Ucrânia: ONU trabalha para que navios com cereais ucranianos possam “sair todos os dias”

A ONU e os países envolvidos trabalham para que os navios com cereais ucranianos saiam dos portos “se possível a cada dia”, e as exportações da Ucrânia “atinjam um patamar aceitável”, garantiu hoje à Lusa fonte do organismo.

“A ideia é que não seja só um navio, mas que todo este processo permita ter vários navios, se possível a cada dia, a saírem do porto, para que as exportações cheguem a um patamar aceitável, para que o governo da Ucrânia possa fazer as exportações pelo menos perto do que era antes da guerra”, salientou Saviano Abreu, porta-voz do gabinete humanitário das Nações Unidas na Ucrânia.

Rússia e a Ucrânia assinaram acordos separados com a Turquia e as Nações Unidas, abrindo caminho para a Ucrânia – um dos principais ‘celeiros’ mundiais – exportar 22 milhões de toneladas de cereais e outros produtos agrícolas que ficaram retidos nos portos do Mar Negro devido à invasão da Rússia.

O primeiro carregamento de cereais ucranianos deixou o porto de Odessa hoje de manhã, onde se encontrava Saviano Abreu, que relatou “um momento muito especial”.

“Fiz algumas imagens e vídeos para alguns colegas que estão em Istambul, junto dos países envolvidos. Foi um momento de muita emoção quando viram o vídeo, o som do navio a sair do porto”, contou à agência Lusa.

“Estavam desde sexta-feira praticamente sem dormir, sentados a fazer os últimos ajustes para que isto pudesse acontecer hoje de manhã e houve um aplauso coletivo, foi um momento emotivo para nós”, confidenciou.

Saviano Abreu salientou que hoje foi a primeira vez que um navio comercial saiu do porto de Odessa desde 26 de fevereiro, dois dias depois do início da guerra, pois desde então todos os portos foram encerrados.

O porta-voz da ONU realçou que “o mundo” e “a Ucrânia” precisam que as exportações decorram, mas não adiantou com que frequência vão sair os navios nos próximos dias.

“Ainda é cedo para adiantar isso. O processo de negociação continua, com responsáveis dos dois governos [Rússia e Ucrânia], da ONU e da Turquia sentadas em Istambul, a tratarem de todos os processos para que mais navios possam sair do porto”, atirou.

Por agora, os envolvidos no processo estão concentrados no primeiro navio, que está em rota para que chegue ao Líbano de forma segura, acrescentou.

O momento é importante também para os ucranianos, ou seja, pessoas que “estão a sofrer com a guerra e o encerramento dos portos, agricultores que não puderam fazer a sua produção sair do país”.

Mas Saviano Abreu, na Ucrânia desde março, lembrou que a guerra e a crise alimentar têm também impacto no mundo, com milhões de pessoas “a verem a fome a chegar”.

“Os alimentos não estão a chegar a África ou ao Médio Oriente. Para essas pessoas o significado [do desbloqueio dos portos ucranianos] é gigante”, apontou.

O porta-voz do gabinete humanitário da ONU realçou que “as pessoas mais pobres no mundo são as que mais sofrem, quando a exportação não acontece e os preços começam a subir”.

“Em África, três países – Quénia, Somália e Etiópia – estão com fome extrema de novo, é uma situação desesperante e o que aconteceu hoje vai ter resultados para eles também”, vincou.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, anunciou hoje que o Programa Alimentar Mundial (PAM) vai fretar um navio para transportar 30.000 toneladas de trigo ucraniano que pretende adquirir para responder à crise alimentar global.

Saviano Abreu também reconheceu que o PAM depende muito dos alimentos que saem da Ucrânia e acrescentou que uma parte das 26 mil toneladas que saíram no primeiro navio a deixar o porto de Odessa, também vão ser compradas pelo programa.

A ofensiva militar lançada a 24 de fevereiro pela Rússia na Ucrânia causou já a fuga de cerca de 16 milhões de pessoas de suas casas – mais de seis milhões de deslocados internos e quase dez milhões para os países vizinhos -, de acordo com os mais recentes dados da ONU, que classifica esta crise de refugiados como a pior na Europa desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

Também segundo as Nações Unidas, cerca de 15 milhões de pessoas necessitam de assistência humanitária na Ucrânia.

A invasão russa – justificada pelo Presidente russo, Vladimir Putin, com a necessidade de “desnazificar” e desmilitarizar a Ucrânia para segurança da Rússia – foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que respondeu com o envio de armamento para a Ucrânia e a imposição à Rússia de sanções que atingem praticamente todos os setores, da banca ao desporto.

A ONU confirmou que 5.237 civis morreram e 7.035 ficaram feridos na guerra, que hoje entrou no seu 159.º dia, sublinhando que os números reais deverão ser muito superiores e só serão conhecidos quando houver acesso a zonas cercadas ou sob intensos combates.


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