Uma equipa internacional, liderada por investigadores do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (CIBIO-InBIO), desvendou a razão pela qual foram necessários mais de 70 anos para se verificar a invasão do coelho-europeu na Austrália.
Em comunicado, o centro da Universidade do Porto esclarece que o estudo, publicado hoje na revista americana PNAS, decifra o “mistério” da invasão do coelho-europeu no continente australiano.
“A colonização da Austrália pelo coelho-europeu é uma das invasões biológicas mais famosas da história”, salienta o centro, lembrando que a espécie foi levada para aquele continente, pela primeira vez, em 1788, mas que só na segunda metade do século XIX o coelho-europeu “se tornou uma peste”.
“A expansão, que cobriu uma área 13 vezes maior que a Península Ibérica, mudou irreversivelmente a paisagem Australiana e deixou um rastro de destruição nos ecossistemas e propriedades agrícolas”, refere.
A investigação internacional, liderada por investigadores do CIBIO-InBIO e das Universidades de Cambridge e Oxford, combinou dados de ADN com documentos históricos, tendo demonstrado que a invasão foi “desencadeada pela ação de uma única pessoa: Thomas Austin”, um emigrante britânico que, em 1859, importou 24 coelhos de Inglaterra.
“A história era célebre, mas a evidência do papel de Thomas Austin na invasão era difusa porque há registo de outras introduções. No entanto, o perfil genético dos coelhos australianos permitiu-nos rastrear a origem da invasão precisamente à propriedade onde Austin viveu, no sudoeste da Austrália”, afirma, citado no comunicado, Joel Alves, primeiro autor do artigo e investigador do CIBIO-InBIO.
No estudo, os investigadores conseguiram ainda seguir a linhagem genética dos coelhos e chegar à vila onde Austin nasceu em Inglaterra e de onde os coelhos foram capturados para serem, posteriormente, transportados para a Austrália.
Uma análise da composição genética dos coelhos revela que estes tinham uma “origem maioritariamente selvagem”, característica que, defendem os autores, Austin “escolheu propositadamente”, uma vez que pretendia usá-los para a caça.
“Durante a domesticação, os coelhos foram selecionados para várias características como diferentes colorações e mansidão. Isto tornou-os menos preparados para sobreviver no ambiente selvagem australiano”, acrescenta ainda Miguel Carneiro, coautor do estudo e também investigador no centro da Universidade do Porto.
A par dos genes, existiram outros fatores que contribuíram para o sucesso dos coelhos de Austin, nomeadamente, o facto de “estarem mais bem adaptados”, mas, principalmente, “o impacto humano”, como a “eliminação de predadores e a expansão de terrenos agrícolas”.
“Este estudo mostra a excecionalidade dos coelhos como modelo biológico a todos os níveis, mas, mais do que tudo, é uma demonstração inequívoca da importância da ciência para informar e desenvolver políticas de conservação”, refere Nuno Ferrand, um dos autores do estudo e atual diretor do CIBIO-InBIO.