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Chanfana é maravilha nas mesas em agosto mas a falta de cabras faz subir os preços

A chanfana continua a ser a iguaria mais procurada em agosto, no interior do distrito de Coimbra, ainda que a criação de caprinos tenha diminuído nos últimos anos, fazendo disparar o preço da carne.

Os alertas para o decréscimo da produção de gado caprino têm surgido de vários quadrantes, a par de alguns esforços para inverter a situação. Porém, a resposta à escassez de cabra nacional tem-se revelado insuficiente.

Nos talhos, o preço desta carne oscila entre 5,95 e 6,25 euros, com ligeiras diferenças.

“Não pode haver desenvolvimento das sociedades sem haver uma ligação aos recursos locais”, disse à agência Lusa Jorge Brito, secretário executivo da Comunidade Intermunicipal da Região de Coimbra.

Jorge Brito lamentou o acentuar da tendência para “uma quebra tremenda” na criação de cabras, com impacto nos preços da matéria-prima da chanfana.

Na sua opinião, é necessário desenvolver “iniciativas para dignificar” o pastoreio de pequenos ruminantes, cabras e ovelhas, para produção de carne e queijo.

“À volta da mesa, gostamos todos de nos juntar, mas à volta dos rebanhos é mais difícil”, ironizou o geógrafo, salientando que o município de Vila Nova de Poiares “tem tido um trabalho de fundo” para promover a caprinicultura.

Deste investimento, destaca-se a inauguração, há duas semanas, de um capril com 75 cabeças, no âmbito de uma parceria da Câmara presidida por João Miguel Henriques com a Junta de Freguesia de São Miguel de Poiares.

Ao enaltecer o papel das cabras na prevenção dos incêndios, limpando áreas florestais, restolhos e campos abandonados, Jorge Brito defendeu a criação de um “sistema de incentivos e ajudas” para valorizar a profissão de pastor, “sob pena de não se ter o produto” que diferencia o território.

Aos 72 anos, Manuel Nogueira, que durante décadas teve um talho na Lousã, continua ligado ao setor, enquanto comerciante de gado vivo licenciado para o efeito.

Na sua opinião, importa que o Estado conceda “maior apoio” aos criadores, para que não esmoreçam na atividade.

“Seria uma ajuda especialmente na alimentação”, preconizou Manuel do Talho, como é mais conhecido na região, ao vincar que “o pastor não tem nada, nem domingos nem feriados”.

Nesta época, “o consumo de chanfana é muito superior” ao resto do ano, como prato principal nas festas das aldeias e “muito procurado” por turistas e emigrantes.

A pandemia da covid-19 prejudicou em particular o segmento caprino do mercado das carnes, o que explica, este ano, “um aumento de talvez 80% da procura” relativamente a 2020 e 2021, segundo Manuel Nogueira, que ainda gosta de criar ovinos e caprinos.

Quando as bodas de casamento chegavam a durar dois ou mais dias, eram consumidos 100 a 120 quilos de chanfana, recordou o talhante.

Esta carne era das mais baratas, num tempo em que 10 atuais “aldeias do xisto”, nos concelhos de Góis, Miranda do Corvo e Lousã, possuíam milhares de cabras que limpavam a Serra da Lousã.

Desde 2018, a Associação de Desenvolvimento do Ceira e Dueça (Dueceira), que reúne Lousã, Poiares, Miranda do Corvo e Penela, tem vindo a valorizar a gastronomia em torno da marca “Terras da Chanfana”, distinguida como uma das “7 Maravilhas à Mesa de Portugal”.

“Com este processo, sentimos que a chanfana passou de prato rústico, familiar e festivo a prato com alcance nacional. Não perdeu a sua genuinidade, mas foi-lhe conferido o merecido reconhecimento de modo abrangente”, disse Ana Souto, coordenadora da Dueceira.

Falando à Lusa em nome do autarca da Lousã Luís Antunes, presidente da direção, Ana Souto frisou que a aposta dos quatro concelhos na marca visa “reforçar o que em conjunto fazem de melhor”.

Patrícia Dias, do restaurante Zé Padeiro, em Miranda do Corvo, confirmou que a chanfana é uma das iguarias mais procuradas em agosto.

“Nunca me faltou a carne de cabra”, disse a sócia-gerente. Por vezes, contudo, os fornecedores admitem que “é mais complicado arranjar”.

Desde 1981, a firma ganhou nome na confeção de leitão assado, mas também, sobretudo no verão, não tem mãos a medir na confeção da suculenta carne de cabra assada em vinho tinto.

“Clientes de Lisboa, Aveiro e Santarém vêm cá comprar caçoilas de chanfana”, revelou Patrícia Dias.

Em Miranda do Corvo, a Real Confraria da Cabra Velha, dirigida por António Simões, tem-se empenhado na promoção e defesa da qualidade da chanfana.

Reconhecendo que a carne está “mais cara 20%”, garante que “não há falta”, ao passo que o presidente da Câmara local, Miguel Baptista, lamentou em abril, no contexto da Semana da Chanfana, que os animais disponíveis não chegam para as necessidades.

“A venda de chanfana tem aumentado nos restaurantes”, declarou à Lusa o “real decano” da Confraria, que realizou o XVII Capítulo há quatro meses.

No dia 11 de setembro, é a vez de a Confraria da Chanfana, em Vila Nova de Poiares, organizar o XIX Grande Capítulo.

Estes encontros gastronómicos reúnem habitualmente centenas de comensais, entre confrades e convidados de organizações congéneres.


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