Fenalac

Situação dramática do sector Leiteiro nacional

No próximo dia 23 do corrente decorrerá em Praga uma reunião do Conselho de Ministros da Agricultura da UE visando debater exclusivamente a crise do sector leiteiro na Europa. Nesse sentido, pretendemos manifestar a nossa preocupação face à situação muito difícil por que também passa o sector em Portugal e alertar para a necessidade de tomada de decisões que promovam a sustentabilidade económica dos agentes sectoriais.

Desde já destacámos, que a presente crise económico-financeira não pode ser utilizada como argumento único enquanto causa para a situação dramática que caracteriza o sector leiteiro comunitário e nacional. Com efeito, as decisões tomadas recentemente em matéria de Política Agrícola Comum têm contribuído sobremaneira para agudizar um quadro já de si problemático.

Recordámos o aumento de 2% das quotas leiteiras decidido em Março do ano passado, o qual foi na altura justificado para alegadamente “tirar partido da situação de mercado favorável” e assim “aumentar o rendimento dos Produtores”, ignorando assim a evidência do carácter temporário da alta de mercado vivida em 2008. Tendo a FENALAC contestando desde sempre tal intenção e rebatido a perversidade de tais argumentos, podemos legitimamente questionar os proveitos da medida para o sector nacional (com especial destaque para os Produtores) um ano depois da execução do referido aumento, tanto mais que o nosso nível de produção está estabilizado. Decididamente, o menos desejável nesta conjuntura é uma maior oferta de matéria-prima.

Por outro lado, cinco meses são suficientes para demonstrar o rotundo falhanço das decisões tomadas em Novembro do ano passado, no âmbito da negociação da avaliação da saúde da PAC, não tendo sido por falta de alerta que tais medidas foram implementadas. De facto, em Novembro de 2008 os sintomas evidentes de crise económica não inibiram os Ministros da Agricultura da UE de tomar decisões de carácter liberalizante, em claro contra-ciclo e ao arrepio da importância que o apoio público tem vindo a assumir na generalidade da economia mundial.

Decisões como o enfraquecimento dos instrumentos de apoio ao mercado lácteo e os aumentos graduais das quotas leiteiras em 5% são exemplos do absurdo autismo do Conselho, sendo que a desejada aterragem suave, profetizada pela Comissária da Agricultura para o fim das quotas leiteiras em 2015, transformou-se numa queda livre logo no primeiro ano de aplicação. Está ao critério dos responsáveis políticos evitar o desastre maior, ou seja, o desmoronar de todo a fileira láctea.

Neste quadro, questionámos os benefícios do aumento de quotas, quando a produção estagnou ou apresenta quebras num conjunto significativo de Estados-membro, sendo que a quota total da UE não é ultrapassada há várias campanhas, os níveis de consumo de leite e lacticínios têm sofrido acentuadas quebras e os stocks de produtos lácteos têm aumentando dramaticamente. Nitidamente, o aumento de quota apenas constitui um sinal errado de que o mercado estaria habilitado a escoar mais matéria-prima, aumentando assim a oferta e a consequente redução dos preços.

A redução dramática dos preços à produção vem, aliás, constituir a derradeira prova da deficiente regulação do mercado, assim como o abandono da recolha de leite por parte de alguns operadores, fenómeno que infelizmente se tem generalizado na UE. Entendemos que os responsáveis políticos da UE não podem ficar indiferentes à situação social dramática vivida pelos Produtores de Leite, tanto mais que as suas decisões contribuíram fortemente para este desfecho, sendo necessário definir os convenientes instrumentos financeiros que permitam a sustentabilidade económica da produção.

Não descurando os restantes elos da cadeia de valor, estamos conscientes que o apoio da Produção constitui um esforço estratégico na salvaguarda da viabilidade económica de toda uma fileira, a qual tem sido um exemplo na criação de emprego, riqueza e coesão territorial. Nesta matéria, seria também importante monitorizar e regular os custos da produção de leite, nomeadamente os factores de produção, como sejam os fertilizantes, os pesticidas e os alimentos para animais, cujos preços praticamente duplicaram no último ano e desde então encontram-se praticamente inalterados, não obstante as recentes quedas das cotações das matérias primas agrícolas e dos combustíveis.

Do lado do mercado, mantemos a nossa posição de que as investidas da Distribuição continuem a não merecer a devida atenção por parte da Autoridade da Concorrência. Nem a recente campanha de promoção da imagem levado a cabo por este sector, baseada em estudos promovidos pelos próprios, nos convence que não existe um problema nacional de excesso de concentração. Tudo isto perante a indiferença da Administração, que conta com a Distribuição para conter a inflação e tem uma visão redutora de que este sector contribui para um balanço positivo na criação de emprego. Tal seria assim, se por cada abertura de um novo estabelecimento não fossem contabilizados os empregos perdidos em resultado directo dessa acção.
No caso dos produtos lácteos o papel da Distribuição tem sido ainda mais condenável, pois aposta crescentemente na importação de leite para as suas marcas próprias, em detrimento da produção nacional, agravando assim os stocks e as dificuldades de escoamento.

Tendo em conta a importância económica e social do sector leiteiro, além do seu papel de dinamização das zonas rurais, entendemos que merece um tratamento no mínimo igual ao dispensado pelos Poderes Públicos a sectores cujo impacto real no tecido social é, no mínimo, duvidoso, para não classificá-lo mesmo como condenável.

Relembrámos que o sector aguarda desde Novembro pela definição de uma pacote de ajudas específicas, em resultado das negociações da avaliação de saúde da PAC, o qual ainda não saiu da esfera das intenções, apesar das constantes referências públicas da sua bondade. Desta forma, ainda não foi sequer reposta a mais elementar justiça de considerar o sector leiteiro como estratégico no acesso aos fundos do PRODER, medida solicitada desde 2007.

Definitivamente há que passar das palavras aos actos, antes que seja tarde demais!


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