Bastará um par de ténis? – Pedro Santos

Os focos da atenção estão sobre a agricultura e ainda bem!

Isso tem trazido novos interessados ao setor. No âmbito do Proder, já foram aprovados mais de 7.200 novos projetos de jovens agricultores (prémio + investimento), aos quais foi atribuído um apoio superior a 460 milhões de euros, alavancando um investimento total acima de 800 milhões. No ano passado, a média foi de aproximadamente 10 candidaturas por dia!

Quem conhece o setor sabe que esta renovação não só é bem-vinda como é essencial para criar novas dinâmicas e potencialidades.

Alguns números (fonte: www.ceja.eu) mostram, no entanto, que está muito por fazer, não só em Portugal mas no conjunto dos países europeus:

  • 6% dos agricultores da Europa tem menos de 35 anos (em Portugal, apenas 2,5 %!)

  • Mais de 34% dos agricultores europeus têm mais de 65 anos

  • Nos 27 países europeus, existe apenas 1 agricultor com menos de 35 anos por cada 9 agricultores com mais de 55 anos

Ninguém duvida que a renovação do tecido empresarial agrícola é um desígnio europeu, e por isso tem existido e continuará a existir um enquadramento diferenciado para os Jovens que se queiram instalar na agricultura.

É, por isso, crucial que se desenvolvam ações que contribuam para a modernização do sector, e que contribuam para aumentar o nível quantitativo e qualitativo da produção agrícola, sem esquecer a sustentabilidade financeira das explorações para que os empresários agrícolas possam viver dignamente da sua atividade. Dessa forma, será possível tornar o sector mais atrativo, para que mais jovens empreendedores queiram apostar nele como atividade económica de futuro.

Mas será que este fluxo impressionante de Jovens Agricultores a entrarem no setor está associado a projetos de futuro, bem estruturados e integrados em organizações de comercialização que lhes permita ganhar competitividade?

Infelizmente, cremos que não!

Quantos potenciais Jovens Agricultores chegam à CONSULAI a perguntar o que podem fazer para aproveitar “terrenos que têm algures” porque ouviram dizer que existiam ajudas interessantes para o setor? São bastantes diariamente, e com formações muito distintas!

Porque nos preocupa bastante a sustentabilidade futura destes projetos, temos a preocupação de, desde a primeira conversa, sensibilizar para a realidade de uma atividade económica sujeita a muitas incertezas e que requer uma prolongada curva de aprendizagem técnica. Temos a preocupação de lhes transmitir que não basta “comprar um par de ténis para começar a correr”, e que, bem pelo contrário, é complicado iniciar uma atividade que necessita de elevados investimentos iniciais e competências técnicas sólidas; é necessário que, antes de iniciarem esta atividade, os jovens agricultores percebam que vão tornar-se empresários, com todas as dificuldades e responsabilidades que isso acarreta.

Como noutras atividades económicas, é necessário garantir um conjunto de condições iniciais que permitam definir um modelo de negócio sólido e com futuro. Os jovens agricultores, essenciais para o nosso setor, devem procurar definir um projeto que tenha como matriz todas as variáveis “R.E.D.E.”:

  • “R”: Recursos – é crucial garantir que os projetos tenham os necessários recursos humanos, físicos (terra), materiais e financeiros, que garantam a viabilidade dos projetos; por exemplo, os recursos financeiros têm de ser dimensionados não apenas para fazer face ao investimento inicial mas também ao fundo de maneio necessário para estabilizar a operação (que normalmente é superior ao que se estima no início)

  • “E”: Experiência – a experiência agrícola é um fator muito relevante para definir o sucesso dos projetos de instalação. A falta de experiência de alguns promotores implica que exista um período de aprendizagem, contrário à necessidade de gerar resultados num curto período de tempo.

  • “D”: Dimensão – a dimensão crítica das explorações é decisiva para que se ultrapassem constrangimentos relacionados com a falta de rentabilidade e que contribuem marcadamente para o abandono da produção agrícola. Este aspeto só pode ser minimizado com a organização da produção (via associativismo ou cooperativismo).

  • “E”: Escoamento – a existência de canais de escoamento consistentes é um aspeto determinante para o sucesso de qualquer projeto de produção agrícola. Pode parecer estranho, mas este é um aspeto recorrentemente esquecido por quem quer entrar numa atividade que desconhece.

Todos os novos produtores agrícolas fazem falta e são bem-vindos ao setor, mas têm de vir preparados, ou têm que se preparar no caminho, para escreverem uma história de sucesso e ajudar a modernizar a nossa agricultura. Isso sim, é o que todos queremos!

Pedro Miguel Santos
Director-Geral
CONSULAI, Consultoria Agro-Industrial, Lda

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