Um quarto dos insectos europeus está hoje à beira da extinção. Há lugares onde a redução da biomassa dos insectos chegou aos 75%. Está em causa a cadeia alimentar do planeta. Alarme: a primeira de três partes de uma série de reportagens na Alemanha, em Espanha, no Luxemburgo e em Portugal.
Quando um especialista em borboletas vai para o campo, raramente olha de frente para a paisagem. Os cientistas que estudam estes insectos têm o hábito de apontar a visão para os planos mais rasteiros dos prados e Constanti Stefanescu estuda invertebrados há tantos anos que as suas costas foram ganhando uma certa curvatura. É biólogo, trabalha para a Rede Catalã de Monitorização de Borboletas, e hoje veio medir a densidade dos insectos no Parque Natural de Montseny, um bosque a norte de Barcelona, em Espanha, que foi declarado Reserva da Biosfera pela UNESCO em 1978.
O dia está quente e luminoso, são as condições ideais para um entomólogo avaliar a intensidade com que as borboletas ocupam um prado. Aos ombros, o biólogo traz uma rede – é com ela que caça os exemplares que não consegue identificar à distância, antes de devolvê-los aos ares. Mas hoje quase não precisa de usá-la. Na verdade, quase nunca precisa. “Nos últimos 30 anos fomos capazes de comprovar que 70% das espécies de borboletas na Catalunha estão em regressão”, explica. “O estado em que se encontram as borboletas é um indicador do estado geral dos insectos. Incluindo, por exemplo, as espécies que polinizam os cultivos de que dependemos.”
A Rede Catalã de Monitorização de Borboletas é um dos poucos programas europeus a avaliar sistematicamente as populações de insectos em tempos e espaços determinados.
Um apocalipse dos insectos
“Na comunidade científica há muitos anos que temos a impressão de que o declínio é enorme, mas os financiamentos para estudar insectos sempre foram escassos”, admite Axel Hochkirch, que dirige o departamento de invertebrados da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês) e é um dos mais reconhecidos entomólogos do planeta (tanto que, há um par de meses, uma nova espécie de grilo descoberta na ilha de Creta, Grécia, foi baptizada com o seu nome: Leptophyes axeli). Por toda a Europa, entre os cientistas que estudam os insectos, há aliás esta piada recorrente: um mosquito não é tão sexy como um lobo, pelo menos quando o assunto é arranjar fundos para investigação.
“Há cinco anos, no entanto, tudo mudou”, diz Hochkirch. Em Outubro de 2017, a Sociedade Entomológica de Krefeld, na Alemanha, publicou um estudo que fez soar os alarmes em todo o mundo. Com acesso a dados raros recolhidos ao longo de 27 anos, os cientistas foram capazes de determinar que, em menos de 30 anos, nas reservas ecológicas germânicas, se verificava uma perda de biomassa dos insectos voadores na ordem dos 75%. Nos meses de Verão, altura em que há mais presença de invertebrados, os números chegavam aos 82%. A notícia espalhou-se rapidamente pelo globo, com os jornais a darem conta de que estava em marcha um apocalipse, ou armagedão, dos insectos.
Desde então, multiplicam-se os esforços científicos para avaliar a dimensão do problema. Os números são tudo menos animadores. “Os estudos mais recentes da União Internacional para a Conservação da Natureza apontam que 30 espécies desaparecem diariamente da face do planeta”, diz Horchkirch, que conduziu estas investigações. Também foi ele a liderar os esforços internacionais para criar uma inédita lista vermelha de invertebrados europeus. “Graças a esse esforço feito entre investigadores de todo o continente, conseguimos determinar que um quarto dos insectos do continente está neste momento em risco de extinção.”
Para Alain Klein, biólogo do Parque Natural do Our, uma das três reservas ecológicas que existem no Luxemburgo, a expressão “apocalipse dos insectos não é assim tão incorrecta.” O pequeno Grão-Ducado foi dos primeiros países europeus a apressarem-se a criar um plano de protecção dos insectos e Klein esteve nesse projecto desde […]