Portugal é um país de estratégias caricatas. Em tempo de crise económica e de carência de apoio externo, o país vê-se na contingência de reforçar as suas exportações, as de produtos de base florestal incluídas. Todavia, no que às exportações de produtos de base florestal respeita a estratégia seguida é obtusa.
Pela análise das estatísticas oficiais, as exportações de produtos de base florestal têm efetivamente crescido em valor bruto. Todavia, este crescimento em valor bruto poderá não corresponder necessariamente a um saldo positivo em termos de valor líquido.
Neste último, deve atender-se ao declínio progressivo do rendimento empresarial líquido na silvicultura, à depreciação dos recursos naturais, com relevo para a decorrente dos incêndios florestais, estes últimos também uma consequência de um problema de mercado no que à sua propagação respeita, e à consequente desvalorização económica, social e ambiental do Território.
Deve atender-se igualmente à preferência pelas importações face à valorização do mercado interno, sobretudo nos produtos lenhosos. Valorização que se deveria basear em parcerias estratégicas entre a produção e a indústria.
Face à imperiosa necessidade de reforçar as exportações a curto e médio prazo, no caso concreto dos produtos de base florestal, mais especificamente nos de base lenhosa, faria sentido que o governo privilegia-se os povoamentos florestais em fase final ou intermédia do seu ciclo produtivo, ou seja, os que estão em condições de mais rapidamente fornecer matéria-prima à indústria. Verifica-se contudo que, a estratégia do governo neste domínio se consubstancia no reforço das verbas de combate aos incêndios florestais, não na sua prevenção (leia-se a prevenção baseada no desenvolvimento rural e na regulação de mercados, ou seja, nas pessoas e no negócio sustentado e sustentável).
Em contrapartida, a aposta do governo evidencia-se no fomento da florestação. Fomento esse desprovido de medidas acessórias e fundamentais de reforço do apoio técnico e comercial à gestão florestal. Isto para além de essenciais medidas de acompanhamento dos mercados, muito concentrados e com fortes evidências de concorrência imperfeita.
Eis que surge assim o Decreto-Lei n.º 96/2013, de 19 de julho, que entrará em vigor esta semana.
Esta aberração politica, para além de poder contribuir para o fomento dos incêndios florestais, não assegurada que está a gestão futura dos novos povoamentos, parece inserir-se num contexto de servilismo de Estado a interesses feudais.
Regista-se, a propósito, a coincidência temporal entre o início da discussão pública do diploma legal e a manifestação, igualmente pública, de vontades (não desmentida) da Portucel Soporcel, com exigência de mais disponibilidade (que não qualidade) de madeira de eucalipto.
Fonte: Jornal I, edição de 15 de maio de 2012.
Madeira essa que pretende obter estrategicamente de terceiros, de centenas de milhares de famílias, mas a quem impõe os preços de compra e os principais riscos deste negócio silvo-industrial.
Fonte: Boletim Estatístico 2011. CELPA, 2012.
Possuindo Portugal a 5.ª maior área de eucalipto do mundo, a aposta em quantidade sem garantias de gestão florestal não augura bons resultados aos cidadãos e aos contribuintes em particular, já que são estes que suportam os elevados custos económicos, sociais e ambientais dos incêndios florestais.
O protecionismo de Estado a interesses industriais, no caso concreto do eucalipto para pasta celulósica, pode igualmente avaliar-se pela não aposta dos governos em fomentar alternativas ao uso da madeira desta essência florestal.
A produção de madeira de eucalipto para serração é já hoje uma realidade aqui bem próxima, seja para a construção civil, seja para mobiliário. Esta aposta poderia reduzir os custos com as importações de madeira pela indústria de serração.
Por outro lado, não se vê sinal de fomento (sustentável) da produção de biomassa dedicada, com base no eucalipto, designadamente com vista à redução das importações de combustíveis fósseis. Ou mesmo para garantir a sustentabilidade de outras fileiras industriais (p.e., de pellets energéticas). Neste último domínio, por vontade própria, o Estado desperdiça a oportunidade de utilizar verbas das ajudas diretas (1.º pilar) da Política Agrícola Comum, ao contrário do que acontece, por exemplo, em França (Taillis à Curte Rotation).
Mas, será este protecionismo caraterístico da Situação? Nem por sombras, na Oposição é possível constatar, num programa eleitoral de 2011, a aposta “na floresta irrigada em zonas de regadio subaproveitadas, para a garantia do aumento da matéria-prima para a indústria da madeira e da pasta de papel”. Curiosamente, evidencia-se constantemente a aposta na quantidade. Já no que à qualidade diz respeito, constata-se que a produtividade média nacional remonta a valores anteriormente registados, em 1928.
Do lado das organizações de proprietários florestais apoiantes desta estratégia governamental de fomento florestal, concretamente as atuantes em regiões de minifúndio, seria interessante disponibilizarem, para defesa dos interesses dos seus associados, as “folhas de cultura” para o eucalipto, onde ficasse demonstrado a rentabilidade do negócio em unidades de gestão inferiores a 5 hectares, por exemplo. Generosamente, até se pode duplicar a área para os 10 hectares. Isto, claro está, assegurando uma adequada gestão florestal ao longo da revolução (para as várias rotações), o que não passa apenas pela aplicação de princípios técnicos florestais, mas também de métodos comerciais. Concretamente, que incorpore, no extremo inferior, uma adequada instalação, as operações silvícolas mínimas definidas legalmente, bem como a remoção final de cepos e uma estratégia comercial de escoamento das produções. Assim sim, suportam seriamente a sua aposta.
Paulo Pimenta de Castro
Engenheiro Florestal
Presidente da Acréscimo – Associação de Promoção do Investimento Florestal
O desfoque e o enfoque sobre os incêndios florestais – Paulo Pimenta de Castro