Internacionalização: aproveitar a janela de oportunidade – Pedro Pimentel

Durante décadas o sector lácteo nacional foi altamente deficitário no que se refere à sua capacidade de aprovisionamento do mercado nacional. As capitações de consumo eram muito inferiores às actuais, mas, apesar disso, a produção nacional não permitia mais do que o fornecimento do chamado ‘leite de abastecimento’, pouco sobejando para a respectiva industrialização, no fabrico de queijo, manteiga ou iogurte.

Apenas após a adesão do nosso país à então denominada CEE, se verifica o ‘grande salto’, quantitativo e qualitativo da fileira do leite nacional e, não obstante o sustentado crescimento do consumo, a produção portuguesa evoluiu ao ponto de, a partir de meados da década de noventa, o país se tornar auto-suficiente ao nível do aprovisionamento do mercado nacional. Esta situação – apesar do déficit crescente ao nível da balança comercial do sector – ainda prevalece e foi acompanhada de uma igual evolução positiva ao nível da industrialização, que permite laborar e colocar no mercado, sob diferentes formatos, toda a produção leiteira nacional.

Tal como se verifica com outros, esta evolução ‘tardia’ justifica que ao contrário de produtos alimentares (vinho, azeite, conservas,…) em que o país por questões geográficas, culturais e de especialização produtiva sempre manteve presença nos mercados de exportação, a fileira do leite apenas mais recentemente tenha reunido condições para pensar em avançar na exportação e internacionalização.

Por outro lado, a vocação de abastecimento do mercado nacional no leite e nos seus derivados, permanecendo, começa a dar sinais de alguma saturação, seja porque o mercado, amadurecendo, gera expectativas de crescimento limitadas aos operadores nele presentes, seja porque o comportamento da chamada moderna distribuição, apostando na destruição de valor, na aquisição crescente de produtos no exterior e na imposição aos seus fornecedores de condições fortemente penalizadoras, prejudica a rentabilidade das empresas e prejudica as perspectivas de evolução da sua actividade.

Assim, procurar mercados alternativos, mais do que uma opção é, cada vez mais, um imperativo de rentabilidade e, mesmo, de sobrevivência. Apostar na exportação ou caminhar no sentido da internacionalização, são opções complementares e não mutuamente exclusivas, mas deverão ter atrás de si uma filosofia permanente de adição de valor e não uma mera perspectiva de escoamento de excedentes não canalizados para o mercado interno.

A concorrência internacional é muito forte e vários são os países, na Europa, mas igualmente na América Latina ou na Oceânia, com um riquíssimo histórico de participação nos fluxos comerciais internacionais, seja pela via da exportação dos seus produtos, seja pela presença crescente – a nível comercial, mas também a nível industrial – em vários mercados.

É por isso que é necessária uma nova atitude, da parte da indústria, mas também dos poderes públicos, para que esta aposta possa ser vencida.

Em relação a estes últimos, desde logo torna-se imperativo descolar de ideias pré-concebidas que apontam para uma aposta constante no “mais do mesmo”, fomentando e apoiando a (justa) presença nos mercados externos das exportações mais tradicionais, mas impedindo a entrada no ‘círculo’ de outros produtos e fileiras. E o caminho só se pode fazer caminhando…

Por outro lado, a escassez de meios, financeiros e humanos, deverá levar à construção do maior número possível de sinergias, entre produtos e entre mercados, apostando no efeito locomotiva dos produtos com presença mais sustentada nos mercados de exportação e concebendo uma oferta alimentar nacional, que não limitando a actuação individual das empresas, a permita potenciar.

Criar uma marca chapéu e uma imagem bem construída do alimentar português. Estruturar instrumentos financeiros de apoio a esta estratégia, mas, em simultâneo, agilizar os meios actualmente existentes para este novo compromisso de exigência. Apostar na diplomacia económica e na integração do sector alimentar na ‘oferta’ nacional que acompanha os nossos governantes nas suas visitas de estado. E não é preciso inventar a roda… basta ver e ‘copiar’ o que de bom se faz em alguns dos nossos parceiros comunitários, a começar logo aqui ao lado, pela nossa vizinha Espanha.

Do actual Ministro da Agricultura, a avaliar pelo seu discurso público, mas também por algumas iniciativas que resolveu desencadear, parece haver um apoio a estas ideias e o objectivo de traçar uma linha de rumo. Aproveite-se, pois, esta janela de que a actual conjuntura parece oferecer…

Pedro Pimentel
Secretário Geral
ANIL – Associação Nacional dos Industriais de Lacticínios

Nota do Editor: MADRP cria um grupo de trabalho para a promoção da internacionalização das empresas agrícolas e agro-industriais bem como das empresas que operam no âmbito das fileiras florestais e das pescas (Despacho n.º 4742/2010. D.R. n.º 53, Série II de 2010-03-17)

O Confronto da Realidade – Pedro Pimentel


Publicado

em

por

Etiquetas: