A deriva do Governo e partidos seus aliados pretende impor uma visão ideológica do mundo rural: um espaço que não precisa de gestão nem intervenção humana (…). Não podemos admitir a hipótese da auto-regulação, pois esta apenas significa arder até não haver mais combustível.
A atenção dos portugueses é facilmente atraída pela tragédia. Desde a pandemia à guerra na Ucrânia, ficamos presos à sequência em loop de imagens e números que nos fascinam. Com os incêndios, essa atracção primária é usada, invariavelmente, todos os Verões. A presença dos incêndios nas notícias poderia ser uma forma de trazer a sociedade para uma discussão séria e sem ideologias para melhorar o sector florestal. Infelizmente, a maioria de nós fica pela rama.
O problema dos incêndios interessa aos proprietários, à indústria e aos especialistas. Quando acontecem tragédias como Pedrógão Grande, os políticos envolvem-se mais: correrão atrás de ideias aparentemente novas e que pretensamente resolvem o problema. As pessoas que moram nas cidades olharão para os fogos de maneira diferente se tiverem tido experiências dolorosas. Nos incêndios de Palmela e Quarteira deste ano, talvez poucos se tenham lembrado das imagens aterradoras dos fogos de 2018 em Mati, Grécia, em que morreram 103 pessoas.
Enquanto gestor florestal e director associativo, vejo que as decisões de quem gere a floresta são motivadas, acima de tudo, por um racional económico. Os proprietários decidem com o fim de melhorar – nalguns casos, maximizar – a rentabilidade das suas propriedades, considerando os recursos que têm e a informação que conhecem. Se não tiverem rendimento das suas propriedades, os proprietários não limpam os matos, não desramam as árvores nem desbastam os povoamentos. O abandono provocado por um sector em declínio – a recente publicação do INE sobre as contas da silvicultura demonstra-o – deve preocupar-nos a todos. Não temos uma economia suficientemente pujante que se possa dar ao luxo de desprezar o mundo rural.
Se queremos realmente contrariar a preocupante tendência de abandono do mundo rural, tem de existir uma actividade lucrativa que atraia os proprietários, condições favoráveis […]