broa de milho

Ainda há broa de milho no lugar de Espantar

A serra d’Arga — com vista de mar — está mais vazia, sem pessoas e sem vinho, sem cabras e sem vacas e sem bosta para selar o forno onde ainda há quem coza broa de milho. Carmen benze a massa e não pensa em abandonar a Montaria. “Nós aqui estamos num paraíso.”

Quase tudo era diferente na meninice de Carmen Samico, que nasceu “em Fevereiro”, há 64 anos, aqui mesmo no lugar de Espantar, um cantinho na freguesia de Montaria com uma aragem de mar, que espreita bem lá ao fundo, em Vila Praia de Âncora.

O espigueiro de granito está vazio — que a desfolhada é lá para Setembro/Outubro e só então se enche de milho amarelo, que é “o mais doce” —, mas a maior parte dos espigueiros da aldeia estão vazios porque por aqui “há menos gente, a agricultura está a acabar” e já “quase não há vacas” nem para lavrar a terra, nem para fornecer a bosta com que se selava a porta do forno quando se fazia pão. “Há ‘praí’ duas famílias com vacas”, lamenta Carmen, que agora desce ao riacho e agarra em argila na véspera de cozer broa de milho.

“Dantes, nas leiras — nós aqui chamamos leiras aos campos — lavrava-se tudo. Havia muitas vacas e havia muitas cabras e muitas ovelhas. Havia em quase todas as casas. Por isso é que no monte não havia nem tojo nem mato. Íamos aos dias. Hoje ia eu e um senhor de outra casa, amanhã iam outras duas pessoas e levávamos os rebanhos todos. Íamos para a serra, São João, Senhora do Minho… sempre para cima. Quando descíamos, cada uma já sabia para onde devia apartar no caminho. As pessoas que vinham de fora ficavam admiradas por elas saberem o caminho. Depois começou-se a perder. As pessoas começaram a emigrar.”

O sonho de uma vida melhor “levou tudo”. Carmen tem sete irmãos e “cada um foi à sua vida”. Ficou ela em Espantar. “Chegávamos ao 28 de Agosto e já não tínhamos cabras para vender. Matávamos alguma para casa. Agora não. Acabou tudo. Os terrenos estão cheios de silvas e de erva. A serra está como se vê.”

Entretanto, a masseira está quase pronta, colocada no centro da cozinha enegrecida pelo fumo onde estão penduradas duas pernas de porco e um galheiro feito de paus onde Carmen engancha os enchidos antes de acender uma fogueirinha no chão para os defumar. “Há matanças todos os sábados de Novembro a final de Janeiro e por isso é romaria todos os fins-de-semana, dois dias a comer”, explica Agostinho Costinha, 33 anos, o nosso guia neste workshop promovido pela Descubra Minho, empresa que o próprio fundou em 2013 com o irmão Filipe para dar a conhecer a sua terra.

“A matança ainda é um trabalho de entreajuda, sem remuneração”, diz. A perna de porco fresca é colocada em sal durante um mês, depois lavada, pendurada e esfregada com aguardente e pimenta picante para fazer a cura.

A carne pendurada vai assistindo às fornadas de broa de milho que Carmen prepara com menos frequência do que antigamente. “Eram outros tempos. Eram tempos mais divertidos. Havia mais gente. Fazia-se desfolhadas, vindimadas, fazia-se ripadas […]

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