidade agrícola, económica, social e rural actual;

– Dos sistemas e sub-sistemas produtivos e da sua importância económica e social;

– Das potencialidades futuras, tendo em atenção os factores e meios existentes e as perspectivas que se abrem;

– Das necessidades e tipos de apoio;

Esta análise deverá, se útil e necessário, ser efectuada atendendo a “territórios” ou “zonas homogéneas”, por vezes não coincidentes com a divisão administrativa.

Em função disto seriam elencados, tendo em consideração a estrutura fundiária, as condições edafo-climáticas e o tecido humano, entre outros factores internos e externos:

– Que actividades e produtos apoiar prioritariamente;

– Que sistemas produtivos e/ou de explorações;

– Que estruturas de concentração da oferta e escoamento da produção são necessárias;

– Que actividades não agrícolas se perspectivam;

– Que formas de diversificação;

– Que actividades turísticas;

– Que tipos de economia e desenvolvimento.

Com estes e outros dados e elementos entendidos necessários e úteis se obteria, para cada região uma “listagem” equacionada com as das outras regiões que permitiria, no PNDR 2007 – 2013:

a) Elaborar e propor um conjunto de objectivos estratégicos e medidas/acções dentro dos princípios orientadores para cada região;

b) A mesma coisa, mas a nível nacional, em relação a objectivos estratégicos comuns às várias regiões;

c) Um PNDR que contemplasse o todo nacional (quando fosse caso disso) e o regional com especificidades distintas;

Com base nesta metodologia o PNDR seria preparado no sentido de dar resposta sectorial e nacional às necessidades reais e perspectivar, de forma sustentada e sustentável o futuro agrícola, rural, patrimonial e ambiental do nosso País.

6. CINCO NOTAS FINAIS:

6.1 – A importância e necessidade de obter, em Bruxelas, o máximo de verbas para o Desenvolvimento Rural em Portugal.

6.2 – A importância e necessidade de dotações orçamentais do O.E. suficientes para que, em Portugal, os níveis de ajudas sejam o máximo permitido pela Regulamentação Comunitária.

6.3 – A importância que tudo o que respeite ao PNDR seja discutido profunda e amplamente com as O.A.’s Regionais e Nacionais.

6.4 – A necessidade e importância de implementação de Acordo de Parceria Estratégica assinado entre o MADRP. A CNA, a CONFAGRI, a AJAP e a CAP.

6.5 – A necessidade de, na aplicação a Portugal, o PNDR contemplar:

– Constituição, arranque e funcionamento de OP/AP fora das OCM’s (Batata, etc.);

– Associativismo;

– Emparcelamento;

– Concentração da Oferta e Escoamento da Produção;

– Reestruturação Fundiária (Alqueva e outros);

– Sistemas Tradicionais e sem alternativa;

– Abastecimento de Factores de Produção;

– Regadio;

– Electrificação e Caminhos Rurais;

– Produtos Tradicionais;

– Investigação, Experimentação e Demonstração/Divulgação;

– Desconcentração da Produção sobretudo para Zonas do Interior;

– Combate à Intensificação excessiva e à concentração da produção;

– Produção com Segurança e Qualidade Alimentar;

– Combate à Desertificação e ao Êxodo Rural.

Roberto Mileu
CNA – Confederação Nacional da Agricultura

Problemas de Renacionalização da PAC – Roberto Mileu


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